segunda-feira, 17 de março de 2025

Peregrinos da esperança e a necessária coerência da vida cristã

 


Peregrinos da esperança e a necessária coerência da vida cristã

Sejamos enriquecidos pelo Comentário ao Evangelho de São Lucas, escrito por São Cirilo de Alexandria, Bispo e Doutor da Igreja (séc. V)

Um discípulo não é maior que o seu mestre, mas quando terminar a aprendizagem será como o mestre. Os bem-aventurados discípulos estavam chamados a serem os iniciadores e mestres do mundo inteiro.

Por isso era conveniente que se avantajassem aos demais em uma sólida formação religiosa: necessitavam conhecer o caminho da vida evangélica, serem mestres consumados em toda boa obra, repartir aos seus alunos uma doutrina clara, sã e vinculada às regras da verdade; como aqueles que já tinham fixado seu olhar na Verdade e possuíam uma mente ilustrada pela luz divina. Somente assim evitariam de se converterem em cegos, guias de cegos.

De fato, aqueles que estão envoltos nas trevas da ignorância não poderão conduzir ao conhecimento da verdade aqueles que se encontram em idênticas e calamitosas condições. Pois de tentá-lo, ambos acabarão caindo no fosso das paixões.

A seguir, e para cortar pela raiz a tão difundida doença da vanglória, de maneira que em nenhum momento tentem superar o prestígio dos mestres, acrescenta: Um discípulo não é maior que o seu mestre. E se alguma vez ocorresse que alguns discípulos alcançassem tais progressos, que chegassem a se equiparar em mérito aos seus antecessores, mesmo assim devem permanecer dentro dos limites da modéstia dos mestres e tornarem-se seus imitadores.

É o que assegura Paulo, dizendo: Segui o meu exemplo, como eu sigo o de Cristo. Portanto, se o mestre se abstém de julgar, por que tu estabeleces sentenças? Realmente, Ele não veio para julgar o mundo, mas para usar de misericórdia com ele. Cujo sentido é este: Ele diz ‘se eu não julgo, tu também não julgues, sendo discípulo como és’. E se por acréscimo és mais culpável que aquele a quem julgas, como tua cara não se encherá de vergonha? O Senhor esclarece isto mesmo com outra comparação: Diz: Por que vês o cisco no olho do teu irmão?

Com silogismos sem volta trata de persuadir-nos de que nos abstenhamos de julgar aos outros; examinemos antes nossos corações e tratemos de expulsar as paixões que se aninham neles, implorando o auxílio divino. O Senhor cura os corações destroçados e nos liberta das indisposições da alma. Se tu pecas mais e gravemente que os outros, por que lhes reprovas seus pecados esquecendo-te dos teus? Assim, este preceito é necessariamente salutar para todo aquele que deseje viver piedosamente, porém o é sobretudo para aqueles que têm recebido o encargo de instruir aos demais.

E se forem bons e capazes, apresentando-se a si mesmos como modelos da vida evangélica, então sim poderão repreender com liberdade aqueles que não querem imitar sua conduta, como àqueles que, aderindo aos seus mestres, não demonstram um comportamento religioso.” (1)

Os discípulos são chamados a serem os iniciadores e mestres do mundo inteiro, para que tenha credibilidade no anúncio da Palavra.

Humildade e vigilância para a haja coerência entre o que se vive e se prega, e deste modo, são instigantes as palavras do Bispo:

“De fato, aqueles que estão envoltos nas trevas da ignorância não poderão conduzir ao conhecimento da verdade aqueles que se encontram em idênticas e calamitosas condições. Pois de tentá-lo, ambos acabarão caindo no fosso das paixões.”

Oremos:

Ó Deus, dai-nos a perfeita coerência cristã, e que ela seja visibilizada pela ação que reflete o que se fala; fala-se o que se pensa; e se pensa o que se reza.

Senhor Deus, enviai-nos Vosso Santo Espírito para que fiéis no seguimento do Vosso Filho, transformemos em fé viva o que lemos, ensinemos o que cremos, e procuremos realizar tudo o que ensinarmos, a fim de que não sejamos meros ouvintes e pregadores de Vossa Palavra.

Dai-nos, ó Deus, perfeita coerência, Vós que sois Perfeitíssima Coerência, para que não sejamos guias cegos caindo com quem nos foi confiado no fosso das paixões. Amém!

 

(1) Lecionário Patrístico Dominical – Editora Vozes – 2013 – pág. 643-644

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4º Bispo da Diocese de Guanhães - MG