sexta-feira, 1 de novembro de 2024

“Misericordia et misera” (síntese n.2)

 
“Misericordia et misera” (síntese n.2)

Em novembro de 2016, ao encerrar o Jubileu Extraordinário da Misericórdia, o Papa Francisco nos agraciou com a Carta Apostólica “Misericordia et misera”, com vistas a continuar os propósitos e iniciativas surgidas ao longo de sua realização: “Termina o Jubileu e fecha-se a Porta Santa. Mas a porta da misericórdia do nosso coração permanece sempre aberta de par em par” (n.16)

Inicia a referida Carta “Misericordia et misera”, referindo-se às duas palavras que Santo Agostinho utilizou para descrever o encontro de Jesus com a adúltera (cf. Jo 8, 1-11), em alusão ao amor de Deus que vem ao encontro do pecador.

Ressalta que a misericórdia não pode ser reduzida a um parêntese na vida da Igreja, mas deve se constituir na sua própria existência, por se tratar da verdade profunda e visível do próprio Evangelho.

Fundamenta-se na passagem do Evangelho, em que uma pecadora, num banquete na casa de um fariseu (cf. Lc 7, 36-50), ungiu com perfume os pés de Jesus, banhando-os com as suas lágrimas e os enxugando com os seus cabelos, e muito foi perdoada, porque muito amou.

Outra referência do Evangelho é o perdão dado por Jesus no alto da Cruz: «Perdoa-lhes, Pai, porque não sabem o que fazem» (Lc 23, 34), de modo que, nada que um pecador arrependido coloque diante da misericórdia de Deus pode ficar sem o abraço do Seu perdão.

Sendo assim, a misericórdia é a ação concreta do amor, que transforma e muda a vida de cada um de nós através do perdão, e não é um parêntese na vida da Igreja.

O perdão experimentado pelas duas mulheres (a adúltera e a pecadora) faz brotar alegria no coração.

O vento impetuoso e salutar do Ano Santo nos desafia a não ficarmos na indiferença e, uma vez acolhido o sopro vital do Espírito, continuarmos o que foi iniciado, e apresento de forma esquemática algumas ações concretas na Carta mencionadas.

1 - Viver a necessária “conversão pastoral”, a fim de não entristecermos o Espírito, com a força renovadora da Misericórdia levando a todos a Boa- Nova da Salvação. (n.5)

2 - Celebrar a misericórdia, que se encontra presente na oração da Igreja: no Ato Penitencial; no tempo quaresmal; na Oração Eucarística; depois do Pai Nosso; na oração antes do abraço da paz. De fato, cada momento da Celebração Eucarística faz referência à misericórdia de Deus (n.5).

3 - Valorizar, de modo especial, os Sacramentos de Cura: Penitência e Unção dos Enfermos, favorecendo a experiência da misericórdia de Deus.

4 - Continuar a iniciativa das 24 horas para o Senhor, nas proximidades do IV Domingo da Quaresma, como forte apelo pastoral para vivermos intensamente o Sacramento da Confissão (n.11).

5 - Todos os Sacerdotes se empenhem para oferecer oportunidade de confissão a quantos precisarem, acolhendo assim os pecadores na misericórdia de Deus.

6 - Valorizar a Palavra de Deus na Catequese e Homilias, sendo esta última a expressão da verdade que anda de mãos dadas com a beleza e o bem, fazendo vibrar o coração dos crentes. Por isto a necessária preparação pelo Sacerdote (Evangelii Gaudium n.142).

7 - Acentuar cada vez mais a importância da Bíblia, que narra as maravilhas da misericórdia de Deus: «Toda a Escritura é inspirada por Deus e adequada para ensinar, refutar, corrigir e educar na justiça» (2 Tm 3, 16)

8 - Valorizar o Dia da Bíblia, num domingo do Ano Litúrgico, ressaltando a importância da Palavra de Deus, pois ela é a revelação da misericórdia de Deus.

9 - Incentivar a Leitura Orante como fonte de espiritualidade, e de modo especial sobre as Obras de Misericórdia à luz da Palavra de Deus e da Tradição espiritual da Igreja, levando a gestos e obras concretas de caridade (n.7).

10 - Todos os sacerdotes podem dar o perdão de Deus para quem pedir perdão para o pecado do aborto (um grave pecado, reitera o Papa), até que se diga algo em contrário:“Em virtude desta exigência, para que nenhum obstáculo exista entre o pedido de reconciliação e o perdão de Deus, concedo a partir de agora a todos os sacerdotes, em virtude do seu ministério, a faculdade de absolver a todas as pessoas que incorreram no pecado do aborto. Aquilo que eu concedera de forma limitada ao período jubilar fica agora alargado no tempo, não obstante qualquer disposição em contrário...” pois todo pecado, pressupondo o arrependimento pode ser destruído pela misericórdia divina.

11 - Conceder a recepção válida e lícita da absolvição sacramental dos pecados dos que frequentam as Igrejas oficiadas pelos sacerdotes da Fraternidade de São Pio X (n.12).

12 - Favorecer para que a alegria do amor que se vive nas famílias se intensifique, pois esta alegria é também o júbilo da Igreja, como mencionada em sua Exortação (Amoris Laetitiae n.17), em meio às dificuldades, provações, pelas quais passa, mas a família constitui num lugar privilegiado para se viver a misericórdia (Amoris Laetitiae n.291-300). A necessidade de acompanhá-las, solidificá-las na experiência viva da misericórdia.

13 - A importância da presença do sacerdote no momento difícil que passa a família, a hora da morte de um de seus membros, sobretudo numa cultura em que se banaliza a morte, até mesmo a reduzindo a ficção ou a ocultando, de modo que a oração das exéquias seja um momento forte de esperança para a alma da pessoa falecida e para dar consolação à família que sofre a separação da pessoa amada.

14 - Construir da cultura de misericórdia, com base na redescoberta do encontro com os outros: uma cultura na qual ninguém olhe para o outro com indiferença, nem vire a cara quando vê o sofrimento dos irmãos (n.20). Deste modo é preciso intensificar a oração assídua, na abertura dócil à ação do Espírito, na familiaridade com a vida dos Santos e na solidariedade concreta para com os pobres (n.20) na construção da cultura da misericórdia

15 - Exorta para que seja celebrado no 33º Domingo do Tempo Comum, o Dia Mundial dos Pobres, fazendo deste momento um modo mais digno para a preparação e vivência da Solenidade de Nosso Senhor Jesus Cristo Rei do Universo, que Se identificou com os pequeninos e os pobres e nos há de julgar sobre as obras de misericórdia (cf. Mt 25, 31-46):

Concluindo, o Papa exorta que, a continuidade da experiência do Jubileu, faça chegar a todos a carícia de Deus, através do testemunho dos crentes (n.21), confiando-nos à ajuda materna de Maria, a Mãe da Misericórdia, que nos acompanha no testemunho do amor, pois ela nos indica o perene olhar para Jesus, “o rosto radiante da misericórdia de Deus” (n. 22).




“Revesti-vos da armadura de Deus”

                                                          

“Revesti-vos da armadura de Deus”

Como Igreja, iniciamos um  tempo fecundo e necessário de avaliação da caminhada feita, propício para a necessária elaboração de planos, projetos, sempre vislumbrando novos caminhos.

Os dias passam, consomem-se e nós nos consumimos. A cada dia uma batalha, uma conquista, decepções e surpresas agradáveis; encontros e desencontros; ganhos e perdas; derrotas, vitórias. Assim é a vida: comporta o movimento dos contrários.

A vida não é feita de apenas uma nota, um tom, um som, uma palavra, uma rima, de um parágrafo apenas. A vida é percurso, desafio, superação, eterno recomeço, morte e Ressurreição.

Neste sentido, a passagem da Carta de Paulo aos Efésios (Ef 6,10-20) é riquíssima para nos fortalecer no bom combate da fé.

Ele fala do cristão à luz de uma metáfora: o guerreiro, um gladiador que se coloca intrepidamente no combate consagrando e confiando a sua vida ao Senhor.

“Fortalecei-vos no Senhor, pelo Seu soberano poder” (Ef 6,10). A nossa força vem de Deus.

“Revesti-vos da armadura de Deus” – revestidos de Cristo pelo Batismo não há nada a temer. O Senhor é escudo, proteção, refúgio e muito mais, como rezou o Salmista (Sl 143).

Lutamos a todo instante contra as forças espirituais do mal, espalhadas nos ares, afirma o Apóstolo. É preciso vigiar e orar a todo instante, para que sejamos conduzidos, animados, iluminados pelo Santo Espírito no combate e para que vencedores sejamos.

Com a armadura de Deus mantemo-nos inabaláveis, assegura o Apóstolo, no cumprimento de nosso dever (Ef 6,13).

Ele ainda nos exorta: sejamos cingidos com a verdade, o corpo vestido com a couraça da justiça, e os pés calçados de prontidão para incansavelmente anunciar o Evangelho (Ef 6,15).

Nosso escudo é a fé, e com ele apagamos todas as flechas da maldade, da mentira, da hipocrisia, da injustiça.

Nosso capacete é o divino capacete da salvação, tendo nas mãos a espada do Espírito que é a própria Palavra de Deus (Ef 6,18).

Finaliza exortando à indispensável Oração em todas as circunstâncias, numa vigília permanente, Oração feita incessantemente uns pelos outros.

Que tenhamos sempre coragem em cada amanhecer de nos revestirmos de Cristo, de sermos  Sua presença no mundo, comunicando a Sua imprescindível luz em meio às trevas, dando gosto de Deus a quantos possamos, como sal da terra.

Revestidos da armadura de Deus, fermentaremos o mundo novo, não recuaremos na vida de fé, avançaremos corajosamente, enfim, nossa fé será verdadeiramente fecunda.

A misericórdia do Senhor ultrapassa as nossas “curtas medidas”

                                                            

A misericórdia do Senhor ultrapassa as nossas “curtas medidas”

Na passagem do Evangelho a ser proclamada, na sexta-feira da 30ª Semana do Tempo Comum, Jesus dirige palavras duríssimas a um dos chefes dos fariseus, que O questionou por ter curado um homem que sofria de hidropisia em dia de sábado (Lc 14,1-6).

Vejamos o que nos diz o Lecionário Comentado:

“Uma religiosidade fria, encerrada na atenção às disposições legais, não está em sintonia com a atuação salvífica revelada em Cristo. Jesus ensina-nos a fazer nossas as necessidades dos indivíduos, sem casuísticas, nem impedimentos” (1)

E completa: “Como é pobre a espiritualidade que pensa que Deus deve ‘curar somente no interior dos próprios sábados, das suas casuísticas, dos seus percursos espirituais’, e como é explosivo, pelo contrário, a atuação de Jesus que, como no Evangelho de hoje, abre o banquete do Reino a um doente que não fez ou disse nada, mas está simplesmente ali, com sua necessidade e depois curado, a testemunhar um Deus cuja salvação (felizmente!) ultrapassa as nossas curtas medidas!” (2)

Oremos:

Cristo Jesus, acolhidos e envolvidos pela Vossa misericórdia, e aprendizes de Vossos ensinamentos, como discípulos missionários, ajudai-nos, para que tenhamos maior compaixão para com as autênticas necessidades de nosso próximo.

Cristo Jesus, somos por Vós amados, acolhidos, perdoados e libertos, cumulai nosso coração de amor e sensibilidade para com os dramas de nosso próximo, para que sejamos instrumentos de amor, acolhida, perdão e libertação.

Cristo Jesus, não permitais que tenhamos atitudes farisaicas, colocando limites de tempo para o bem, pois a lei está acima acima da vida, e livrai-nos da miopia que nos impeça de enxergar Vossa ação misericordiosa e libertadora em favor dos que mais precisam.

Cristo Jesus, tendo encontrado Vossa Pessoa e Palavra, ajudai-nos a cultivar uma espiritualidade em que são alargados os horizontes da compaixão, proximidade e solidariedade, e assim darmos à nossa própria existência, um novo impulso e um novo sentido. Amém.

(1) Lecionário Comentado – Editora Paulus – Lisboa – 2011 - Vol. II - Tempo Comum - pág.680.
(2) idem

Eucaristia e serviço ao próximo

                                           

Eucaristia e serviço ao próximo

“Porque quem se eleva será humilhado e 
quem se humilha será elevado” (Lc 14, 11)

Na Liturgia do Sábado da 30ª Semana do Tempo Comum, ouvimos a passagem do Evangelho de Lucas (Lc 14,1.7-11), e refletimos sobre os valores fundamentais para a construção do Reino de Deus: humildade, gratuidade e amor desinteressado.

Temos a apresentação dos critérios para uma autêntica participação do Banquete do Reino e não do banquete farisaico; e também em que consiste a lógica divina, que contrapõe a humildade à superioridade, a simplicidade ao orgulho, o serviço à ambição, o ocupar o último lugar ao invés dos primeiros, a solidariedade para com os últimos e não se servir do próximo. 

É bom esclarecer que a competição é necessária, desde que não leve à destruição do outro, mas à busca de maior qualificação para melhor servir. Esta deve ser a marca daqueles que se põem a caminho com o Divino Mestre Jesus. 

Iluminadora a citação do Missal Dominical: “Para todos, em qualquer plano da hierarquia social que se encontrem, escolher o último lugar significa usar o próprio lugar para o serviço dos últimos e não para o domínio sobre eles” (1).

Deste modo, a conversão é um apelo constante em nossa caminhada cristã. Cremos e professamos a fé em Jesus Cristo que, com Sua morte, assumida livremente na Cruz, nos apresentou um Deus cuja Sabedoria é imprevisível e impensável e tão distante da sabedoria humana.

Assim afirma o Missal Dominical: “Jesus seria um entre os muitos mestres de virtude, se não tivesse vivido até o fim Sua Palavra, e se Sua Pessoa, Sua Palavra, Sua vida não fossem a revelação definitiva de Deus (2).

A Cruz é Sua Sabedoria, Seu Livro, Sua Palavra reveladora. A morte de Jesus não é o fim de uma tentativa de instaurar um novo Reino; é o Seu ato de nascimento;... Converter-se à Sabedoria de Deus é ver na Cruz que a verdade do Amor tem na morte o seu teste. Quem entra no Reino começa uma nova sabedoria.”

Reflitamos:

 - Quais são os convidados para os nossos banquetes?
 - Qual a lógica do banquete que celebramos?
 - Pautamos a nossa vida pela humildade, gratuidade e amor desinteressado?
- -  Nossa prática pastoral também é marcada por estes valores?


Notas:
(1) Missal Dominical – p.1223
(2) Idem – pp.1222-1223

quinta-feira, 31 de outubro de 2024

Revestidos da armadura divina

Revestidos da armadura divina

Os dias passam, consomem-se e nós nos consumimos. A cada dia, uma batalha, uma conquista, decepções e surpresas agradáveis; encontros e desencontros; ganhos e perdas; derrotas, vitórias. Assim é a vida: comporta o movimento dos contrários.

A vida não é feita de apenas uma nota, um tom, um som, uma palavra, uma rima, um parágrafo. A vida é percurso, desafio, superação, eterno recomeço, morte e Ressurreição.

Neste sentido, a passagem da Carta de Paulo aos Efésios (Ef 6,10-20) é riquíssima, para nos fortalecer no bom combate da fé.

Paulo fala do cristão à luz de uma metáfora: o guerreiro, um gladiador que se coloca intrepidamente no combate consagrando e confiando a sua vida ao Senhor.

“Fortalecei-vos no Senhor, pelo Seu soberano poder” (Ef 6,10). A nossa força vem de Deus.

“Revesti-vos da armadura de Deus” – revestidos de Cristo pelo Batismo não há nada a temer. O Senhor é escudo, proteção, refúgio e muito mais, como rezou o Salmista (Sl 143).

Lutamos a todo instante contra as forças espirituais do mal, espalhadas nos ares, afirma o Apóstolo. É preciso vigiar e orar a todo instante, para que sejamos conduzidos, animados, iluminados pelo Santo Espírito no combate e para que vencedores sejamos.

Com a armadura de Deus mantemo-nos inabaláveis, assegura o Apóstolo, no cumprimento de nosso dever (Ef 6,13).

Ele ainda nos exorta: sejamos cingidos com a verdade, o corpo vestido com a couraça da justiça, e os pés calçados de prontidão para incansavelmente anunciar o Evangelho (Ef 6,15).

Nosso escudo é a fé, e com ele apagamos todas as flechas da maldade, da mentira, da hipocrisia, da injustiça.

Nosso capacete é o divino capacete da salvação, tendo nas mãos a espada do Espírito que é a própria Palavra de Deus (Ef 6,18).

Finaliza exortando à indispensável Oração em todas as circunstâncias, numa vigília permanente, Oração feita incessantemente uns pelos outros.

Que tenhamos sempre coragem em cada amanhecer de nos revestirmos de Cristo, de sermos  Sua presença no mundo, comunicando a Sua imprescindível luz em meio às trevas, dando gosto de Deus a quantos possamos, como sal da terra.

Revestidos da armadura de Deus, fermentaremos o mundo novo, não recuaremos na vida de fé, avançaremos corajosamente, enfim, nossa fé será verdadeiramente fecunda.

Calcemos as sandálias da prontidão

                                                      

Calcemos as sandálias da prontidão

Na Carta do Apóstolo Paulo aos Efésios (Ef 6,10-20), ele nos fala da vida cristã como um combate, no qual a pessoa deve se armar como um “soldado”, defendendo-se dos inimigos que estão por toda parte.

Esta imagem de soldado é recorrente na Sagrada Escritura, como vemos na passagem do Antigo Testamento, em que o próprio Deus é comparado a um guerreiro que empunha armas (cf. Sl 7 e 18).

Para o combate, precisamos ser fortalecidos no Senhor, como ele mesmo assim o diz:

Vistam a armadura de Deus, para conseguirem resistir às manobras do diabo” (Ef 6,12); e repete “Por isto, vistam a armadura de Deus, para conseguirem resistir no dia mau e permanecerem firmes depois de superar tudo” (Ef 6, 13).

Para isto, o cristão precisa ficar firme. E completa:

Vistam a couraça da justiça. Calcem os pés com a prontidão para o Evangelho da paz. Estejam sempre com o escudo da fé, pois com ele vocês conseguirão apagar as flechas inflamadas do Maligno. E peguem o capacete da Salvação e a espada do Espírito que é a Palavra de Deus” (Ef 6, 14-17).

Mas é preciso a oração e a vigilância neste combate em todo o tempo:

“Rezem no Espírito, em todo tempo com orações e súplicas de todo tipo. Para isso, vigiem com toda a perseverança, rezando por todos os santos” (Ef 6, 18).

Retomo um versículo para iluminar esta reflexão“Calcem os pés com a prontidão para o Evangelho da paz” (Ef 6,15).

Calçar os pés, colocar as sandálias é uma imagem facilmente compreendida. Calçar os pés para pôr-se a caminho, e defender os pés das “pedras” e perigos que nele se possa encontrar. Assim como o filho pródigo recebeu, entre outras coisas, as sandálias, também precisamos delas para nos pormos a caminho (cf. Lc 15,11-32).

Sandálias nos pés, caminho a percorrer, a Boa-Nova do Reino anunciar. Prontidão sempre! Sem desculpas, adiamentos, medos, omissões, covardias, ausência de comprometimentos.

Prontidão, para o Evangelho da paz, significa disponibilidade, coragem, dedicação, formação, empenho, sabedoria, ousadia, profecia.

Pés calçados para evangelizar na família e em todos os âmbitos. Calçar os pés e prontidão para evangelizar nos desafiadores novos areópagos (escolas, universidades, meios de comunicação...).

Pés calçados e prontidão para:

- renovados compromissos, numa comunidade e suas diversas pastorais, movimentos e serviços;


- evangelizar como Igreja em estado permanente de missão;

- fazer da Igreja um lugar da iniciação da vida cristã;

- a formação bíblica e animação litúrgica, com celebrações vivas, em que a Palavra e os Sacramentos são celebrados e na vida prolongados;

- fazermos da Paróquia uma comunidade de comunidades; uma família de famílias, como nos ensina o Papa Francisco;

- evangelizar no mundo da economia, da política, da cultura e em outras realidades, como nos ensina o Magistério da Igreja;

- renovar incansavelmente sagrados compromissos, construindo uma nova realidade com vida plena e feliz para todos.

É tempo de calçar as sandálias da prontidão e pôr-se a caminho, se já postos, perseverar até o fim, fortalecidos pela oração e, de modo especial, pelo augustíssimo Sacramento da Eucaristia.

Revistamo-nos da armadura divina!

                                                    

Revistamo-nos da armadura divina!

Ouvimos na quinta-feira da 30ª Semana do Tempo Comum a passagem do Evangelho de Lucas (Lc 13,31-35).

Vejamos o comentário do Missal Cotidiano sobre esta  passagem:

“Jesus era personagem incômoda para a autoridade. Não entrava em nenhum de seus esquemas, mas na longa série de incompreensões e assassínios contra os Profetas. Porém não brinca de herói.

Sua contestação não é objeto de propaganda ou publicidade. É árdua vida de Profeta. Toda a Sua existência constitui longa caminhada rumo a Jerusalém, como Lucas tem o cuidado de sublinhar.

Se a viagem de nossa vida é participação na vida de Jesus, deve tender para Jerusalém, a ‘cidade que mata os Profetas’”.(1)

A missão de Jesus é a revelação radical do rosto de Deus, que Se despoja de toda onipotência para Se nos dar a conhecer na escandalosa impotência de um Crucificado:

“O Senhor revela-Se num aspecto impensável: não como soberano vencedor, garantia de possíveis projetos de poder, mas como um Deus derrotado, segundo as categorias humanas. E essa crise renova-se diante de cada crucificado da História, das muitas situações de sofrimento que levantam perguntas: por que é que Deus o permite? Por que é que não mostra Sua onipotência para as remediar?”

E, assim, muitas outras interrogações semelhantes são feitas. Deus que fica escandalosamente impotente sobre a Cruz, revela um poder inesperado:

“Ele permanece na Cruz, não porque não possa descer dela, mas porque não quer descer; não porque procura o suplício, mas porque procura a solidariedade extrema, a partilha incondicional conosco, com os nossos sofrimentos, com as nossas crucifixões, para nos dizer que através dessa partilha tem início a aurora de uma vida nova”. (2)

Para quem crê a Cruz não se revela como poder domínio, mas como poder de salvação que expressa o Amor incondicional, Amor extremo, Amor incompreendido, Amor não correspondido, Amor sem limites... 

Amor incrível, indizível, sem igual, Amor que redime, liberta e aponta para um novo modo de viver e se relacionar para que seja banida toda dor, sofrimento, opressão, injustiça, miséria, lamento, lágrimas e morte (Ap 21, 3-4).

A Ressurreição do Senhor será a Suprema e Onipotente vitória da luz sobre as trevas, da graça sobre o pecado, do amor sobre o ódio, da vida sobre a morte.

Jesus não brincou de herói, e foi fiel à missão confiada pelo Pai, em obediência incondicional.

O cristão, portanto, também não é herói no termo comum como se possa conceber. Ele é muito mais, é alguém que vive o escândalo da cruz, loucura para os gregos, escândalo para os judeus (1 Cor 1,18-31).

O cristão assume toda dor e sofrimento por um amor que muitas vezes não é compreendido. Mas amor não é para ser compreendido, amor é para amar, simplesmente.

Criado pelo Amor de Deus para amar, caberá ao cristão, muito mais do que título de herói, amar até mesmo anonimamente, silenciosamente, carregando com fé, coragem, confiança, resistência, a sua cruz cotidiana.

Ser cristão é viver o bom combate da fé, para tanto é imprescindível contar com a graça e a força divina, como Paulo tão bem nos exorta na Carta aos Efésios (Ef 6,10-20).

Por ora, 
vamos cantando e lutando com o Senhor, 
e como Ele o fez,
até que venha o Seu Reino, 
o novo céu e a nova terra:

“Eu confio em nosso Senhor, 
com fé, esperança e amor...”

(1) Missal Cotidiano - Editora Paulus - pág. 1439
(2) Lecionário Comentado – Editora Paulus - Lisboa - pág. 676.

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