segunda-feira, 24 de junho de 2024

João Batista nos apresentou o Cordeiro de Deus

                                                          

João Batista nos apresentou o Cordeiro de Deus

“Melhor é calar-se e ser do que falar e não ser.
Coisa boa é ensinar, se quem diz o pratica.”

Celebramos, no dia 24 de junho, o nascimento de João Batista, que se inseriu numa memorável página da história da Salvação.

Já no Antigo Testamento (Is 49,3.5-6), o Profeta Isaías anunciou a ação divina, com o segundo cântico do Servo Sofredor.

Deus faria deste Servo a luz das nações,  a Salvação oferecida a toda a humanidade.

A Tradição cristã viu sempre nesta página o anúncio profético do Messias, que veio ao mundo como luz e Salvação para a Humanidade.

Deste modo, na passagem do Evangelho de João (Jo 1,29-34), vemos a presença de João Batista que nos apresenta Jesus, o Cordeiro de Deus que tira o pecado mundo.

João batizou Jesus, não porque este fosse pecador, mas para santificar a água na qual todos seríamos batizados. João viu e dá  testemunho sobre Jesus:  Ele, João, viu, no dia do Batismo, descer do céu sobre Jesus o Espírito como uma pomba. É Jesus, batizado por João, o Messias esperado, o enviado de Deus para com o Batismo no Espírito comunicar Luz e Salvação para toda a humanidade:

- “Hoje a Palavra de Deus qualifica João como o ‘apresentador do Messias.

Estamos habituados a assistir às entrevistas na televisão, em que o apresentador se serve de personagens famosas para ganhar audiência: os outros são para ele um pretexto para aumentar sua popularidade.

João, não! Não se serve de Jesus para aumentar a sua fama, ao invés convida os seus discípulos a seguirem Jesus” (l)

A propósito, João dirá em outra passagem: “É necessário que Ele cresça e eu diminua” (Jo 3,30).

Imitemos João, a fim de que nossa vida corresponda ao que anunciamos, com o testemunho permanente e incansável, até que um dia possamos contemplar a face d’Aquele que nos foi apresentado, e também ao mundo apresentamos, na glória da eternidade, lembrando Santo Inácio de Antioquia (séc I):

Melhor é calar-se e ser do que falar e não ser. Coisa boa é ensinar, se quem diz o pratica. Pois só um é o Mestre que disse e tudo foi feito, mas também, tudo quanto Ele fez em silêncio é digno do Pai”.

Renovemos a alegria da graça do Batismo, e também de sermos no mundo sinal da Luz que é o Cristo Senhor, anunciando e testemunhando Sua Palavra em todos os setores da vida e por todos os meios, vivendo em constante atitude de amor, diálogo, comunhão e serviço.

(1)  Lecionário Comentado – Editora Paulus – p.62 
PS: Oportuna para o dia 03 de janeiro quando se proclama a passagem do Evangelho (Jo 1,29-34)

Cremos no Deus do impossível

                                                    

Cremos no Deus do impossível

A passagem do Evangelho de Lucas (Lc 1,5-25) nos fala do nascimento de João Batista (Deus é doador da graça) anunciado pelo Anjo Gabriel.

O Missal Cotidiano nos apresenta, em seu comentário, uma citação enriquecedora do Cardeal J. Suenens:

“Felizes os que sabem auscultar em profundidade, porque ouvirão a Deus! A nós parece incrível que Deus nos fale, entretanto Ele o faz ininterruptamente. Por que então não lhe ouvimos a voz? Simplesmente porque não estamos à escuta. A frequência de suas ondas é captada por quem pede e ouve em silêncio”.

O Anjo Gabriel (a força e o poder de Deus)  faz duas comunicações: o nascimento extraordinário de João Batista, filho de um casal que prepara a anunciação de outro nascimento, e o nascimento divino: Jesus (Lc 1,26-38).

De fato, para Deus nada é impossível, e o Seu poder tem começo exatamente onde a fraqueza humana revela seus limites de possibilidades. Cremos no Deus do impossível!

“Todo o Amor suscitado pelo Espírito de Deus permanece para sempre e não há ventre estéril que o Espírito não possa tornar fecundo, porque ‘a Deus nada é impossível’” (Lc 1,37).

Bem afirmou o Cardeal que é preciso estar sempre vigilantes e em total sintonia com a voz de Deus que nos fala ao coração, e nos quer inseridos em Seu plano de Salvação.

Importa ouvir e acolher os Projetos de Deus, sem jamais atrapalhar, ou até mesmo atrapalhar quem deseja a este Projeto de Amor corresponder.

A felicidade que possamos alcançar é diretamente proporcional à capacidade de sintonia e escuta da voz de Deus que fala diretamente conosco, ou por intermédio de Seus bons “Anjos”, com quem convivemos, que são as pessoas de boa vontade que procuram viver em perfeita e plena sintonia com o querer de Deus, como fizeram Zacarias (o Senhor Se lembrou), Isabel (O meu Espírito jurou – Deus é plenitude), Maria (a amada de Deus), José (homem justo e piedoso), o próprio Jesus, o Emanuel, o Messias, Nosso Salvador, e todos aqueles que, pela fé, se colocaram em mesma atitude.

Como o próprio Apóstolo Paulo que ouviu a voz do Senhor lhe dizer em resposta à sua súplica, diante das dificuldades enfrentadas: “Basta-te a minha graça, pois é na fraqueza que a força manifesta todo o seu poder”; e aos Coríntios, ele assim se expressou: “Prefiro gabar-me das minhas fraquezas, para que a força de Cristo habite em mim, pois quando sou fraco, então é que sou forte” (2Cor 12, 9-10).

É sempre tempo de maior atenção à Palavra Divina e, a partir de sua escuta e vivência, acolhê-la em nosso coração; é sempre tempo de experimentar em nossa fragilidade humana, a onipotência do Amor Divino, que veio, vem e virá sempre ao nosso encontro. 

Sem murmurações, julgamentos e desprezo


Sem murmurações, julgamentos e desprezo

Na segunda-feira da 12ª Semana do Tempo Comum, ouvimos a passagem do Evangelho de Mateus (Mt 7,1-5).

Iluminadora é a “Conferência sobre o julgamento do próximo”, escrita por São Doroteu de Gaza (séc. VI), para a reflexão desta passagem do Evangelho.

“Irmãos, se recordarmos bem as sentenças dos santos anciãos e as meditamos sem cessar, difícil será que pequemos ou que sejamos negligentes.

Se como eles nos dizem, não menosprezarmos o pequeno e aquilo que julgamos insignificante, não cairemos em faltas graves. O repito sempre a vocês. Por coisas ligeiras, como dizer por exemplo: ‘O que  é isto? O que é aquilo?’, nasce um mau hábito na alma, e se começa a desprezar inclusive as coisas importantes. Percebem quão grave é o pecado que se comete ao julgar o próximo? O que há de mais grave? Existe algo que Deus deteste tanto e do qual se afaste com tanto horror?

Os Padres disseram: ‘nada é pior do que julgar'. E, contudo, é por estas coisas que se dizem ser de pouca importância, que se chega a um mal tão grande. Se admite uma ligeira suspeita contra o próximo, se pensa: ‘O que importa se escuto o que tal irmão diz? O que importa se também eu digo somente esta palavra? O que importa se vejo o que vai fazer aquele irmão ou aquele estranho?’, e o espírito começa a esquecer os seus próprios pecados e a ocupar-se do próximo. Daí vem os juízos, murmurações e desprezos, e finalmente se cai nas faltas que se condenavam.

Quando alguém é negligente, a respeito de suas próprias misérias, quando alguém não chora a sua própria morte, segundo a expressão dos padres, não pode corrigir-se nunca, porque se ocupa constantemente do próximo. Entretanto, nada irrita tanto a Deus, nada despoja ao homem e lhe conduz ao abandono, como fato de murmurar do próximo, de julgá-lo e de desprezá-lo.

Murmurar, julgar e desprezar são coisas diferentes. Murmurar é dizer de alguém: ‘aquele mentiu’, ou: ‘enraivecer-se’, ou: ‘fornicou’. Ou outra coisa semelhante. Se murmurou dele, ou seja, se falou contra ele se revelou seu pecado, existe impulsos da paixão.

Julgar é dizer: ‘aquele é um mentiroso, colérico, fornicário’. Eis aí que se julga a própria disposição de sua alma e se aplica a sua vida inteira, dizendo que ele é assim, e se lhe julga como tal. Isto é grave. Porque uma coisa é dizer: ‘encolerizou-se’, e outra coisa: ‘é colérico’, pronunciando-se desta forma sobre toda a sua vida.

Julgar ultrapassa em gravidade a todos os pecados, de modo que Cristo mesmo disse: ‘Hipócrita, tira primeiro a trave do teu olho, e então poderás tirar o cisco do olho do teu irmão’. A falta do próximo a comparou com um cisco, e o juízo uma trave, pois o julgar é muito grave, mais grave talvez que cometer qualquer outro pecado.

O fariseu que orava e dava graças a Deus por suas boas ações, não mentia; mas dizia a verdade; não foi condenado por isso. Na realidade devemos dar graças a Deus pelo bem que Ele nos concede realizar, já que é com a Sua ajuda e Seu auxílio.

Desta forma, ele não foi condenado por ter dito: “Não sou como os demais homens’; não. Foi condenado quando, voltando-se para o publicano, acrescentou: ‘nem como esse publicano’. Foi então quando se tornou gravemente culpado, porque julgava a própria pessoa do publicano, as próprias disposições de sua alma, em uma palavra: sua vida inteira. Por isso, o publicano partiu dali justificado e ele não. Não há nada mais grave, nada mais prejudicial, e o digo com frequência, que julgar ou desprezar ao próximo”.

À luz da Conferência, reflitamos sobre os nossos relacionamentos quotidianos, e o quanto também podemos incorrer em graves murmurações, julgamentos e desprezos, tornando desagradáveis a Deus nossas palavras e orações.

Antes, é preciso que nos voltemos para nossa própria “miséria”, como o autor mesmo afirma, e sintamos a necessidade da misericórdia divina, sem nos tornarmos parâmetros de santidade e salvação para o outro.

É sempre tempo de aprendermos a viver a misericórdia, compadecendo-se com fragilidade do nosso próximo, o que não é sinônimo de conivência, cumplicidade. 

A misericórdia divina não se afasta da justiça, tão pouco da verdade, não exclui nem elimina o pecador, mas abomina o seu pecado.

Urge que aprendamos e vivamos a misericórdia querida por Deus, a fim de que sejamos misericordiosos como o Pai (Lc 6, 36), e tão somente assim, nossas orações se tornarão agradáveis e chegarão ao coração de Deus,   sendo por Ele ouvidas, e assim, alcançaremos a justificação.


(1) Lecionário Patrístico Dominical – Editora Vozes – 2013 – pp.741-743


Um olhar puro e misericordioso

 




Um olhar puro e misericordioso

Jesus nos adverte na passagem do Evangelho de Mateus (Mt 7,1-5), como discípulos missionários seus: “Tira primeiro a trave do teu próprio olho, e então enxergarás bem para tirar o cisco do olho do teu irmão” (Mt 7,5).

Oremos:

Senhor Jesus, ajudai-me para que jamais desista do esforço para viver esta advertência, que procedeu de Vosso coração manso e pleno de ternura.

Ajudai-me a superar a contínua tentação de olhar em torno de mim mesmo, estabelecendo diferenças que podem me reduzir à fiel condição do fariseu, orando no templo em pé e olhando com olhos de superioridade em relação ao pobre publicano;

Senhor Jesus, sois a Verdade, que diante da qual jamais posso me esconder, e bem conheceis o mais profundo de meu coração, concedei-me a graça de não julgar para não ser julgado; mas que eu faça progressos contínuos para amar, respeitar e ajudar pela conversão própria e de meus semelhantes. Amém.

domingo, 23 de junho de 2024

Com o Senhor, serenidade nas travessias

 


Com o Senhor, serenidade nas travessias

Sejamos enriquecidos pelo Sermão n.63,1-3), de Santo Agostinho:

“Subiu Ele a uma barca com seus discípulos. De repente, desencadeou-se sobre o mar uma tempestade tão grande, que as ondas cobriam a barca. Ele, no entanto, dormia.

Os discípulos achegaram-se a ele e o acordaram, dizendo: Senhor, salva-nos, nós perecemos! E Jesus perguntou: Por que este medo, gente de pouca fé?

Então, levantando-se, deu ordens aos ventos e ao mar, e fez-se uma grande calmaria. Admirados, diziam: Quem é este homem a quem até os ventos e o mar obedecem?” (Mt ,23-27).

Vamos comentar, com a ajuda de Deus, a leitura que o Santo Evangelho nos propõe hoje, não aconteça que tenham a fé adormecida nos vossos corações, no meio das tempestades e ondas deste tempo.

Cristo não teve poder sobre a morte ou o sono? Ou por acaso o sono pôde dominar a vontade do Navegador Todo-Poderoso? Se pensardes assim, sem dúvida, Cristo e a fé estão adormecidos em vossos corações. Mas se Cristo vela em vós, a vossa fé também está acordada. ‘Que Ele faça Cristo habitar em vossos corações pela fé’(Ef 3,17), disse o Apóstolo.

O sono de Cristo é sinal de mistério. Os ocupantes da barca representam as almas que atravessam a vida deste mundo agarradas ao madeiro da cruz. Por outro lado, a barca é símbolo da Igreja. Sim, verdadeiramente […] o coração de cada fiel é uma barca que navega no mar e que não se afundará se o espírito mantiver bons pensamentos.

Insultaram-te: é o vento que te fustiga. Encolerizaste-te: é a onda que se levanta. Surgiu a tentação: é o vento que sopra. A tua alma está perturbada: são as vagas que se elevam. Insultaram-te e desejas vingança; castigaste sem temperança e estás caído. E por quê? Porque Cristo dorme no teu coração. O que significa que Cristo dorme? Que tu te esqueceste dele. Acorda Cristo, deixa que Ele te fale.

O que querias? Vingança. Não te lembras de que quando o crucificaram, ele disse: ‘Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem’(Lc 23,34)? O que dormiu em teu coração não quis vingar-se. Acorda-o! Contempla-o. A sua memória são as suas palavras; a sua memória é a sua Lei. E se Cristo cuida de ti, te dirás: Quem sou eu, para querer punir? Quem, para ameaçar a alguém? Talvez eu morra antes de me vingar. E se morrer, inflamado pela ira, com anseio e sede de vingança, aquele que não quis punir me receberá? Aquele que disse: ‘Perdoai, e sereis perdoados, dai, e dar-se-vos-á’ (Lc 6,36-38)? Portanto, reprimirei a minha ira e pacificarei o meu coração. Cristo deu ordem ao mar e este ficou calmo (cf. Mt 8,27).

O que disse acima sobre a ira, aplicai-o a todos os tipos de tentações. És tentado e estás perturbado: são o vento e as ondas que se levantam. Desperta Cristo e fala com ele. ‘Quem é Este, a quem até o vento e o mar obedecem?’ (Mt 8,26) Quem é Ele? ‘Dele é o mar, pois foi Ele quem o formou’ (Sl 95,5): ‘por Ele é que tudo começou a existir’ Jo 1,3).

Imita, pois, os ventos e o mar: obedece ao Criador. O mar mostra-se dócil à voz de Cristo e tu continuas surdo? O mar obedece, o vento acalma-se e tu continuas a soprar? Que queremos dizer com isso? Falar, agitar-se, meditar na vingança: não será tudo isto continuar a soprar e não querer ceder diante da palavra de Cristo? Quando o teu coração está perturbado, não te deixes submergir pelas vagas.

No entanto, se o vento nos virar — porque somos apenas humanos — e acicatar as emoções más do nosso coração, não desesperemos. Acordemos Cristo, para que possamos prosseguir a nossa viagem por mares mais calmos.”

Nossa vida consiste numa constante travessia pelo mar da vida, e por vezes os mares são agitados pelos ventos.

Precisamos confiar na presença do Senhor na barca de nosso coração, e confiantes em Sua Palavra, superar todo o medo, vivendo a fé, em atitude orante, confiantes, suplicantes na mais autêntica relação com o Senhor que jamais nos abandona.

Creiamos que Ele está em nossa barca seja de nosso coração, como na barca de Sua Igreja em todo o tempo: e a última e poderosa Palavra somente Ele tem a nos dirigir e a serenidade nos devolver nas travessias cotidianas. Amém.

 

PS: Sermão apropriado para a passagem do Evangelho de Marcos (Mc 6,24-34).

Que jamais percamos...

                                                                      


Que jamais percamos...

Jamais percamos...
A certeza de que podemos algo mudar, mesmo que pouco tenhamos;
A convicção de que estamos no caminho, sem desvios para abismos.

A capacidade de superação, sem precisar nada de assombroso,
Tão apenas confiando em Vossa divina presença, Glorioso;

A graça de sermos instrumentos da alegria para quantos possamos,
Ainda que sinais de tristeza e luto, dor e pranto nos rodeiem.

Jamais percamos...
A consciência de que nada podemos desperdiçar:
Esforços, inteligência, energias, a serviço da humanidade;

A sensibilidade, para não ficarmos frios e indiferentes,
Com sentimentos de inferioridade ou o seu contrário;

A contemplação de Vossa presença suave de Amor,
Que afasta todo medo que rouba nossas forças, porque inibidor.

Jamais percamos...
A fé que nos move, que nos impele, que nos faz avançar,
Recuperando os traços da imagem Vossa em cada um de nós;

A confiança na ação divina, quando parecer que nada podemos;
A esperança de superação, quando tudo parecer imutável;

O zelo necessário, para que mantenhamos acesa,
No mais profundo de nós, a chama viva da caridade. Amém.


Vençamos o medo na travessia (XIIDTCB)

                                              

Vençamos o medo na travessia

“‘Silêncio! Cala-te!’ O vento cessou e houve uma grande calmaria. Então Jesus perguntou aos discípulos:
“Por que sois tão medrosos? Ainda não tendes fé?” (Mc 4, 39-40)

Com a Liturgia do 12º Domingo do Tempo Comum (ano B), refletimos sobre a necessária confiança na presença e ação de Deus, que jamais nos abandona na realização de Seu Projeto de vida plena e salvação para a humanidade, bem como a realidade do sofrimento, das dificuldades e das adversidades presentes em nossa vida, e a manifestação amorosa de Deus, que quer de nós confiança e entrega total em Suas mãos, com toda humildade.

Na passagem da primeira Leitura (Jó 38,1.8-11), refletimos sobre o sofrimento de Jó e a inquietante interrogação: onde Deus está no sofrimento do inocente?

“Jó é convidado a aceitar que um Deus de quem depende toda a criação, que até submete o mar, que cuida da criação com cuidados de pai, sabe o que está a fazer e tem uma solução para os problemas e dramas do homem...

O homem, na situação de criatura finita e limitada, é que nem sempre consegue ver e perceber o alcance e o sentido último dos projetos de Deus... só Deus tem todas as respostas; ao homem resta reconhecer os seus limites de criatura e entregar-se nas mãos desse Deus onipotente e majestoso, que tem um projeto para o mundo. Ao homem finito e limitado resta confiar em Deus e ver n’Ele a sua esperança e salvação” (1)

A fé vivida por Jó nos permite afirmar que fé em Deus é compromisso contínuo, e não a busca de Deus como consolação imediata. É preciso entregar-se, abandonar-se nas mãos de Deus e não se isolar do mundo:

“O verdadeiro crente é aquele que, mesmo sem entender totalmente os projetos de Deus, aprende a entregar-se a Ele, a obedecer-lhe incondicionalmente, a vê-lO como a razão última da sua vida e da sua esperança”. (2)

A confiança em Deus não nos coloca numa postura de espera passiva, de modo que todos os problemas (terrorismo, violência, doenças, catástrofes, injustiças, insegurança etc.) devem nos inquietar em busca de respostas e saídas. Deus, que nos conduz através das armadilhas da história, nos ilumina nesta procura para que tenhamos vida plena e definitiva.

Na passagem da segunda Leitura (2 Cor 5,14-17), o Apóstolo Paulo nos apresenta o amor de Deus, que não nos abandona  e, por meio de Jesus, nos dá a vida nova: Deus não é indiferente, mas interveniente em nossa história, porque nos ama, e está presente ao nosso lado, indicando-nos o caminho da vida plena e feliz: Homens Novos e Nova Humanidade.

O Apóstolo, embora não tenha conhecido o Jesus histórico, fez a experiência do amor de Cristo Ressuscitado e deixou-se absorver por esse Amor, que o impeliu na missão, com coragem, ousadia e total fidelidade, até o extremo, no martírio.

Paulo consome-se em comunicar este Amor de Cristo a todas as pessoas, em todos os lugares, por isto é reconhecido como Doutor e Evangelizador das nações.

“Cristo morreu por todos, a fim de que os homens, aprendendo a lição do amor que se dá até as últimas consequências, deixassem a vida velha, marcada por esquemas de egoísmos e de pecado. Contemplando o Cristo que oferece a sua vida ao Pai e aos irmãos, os homens não viverão, nunca mais, fechados em si mesmos, mas viverão, como Cristo, com o coração aberto a Deus e aos outros homens”. (3)

Este encontro que o Apóstolo fez com o Senhor, é o mesmo que fizemos e que mudou a nossa vida, redimensionou nossos horizontes, como tão bem expressou o Papa Bento XVI:

Ao início do ser cristão, não há uma decisão ética ou uma grande ideia, mas o encontro com um acontecimento, com uma Pessoa que dá à vida um novo horizonte e, desta forma, o rumo decisivo”.

Reflitamos:

- Qual é a profundidade de nosso amor por Jesus?
- Quando se deu este encontro?
- Como O anunciamos e O testemunhamos?

Na passagem do Evangelho (Mc 4,35-41), refletimos sobre a caminhada dos discípulos e as dificuldades encontradas: os discípulos nunca estão sozinhos no enfrentar das tempestades, que se levantam na travessia do mar da vida.

Não há nada a temer, porque Cristo está presente com Sua Pessoa e Palavra, e com Ele pode-se vencer as forças e ventos contrários, que se contrapõem ao Projeto de Salvação que Deus tem para a humanidade.

A simbologia do mar é sempre muito forte na mentalidade judaica: “para falar de realidade assustadora, indomável, orgulhosa, desordenada onde residiam os poderes caóticos que o homem não conseguia controlar e onde estavam os poderes maléficos que queriam destruir os homens...

Só Deus, com o Seu poder e majestade, podia por limites ao mar, dar-lhe ordens e libertar os homens dessas forças descontroladas do caos que o mar encerrava” (4).

Deste modo, a passagem do Evangelho é uma página catequética, em que a partir dos elementos simbólicos (mar, barco, tempestade, noite e o sono de Jesus), nos fala da comunidade dos discípulos de Jesus em sua desafiadora caminhada na história, haja vista que Marcos escreve o Evangelho numa época em que a Igreja estava enfrentando sérias “tempestades” e a mais desafiadora de todas, a perseguição de Nero, somado aos problemas internos causados pela diferença de perspectivas entre judeus-cristãos e pagãos-cristãos.

Voltemo-nos para a simbologia:

Barco - na catequese cristã, é o símbolo da comunidade de Jesus que navega pela história.

Barco rumando para a outra margem, ao encontro das terras dos pagãos: a salvação se destina a todos os povos - universalidade da salvação.

O sono de Jesus - aparente ausência.

A tempestade - dificuldades, perseguição e hostilidades, que os discípulos terão de enfrentar ao longo do caminho até o fim dos tempos.

Jesus acalmando a fúria do mar e do vento com a Sua Palavra - manifestação da presença divina em sua Pessoa e Palavra.

Portanto, a grande pretensão do Evangelista é apontar o caminho da fé, que se expressa em total confiança na presença e Palavra do Senhor para enfrentar as “tempestades”, e em todos os tempos: a comunidade é chamada a fazer a experiência de adesão, confiança, obediência, em entrega total e incondicional nas mãos de Deus, que conduz a história.

A comunidade dos discípulos de Jesus, em plena fidelidade e confiança n'Ele, deve passar para a outra margem, ou seja, aqui é a dimensão missionária da Igreja que não pode se acomodar, mas deve se colocar a serviço da transformação do mundo, superando todo medo e acomodação como tão bem expressou o Papa Francisco:

Prefiro uma Igreja acidentada, ferida e enlameada por ter saído pelas estradas, a uma Igreja enferma pelo fechamento e a comodidade de se agarrar às próprias seguranças. Não quero uma Igreja preocupada com o ser o centro, e que acaba presa num emaranhado de obsessões e procedimentos.” (n.49 – Alegria do Evangelho).

Reflitamos:

- Quem é Jesus para mim?
- Sinto a presença de Jesus na comunidade que participo?

- Confio na Palavra do Senhor para enfrentar as “tempestades” e os ventos contrários do dia a dia na travessia para a outra margem?
- Sinto a força divina que nos anima em todas as dificuldades?

- Como é minha adesão ao Senhor e acolhida de Sua Palavra?
- Acredito que, com a Pessoa de Jesus e Sua Palavra, as forças do mal não têm a última palavra?

Finalizando, é preciso encontrar-se com o Senhor e deixar-se transformar por Ele, numa relação de amor e confiança total n’Ele, para que assim vençamos todo medo e enfrentemos todas as “tempestades”, e a pior de todas as tempestades: não sentir a presença e o Amor de Deus, ou prescindir do Seu divino Amor.


Fonte inspiradora e citações (1) (2) (3) (4):
http://www.dehonianos.org/portal

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