sábado, 1 de março de 2025

A montanha e a planície de cada dia

                                                      


A montanha e a planície de cada dia

Uma manhã fria, em que os raios do sol timidamente se escondem, como que desafiando a descida do Sol Nascente do alto da Montanha.

Era de manhã, ou tarde, pouco importa, o que importa é que acabara de apresentar aos discípulos o mais belo programa de vida: “O Sermão da Montanha”, as “Bem-Aventuranças”.

Suas Palavras naquele dia, como em todos os outros, para sempre gravadas na alma dos Seus e chegando até nós, comunicando calor, luminosidade que o mundo não pode dar.

Contemplo-O descendo a Montanha, com sorriso nos lábios, olhar de ternura para todos que a Ele se voltam: uma Palavra de perdão, compreensão, esperança, dos lábios saem.

Contemplo o sair dos Seus lábios palavras duras denunciando toda hipocrisia, maldade, indiferença, ambição, marginalização, exclusão que roubam a beleza da vida da humanidade.

Contemplo-O passando entre os pobres, que as mãos para Ele dirigem, rastejando no chão, com a mais doce confiança e espera de uma cura, força renovada, desejada libertação.

Como que ouço Seus passos, deixando pegadas para serem seguidas para sempre por quem quiser ser Seu discípulo, para ser d’Ele luz do mundo, sal da terra, vivendo a primazia do amor.

Contemplo Seu Coração, como que ouvindo as batidas de misericórdia e compaixão, o mesmo coração que foi transpassado, na mais sublime expressão de amor que ama até o fim.

Contemplo o Seu Coração pela lança transpassado, jorrando Água e Sangue, para vida nova nos comunicar (Batismo) e Alimento de eternidade nos conceder (Eucaristia).

Naquela tarde de nossa salvação, os lábios sem vida, os olhos cerrados, mas antes a humanidade a Mãe confiado, na pessoa do discípulo que tanto amava.

Naquela tarde, mãos e pés pregados, coração trespassado, precedidos de dor, choro, agonia a morte, enfrentados sem covardia, em fidelidade incondicional ao Pai por amor de nós.

Agora não mais na Cruz, contemplamos e cremos que Ele está glorioso, Ressuscitado, à direita do Pai sentado, tendo o Espírito a nós enviado, para Sua divina missão ser continuada.

É sempre tempo de subir à montanha, ouvir o que nos diz o Senhor; depois descer e, nutridos pelo Pão de cada dia, a fé, a esperança e o amor viver.

Não tenhamos medo, firmemos nossos passos, solidifiquemos nossa fé, esperança e caridade, num vínculo a ser vivido até a glória eterna, unindo-nos aos que nos precederam. Amém.

PS: Apropriado para a passagem do Evangelho de Lucas (Lc 6,17.20-26; Mt 5,1-12) 

Iluminados e conduzidos pela Sabedoria Divina


Iluminados e conduzidos pela Sabedoria Divina

À luz da passagem do Livro de Tiago (Tg 3,16-4,3), refletimos sobre os perigos que destroem uma comunidade, dentre outros: orgulho, ambição, inveja, competição, egoísmo...

Sendo assim, o batizado deve viver segundo os critérios de Deus, na vigilância e conversão permanente, para não ser conduzido pela  sabedoria do mundo, que não oferece um caminho para a realização plena do homem e da mulher, pois gera somente infelicidade, desordem, guerras, rivalidades, conflitos e mortes.

Somente conduzido pela sabedoria de Deus, terá o coração iluminado, e saberá fazer as corretas escolhas e ter acertadas decisões – “Mas a sabedoria que do alto vem é, primeiramente pura, depois pacífica, moderada, tratável, cheia de misericórdia e de bons frutos, sem parcialidade, e sem hipocrisia” (Tg 3,17).

Agindo assim, pode ter a confiança de que sua Oração, acompanhada de gestos concretos em favor da justiça, para colher frutos desejados, será por Deus ouvida: “Ora, o fruto da justiça semeia-se na paz, para os que exercitam a paz” (Tg 3,18).

Na fidelidade ao Senhor, vivendo o discipulado, sejamos iluminados e conduzidos pela Sabedoria Divina.

“Infância espiritual”: conquista da maturidade (12/08)

                                                   

        “Infância espiritual”: conquista da maturidade 

“Em verdade vos digo, se não vos tornardes como crianças,
não entrareis no Reino dos Céus. Pois o que se humilhar
até fazer-se semelhante a uma destas crianças,
este será grande no Reino dos Céus’ (Mt 18,3)
 
Retomemos o Sermão do Papa São Leão Magno, e aprendamos a melhor forma de humildade que o Senhor nos ensina quando adorado pelos magos.
 
Os magos, guiados pela estrela, foram ver uma Criança, um Menino; uma frágil Criança silenciosa, guardada por Sua mãe, Maria. 

Viram Aquele que cresceria em tamanho, sabedoria e graça diante de Deus e que, com sinais e poder, inauguraria o Reino de Deus.
 
O maior sinal de Seu poder, ali era oferecido na forma de uma Criança, em extrema expressão de humildade, que sem nada dizer já estava ensinando aos magos e a toda humanidade.
 
Crescendo em fidelidade e obediência ao Pai, suportou com grande brandura as crueldades dos que se levantavam contra Ele, quanto mais nós temos que ser humildes e pacientes nas provações e dificuldades por que tenhamos que passar.
 
Também crescendo em sabedoria, nos ensinou que a sabedoria cristã não consiste nem na abundância de palavras, nem da habilidade para discutir, nem no desejo de louvor e de glória, mas na sincera e voluntária humildade, e por isto nos apresentou uma criança como o maior no Reino dos Céus, acenando para a desejável infância espiritual que devemos buscar permanentemente.
 
Urge que mantenhamos sempre a “infância espiritual”, expressa na humildade, na simplicidade, na confiança incondicional em Deus, na realização de Sua vontade, assim como o Senhor nos falou.
 
Ainda temos muito que aprender com Aquela Criança, que um dia foi posta numa humilde manjedoura, Seu primeiro altar, naquele singelo presépio, para que percebamos os sinais de Deus em nosso meio e d’Ele também sejamos sinal para o outro, pois tão somente assim viveremos a “infância espiritual” e alcançaremos a maturidade desejada e necessária.
 
 
Fonte inspiradora:  Mt 18,1-5.10.12-14; Lc 9,46-50; Mc 9,33-37; Mc 10,13-16

Urge que sejamos luminosos!

                                                                     

Urge que sejamos luminosos!

Reflitamos o Comentário sobre o Eclesiastes, do Bispo São Gregório de Agrigento (séc. VI), renovando o nosso desejo, mais que necessário, que nos acompanha incessantemente: aproximarmo-nos de Deus, pois quanto mais próximos d’Ele, mais luminosos o seremos.

“Suave, diz o Eclesiastes, é esta luz e extremamente bom, para nossos olhos penetrantes, é contemplar o sol esplêndido. Pois sem a luz o mundo não teria beleza, a vida não seria vida. Por isto, já de antemão, o grande contemplador de Deus, Moisés, disse: E Deus viu a luz e declarou-a boa.

Porém é conveniente para nós pensar naquela grande, verdadeira e eterna luz que ilumina a todo homem que vem a este mundo, quer dizer, Cristo, Salvador e Redentor do mundo, que, feito homem, quis assumir ao máximo a condição humana.

D’Ele fala o Profeta Davi: Cantai a Deus, salmodiai a Seu nome, preparai o caminho para Aquele que Se dirige para o ocaso; Senhor é Seu nome; e exultai em Sua presença.

Suave declarou o Sábio ser a luz e prenunciou ser bom ver com Seus olhos o sol da glória, aquele sol que no tempo da divina encarnação disse: Eu sou a luz do mundo; quem me segue não caminha nas trevas, mas terá a luz da vida.

E outra vez: Este o juízo: a luz veio ao mundo. Desta maneira, pela luz do sol, gozo de nossos olhos corporais, anunciou o Sol da justiça espiritual, tão suave àqueles que foram encontrados dignos de conhecê-Lo.

Viam-no com seus próprios olhos, com Ele viviam e conversavam, como um homem qualquer, embora não fosse um qualquer. Era, de fato, verdadeiro Deus que deu vista aos cegos, fez os coxos andar, os surdos ouvir, limpou os leprosos, aos mortos devolveu a vida.

Todavia, mesmo agora é realmente delicioso vê-Lo com olhos espirituais e contemplar demoradamente Sua simples e divina beleza. Além disso, é delicioso, pela união e comunicação com Ele, tornar-se luminoso, ter o espírito banhado de doçura e revestido de santidade, adquirir o entendimento e vibrar de uma alegria divina que se estenda a todos os dias da presente vida.

O sábio Eclesiastes bem o indicou quando disse: Por muitos anos que viva o homem, em todos eles se alegrará. É evidente que o Autor de toda alegria o é para os que veem o Sol de justiça. D’Ele disse o Profeta Davi: Exultem diante da face de Deus, gozem na alegria; e também: Exultai, ó justos, no Senhor; aos retos convém o louvor”.

Há situações difíceis pelas quais passamos que por vezes parecem querer ofuscar ou mesmo apagar a Divina Chama que em nós, um dia no Batismo foi acesa.

Retomo alguns trechos para aprofundamento:

“Além disso, é delicioso, pela união e comunicação com Ele, tornar-se luminoso, ter o espírito banhado de doçura e revestido de santidade, adquirir o entendimento e vibrar de uma alegria divina que se estenda a todos os dias da presente vida.”

Luminosidade, doçura e santidade, entendimento, vibração de alegria... Tudo isto e muito mais alcançamos quando, D’Ele, a Divina Fonte de Luz e Amor, nos aproximamos: Cristo Jesus!

Fomos criados por Deus para sermos luminosos. Jamais deixemos as dificuldades apagarem nossa luz, nossa chama ardente da caridade, que se comunica com a Fonte Ardente de Caridade, Jesus. Não podemos permitir o ofuscar a luz nos olhos, que faz ressuscitar a confiança, a esperança, a bondade, a ternura, a serenidade, a misericórdia e o perdão em nosso coração.

Inebriados pela infinita doçura do Senhor, não sejamos amargos nos relacionamentos, pois nisto consiste o caminho da santidade de quem experimentou a verdadeira alegria de nutrir-se e renovar-se, a cada dia, na Mesa da Santa Eucaristia. 

As crianças e as virtudes divinas

                                                        

As crianças e as virtudes divinas

"Deixai vir a mim as crianças. Não as proibais,
porque delas é o Reino dos Céus"
 (Mt 19,14)
A fé, que nos acompanha no combate cotidiano,
É como o profético sorriso de uma criança,
Como que dizendo: “não desista de lutar, jamais!”

A fé, como semente e dom divino em nós plantado,
É como uma criança a crescer em tamanho, graça e sabedoria,
A vontade de Deus realizar, com o Pão nosso de cada dia.

A esperança é uma frágil criança caminhando pela floresta,
Totalmente sem medo, procurando o mel que sai da rocha,
Certa de que poderá saciar-se com a fina flor do trigo.

A esperança é tão pura quanto olhar de uma criança,
Que olha como que pedindo um pouco de atenção,
E nada mais quer, a não ser carinho e proteção.

A caridade entrelaça pessoas, culturas e povos,
Feito um abraço sincero e puro de uma criança,
Brincando de pega-pega, corre-corre, canto e dança.

A caridade, dom maior que jamais passará,
É como belas e eternizadas lembranças,
Com vigor sempre novo de uma eterna criança.

Assim entendo as virtudes divinas que nos movem,
Contemplando a pureza e a simplicidade de uma criança,
Revigorando-me para continuar a travessia do “deserto”.
Amém.


PS: oportuno para reflexão da passagem do Evangelho de Mateus (Mt 19,13-15; Mc 10,13-16).

O Tempo do Silêncio fecundo

O Tempo do Silêncio fecundo

“Que cada um esteja pronto para ouvir, mas
lento para falar e lento para encolerizar-se,
pois a cólera do homem não é capaz de
cumprir a justiça de Deus”. (Tg 2,19).

Reflitamos, à luz do versículo acima citado, sobre o perigo que a língua representa se não controlada pelas rédeas da sabedoria e da serenidade.

O autor do Livro do Eclesiástico já dissera:

“Não joeires a todos os ventos, nem te metas por qualquer trilha (assim faz o pecador de palavra dúplice). Sê firme em teu sentimento e seja uma a tua palavra. Sê pronto para escutar, mas lento para dar a resposta. Se sabes algo, responde a teu próximo; se não, põe a tua mão sobre a boca. Honra e confusão acompanham o loquaz, e a língua do homem é a sua ruína” (Eclo 5,11-15).

No lar, na escola, no trabalho, na Igreja e em quaisquer espaços que circulemos, estabelecemos relacionamentos com o outro.  As divergências se manifestam, os ruídos ensurdecedores se avolumam, palavras densas ou vazias se multiplicam indefinidamente. As palavras vão e vêm, ora sem conteúdo, ora sem ressonância, ora pertinentes, ora nem tanto.

É preciso ressuscitar o silêncio eloquente, frutuoso. O silêncio que fala na ausência das palavras.

Não estaria ocorrendo algo temeroso que os autores sagrados haviam percebido: fala-se demais, escuta-se pouco, dá-se vazão à cólera, à ira (o resultado bem conhecemos)?

Estamos no Tempo da Quaresma - Tempo favorável de conversão. Porém, independente de ser o Tempo da Quaresma, para crentes e não crentes, participantes ou não da fé católica, façamos deste o Tempo do Silêncio fecundo.

Façamos um propósito: ouvir mais, falar menos, e esvaziar o coração para que Deus possa plenificá-lo de Sua bondade, amor, graça e ternura.

Silêncio não como voto de mudez, mas propósito de cura da surdez ao outro: aos seus clamores, gritos, sofrimentos e dores.

Controle da língua. Sejamos menos loquazes, falemos menos, ouçamos mais. Rédeas curtas para a língua, e alargamento das veras do coração, para que movidos pelo essencial de nossa fé (Mandamento do Amor) saibamos ser mais fraternos, construindo amizades mais autênticas e eternas.

Menos palavras, mais silêncio. Maior abertura de coração ao outro, menos ira, raivas, rancores, ressentimentos.

Os autores há muito nos falaram, e, teimosamente, nos fazemos surdos às suas palavras.

Calemo-nos!
Controlemo-nos!
Ouçamos mais, amemos muito mais!

Na fidelidade ao Senhor, vivendo a vida nova dos que creem no Ressuscitado, discípulos do Verbo Encarnado, padecido, sofrido, morto e Ressuscitado, vivendo por matizes e horizontes eternais. 

Uma Igreja acolhedora, compassiva e missionária

 


Uma Igreja acolhedora, compassiva e missionária

“Em verdade vos digo: quem não receber o Reino de Deus como uma criança, não entrará nele”. (Mc 10,15)

Na comentário da passagem do Evangelho de  Marcos (Mc 10,13-16), O Missal Cotidiano nos apresenta duas citações de dois Catecismos, sobre a necessidade de receber o Reino de Deus como uma criança, para que nele se possa entrar:

- “Muitas vezes, na apreciação dos adultos, as crianças ficam privadas de significado e de valor, como os últimos chegados ao banquete da vida. São mesmo postas à margem e excluídas, em diferente medida, do convívio humano. A Palavra de Deus nos questiona de contínuo sobre a maneira de consideramos e tratarmos os pequeninos; questiona além disso cada comunidade ou cultura que oprima as crianças. Diz ‘não’ à opressão da criança; diz ‘sim’ quando pessoas e comunidades resolvem converter-se a Deus, e, portanto, segundo Sua Palavra, tornar-se como os pequeninos”. (1)

- O Senhor não eleva a ideal a inocência da criança – como talvez romanticamente sejamos levados a imaginar -, mas o sentir-se pequeno, ser receptivo e começar humildemente do começo. Como no Evangelho de João, onde Jesus diz a Nicodemos: ‘Se alguém não nascer de novo, não pode ver o Reino de Deus’ (Jo 3,3). A mesma atitude é indicada nas bem-aventuranças. Quem se faz pequenino desse modo é de fato disponível e se abandona à alegria de Deus. Quem se recusa não terá alegria”(2)

O Catecismo da Igreja Católica enriquece ainda mais com este parágrafo:

«Tornar-se criança» diante de Deus é a condição para entrar no Reino (Mt 18,3-4), e para isso, é preciso abaixar-se (Mt 23,12) tornar-se pequeno. Mais ainda: é preciso «nascer do Alto» (Jo 3, 7), «nascer de Deus» (Jo 1,13) para se «tornar filho de Deus» (Jo 1,12). O Mistério do Natal cumpre-se em nós quando Cristo «Se forma» em nós (Gl 4,19). O Natal é o mistério desta «admirável permuta»:

«O admirabile commercium! Creator generis humani, animatum corpus sumens de Virgine nasci dignatus est; et, procedens homo sine semine, largitus est nobis suam deitatem». – «Oh admirável permuta! O Criador do gênero humano, tomando corpo e alma, dignou-Se nascer duma Virgem; e, feito homem sem progenitor humano, tornou-nos participantes da sua divindade!» (Solenidade Santa Maria Mãe de Deus. (3)

É preciso superar uma visão “romantizada” da acolhida das crianças, retratada na passagem do Evangelho.

Vemos que o Senhor as desejou junto de Si, porque a Sua condição indefesa e excluída manifestava bem a realidade acerca dos discípulos e acerca do Reino que ela desejava transmitir:

“Como a criança precisa de atenção e de cuidados, quem está doente e em sofrimento encontra-se com as mesmas necessidades. Do mesmo modo o homem que vive no pecado. O pecador precisa sobretudo de reconciliação e solidariedade, de alguém que, sem julgar, o ajude a tomar consciência da sua situação e a escolher caminho da conversão.” (4)

No anúncio do Reino, a acolhida dos pequeninos, pobres e indefesos se torna um elemento constitutivo da prática dos discípulos missionários.

Uma Igreja acolhedora, solidária, compassiva e missionária que acolhe, integra e promove para a vida em plenitude (cf. Jo 10,10). Amém.

 

 

 

(1) CEI, Il catechismo dei bambini, 21 – citado no Missal Cotidiano – Editora Paulus – pag. 816

(2) O novo Catecismo holandês – idem

(3)Catecismo da Igreja Católica – parágrafo n. 526

(4) Lecionário Comentado – Volume I Tempo Comum – pág. 352

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