A penitência e a
graça do perdão
“Contra este dom
gratuito, contra esta graça de Deus
fala o coração
impenitente. Pois bem: esta impenitência é precisamente a blasfêmia contra o
Espírito,
que não terá perdão
nem nesta vida nem na futura.”
Sejamos
enriquecidos pelo Sermão escrito pelo bispo e doutor da Igreja, Santo Agostinho
(séc. V):
“A
leitura evangélica que acabamos de ouvir estabelece um problema difícil que não
estamos em situação de resolver somente com nossas forças: porém nossa
capacidade nos vem de Deus, na medida em que somos capazes de receber ou obter
o seu auxílio.
Em
Marcos, encontramos escrito: Crede-me,
tudo será perdoado aos homens: os pecados e qualquer blasfêmia que digam,
porém, o que blasfemar contra o Espírito Santo nunca terá perdão, carregarão
seu pecado para sempre.
Quem
blasfemar de qualquer forma contra o Espírito Santo, não teria motivo para
estar questionando de que tipo de blasfêmia se trata, pois se referiria a toda
blasfêmia, sem exceção. Porém, não se pode pensar que aos pagãos, aos judeus,
aos hereges e a toda essa multidão de homens que, com os seus diversos erros e
contradições, blasfemam contra o Espírito Santo, lhes seja tirada toda
esperança de perdão se chegarem a se corrigir.
Somente
nos resta compreender que na passagem em que se diz: O que blasfemar contra o Espírito Santo nunca terá perdão, tenha
de entender-se não do que blasfemar de qualquer modo contra o Espírito Santo,
mas aquele que o faz de um modo tal que o seu pecado torna-se irremissível.
Para
dispor-nos para a vida eterna que nos será concedida no último dia, o primeiro
dom que Deus nos concede ao abraçar a fé é o perdão dos pecados. Pois enquanto
eles permanecerem em nós, somos de certa forma inimigos de Deus, e estamos
afastados d’Ele por causa de nossa devassidão. De fato, a Escritura não mente
para nós quando diz: São as vossas culpas
que criaram separação entre vós e o vosso Deus.
Portanto,
Deus não deposita em nós os Seus bens, sem antes retirar nossos males. Aqueles
crescem na medida em que decrescem estes; e aqueles nem chegarão a sua
plenitude enquanto estes não tenham totalmente desaparecido.
Temos,
portanto, de admitir que o primeiro benefício que recebemos da bondade divina é
o perdão dos pecados no Espírito Santo. Pois no Espírito Santo - pelo qual o
povo de Deus é congregado na unidade - é precipitado o espírito imundo, que
está em guerra civil.
Contra
este dom gratuito, contra esta graça de Deus fala o coração impenitente. Pois
bem: esta impenitência é precisamente a blasfêmia contra o Espírito, que não
terá perdão nem nesta vida nem na futura.
De
fato, contra o Espírito Santo, em quem são batizados os que recebem o perdão
dos pecados e ao qual a Igreja recebe para que a quem perdoar os pecados lhe
sejam perdoados, contra este Espírito fala, ou com o pensamento ou com a
língua, palavras perversas e extremamente ímpias aquele que, quando a paciência
de Deus lhe estimula a penitência, com a
dureza do seu coração impenitente está armazenando para si castigos para o dia
do castigo, quando se revelará o justo juízo de Deus retribuindo a cada um
conforme as suas obras.
Esta
impenitência contra a qual clamam em uníssono o pregoeiro e o juiz, dizendo: Convertei-vos, porque está próximo o Reino de Deus, esta empedernida
impenitência é a que não tem perdão nem nesta vida nem na outra, pois a
penitência alcança o perdão nesta vida, válida para a futura.”
Como peregrinos da esperança, roguemos a Deus para que edifiquemos
uma Igreja sinodal, caminhando sempre juntos, com a humildade necessária,
reconhecendo nossa condição de pecadores, e necessitados da misericórdia
divina,
Que jamais sejamos impenitentes, fechados ao reconhecimento de
nossos pecados e impossibilitados de receber a graça e o amor divinos, que Deus
sempre está pronto a derramar em nossos corações pelo Espírito Santo (Rm 5,5).
(1) Lecionário Patrístico Dominical - Editora Vozes - 2013 - pp.405-406