Cura: interação da ação divina e humana
"Pois a glória de Deus é o homem vivo,
e a vida do homem é a visão de Deus. "
Reflitamos sobre a enfermidade e a cura, quando Jesus curou a sogra de Pedro, bem como a muitos enfermos de diversas doenças, ao final da tarde (Mc 1,29-39; Lc 4,38-44).
Assim lemos no Comentário do Missal Dominical:
“A experiência de uma enfermidade ou de uma situação de perigo pertence à da bagagem de todo homem.
Numa sociedade secularizada não existe o dilema entre dirigir-se ao médico ou recorrer à oração e acender uma vela.
Isto não quer dizer que tenha desaparecido a religiosidade ou que seja sintoma de ateísmo. Talvez se tenha simplesmente mudado o modo de encontrar-se com Deus.
O mundo foi confiado ao homem para que o transforme, construindo uma realidade sempre mais humana através da ciência e da organização social, que constituem o instrumento e as modalidades de transformação.
Esta tarefa se insere no quadro da relação Deus-homem e a ciência se torna seu lugar de encontro. E o é porque o homem, enquanto artífice no meio das realidades terrestres, se torna colaborador de Deus, e a ciência é a nova síntese baseando-se nos elementos do ‘criado-por-Deus’.
A ciência, pois, longe de afastar de Deus, aproxima mais profundamente dele, pelo respeito ao homem.
No quadro da fé, Cristo é libertador-vencedor da morte por Sua Ressurreição. Sua vitória é radical, mas em estado potencial. Cabe ao homem ‘novo’ tornar consistente esta vitória de Cristo.
Vencer a doença pela pesquisa científica significa ‘viver a Ressurreição de Cristo’. A libertação da moléstia, que a ciência realiza, assume uma significação particular no contexto do símbolo da libertação radical.
Debelar uma enfermidade, eliminar uma praga social, é símbolo-sacramento da libertação para a qual o Pai conduz a humanidade.”
Retomo duas afirmações para reflexão:
- “Numa sociedade secularizada não existe o dilema entre dirigir-se ao médico ou recorrer à oração e acender uma vela”;
- “Vencer a doença pela pesquisa científica significa ‘viver a Ressurreição de Cristo’”.
A oração, como expressão da fé em Deus, não dispensa a interação e colaboração do saber humano, das tecnologias, do desenvolvimento dos recursos disponíveis para debelar, curar as enfermidades das quais somos todos vulneráveis.
A fé em Deus, ao contrário, é um impulso para que mais pessoas tenham acesso ao que a medicina pode oferecer para curar e tornar a vida mais digna, mais humana.
A fé não dispensa compromissos com políticas públicas para que todos tenham acesso a um melhor atendimento médico, em Unidades Básicas, Postos de Saúde, Hospitais etc.
A fé em Deus nos leva à indignação e denúncia de desvios dos recursos que deveriam ser revertidos na promoção do bem comum, favorecendo melhores condições de atendimento a um enfermo, sobretudo os mais pobres.
Acender velas a Deus, confiando em Seu poder de curar, é possível e necessário, mas não se pode exigir que Ele faça o que esteja ao alcance de todos nós.
Urge vencer a doença pela pesquisa científica, a cada dia mais avançada, e isto nos faz verdadeiramente pascais, partícipes do Mistério da Paixão e Morte do Senhor, que veio no curar e nos salvar.
A cura de Deus, portanto, é graça, e podemos acender nossas velas em oração, mas sejam favorecidos todos os meios possíveis que o saber científico desenvolveu, como graça de Deus, para que as dores sejam amenizadas, enfermidades curadas.
Cura do corpo e da alma foram ações de Jesus, e serão sempre, pois Deus nos quer vivos e saudáveis, porque fomos criados à Sua imagem e semelhança, e, o Seu sopro de criador, recebemos, e nos tornamos Sua morada.
Finalizo com as palavras do Bispo Santo Irineu (séc. II):
“Pois a glória de Deus é o homem vivo, e a vida do homem é a visão de Deus. Com efeito, se a manifestação de Deus, através da criação dá a vida a todos os seres da terra, muito mais a manifestação do Pai, por meio do Verbo, dá a vida a todos os que veem a Deus”.
(1) Comentário do Missal Dominical - pág.893
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