“Por fora, luta; por dentro, temores”
Sejamos
enriquecidos pelo comentário sobre o Salmo 118, escrito pelo bispo e doutor da
Igreja, Santo Ambrósio (séc. IV).
“Todos os que querem viver piedosamente em
Cristo, sofrerão perseguição. O apóstolo escreveu “todos”, não excluiu
nenhum. Pois quem pode ser excluído quando o próprio Senhor tolerou as
tentativas de perseguição? A avareza persegue, a ambição persegue, a luxúria
persegue, a soberba persegue e os prazeres da carne perseguem. Não esqueças que
o apóstolo disse: fugi da fornicação.
E do que tu foges, senão daquilo que te persegue? O mau espírito da luxúria, o
mau espírito da avareza, o mau espírito da soberba.
Os
temíveis perseguidores são aqueles que, sem o terror da espada, constantemente
destroem o espírito do homem; aqueles que, mais com afagos do que com pavor,
submetem as almas dos fiéis. Estes são os inimigos dos quais deves te guardar;
estes são os tiranos mais perigosos, pelos quais Adão foi vencido. Muitos,
coroados em públicas perseguições, caíram nestas perseguições ocultas. Por fora, diz o apóstolo, lutas; por dentro, temores.
Observas
quão duro é o combate que há no interior do homem, para que se debata consigo
mesmo e lute contra as suas paixões. O próprio apóstolo vacila, duvida, é
atormentado e manifesta que está sujeito à lei do pecado e reduzido por seu
corpo à morte, e não poderia escapar se não fosse libertado pela graça de
Cristo Jesus.
E
assim como há muitas perseguições, assim também há muitos martírios. Todos os
dias és testemunha de Cristo. És mártir de Cristo se sofreste a tentação do
espírito de luxúria, porém, temeroso do futuro juízo, não pensaste em profanar
a pureza da alma e do corpo. És mártir de Cristo se foste tentado pelo espírito
de avareza para apossar-te dos bens dos mais fracos ou não respeitar o direito
das viúvas indefesas, porém, julgaste que era melhor alcançar a riqueza pela
contemplação dos preceitos divinos, que cometer a injustiça.
Cristo
quer estar próximo de tais testemunhas, conforme está escrito: aprendei a realizar o bem, buscai o justo,
respeitai ao oprimido, fazei a justiça ao órfão, e amparai a viúva: vinde e
entendamo-nos. És mártir de Cristo se foste tentado pelo espírito da
soberba, mas vendo ao fraco e desvalido, te compadeceste com espírito piedoso,
e amaste a humildade mais que a arrogância. E ainda mais se deste testemunho
não somente de palavra, mas também com obras.
Pois
quem é testemunha mais fiel do que aquele que confessa que o Senhor Jesus Se
encarnou, ao mesmo tempo em que guarda os preceitos do Evangelho? Porque quem
escuta e não coloca em prática, nega a Cristo. Ainda que o confesse por
palavra, o nega por obras. Porque existem muitos que dizem: Senhor, Senhor, não profetizamos em Teu
nome? Não expulsamos demônios em Teu nome? E não fizemos o bem em Teu nome? E
Ele lhes dirá naquele dia: Apartai-vos de mim todos vós que realizais a
iniquidade. Porque é testemunha aquele que, tornando-se fiador com suas
obras, confessa a Cristo Jesus.
Quantos,
todos os dias, são mártires de Cristo em segredo, que confessam ao Senhor Jesus
com suas obras! O apóstolo conhecia este martírio e testemunho fiel de Cristo,
quando afirmava: Esta é a nossa glória: o
testemunho de nossa consciência.” (1)
Na
fidelidade ao Senhor, como discípulos missionários, desafiador é o combate que
há no mais profundo de todos nós, para que melhor correspondamos na missão,
como nos falou o bispo:
“Observas quão duro
é o combate que há no interior do homem, para que se debata consigo mesmo e
lute contra as suas paixões.”
Concluímos rogando a Deus a força e a presença do Santo
Espírito, para que vivamos a graça da missão que Jesus nos confiou, encorajados
pelas palavras do apóstolo Paulo:
“Em verdade, quando chegamos à Macedônia, nossa carne não teve repouso algum, mas sofremos toda espécie de tribulação: por fora, luta; por dentro, temores.” (2 Cor 7,5).
(1)
Lecionário Patrístico Dominical, Editora Vozes – 2013 -
pp.163-164.
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