quinta-feira, 3 de abril de 2025

Coração pleno do Amor de Deus

                                                        

Coração pleno do Amor de Deus

Ouvimos na quarta Quinta-feira da Quaresma a passagem do Evangelho de João (Jo 5, 31-47) com o duro discurso de Jesus contra as acusações que recebeu dos judeus ao curar um homem paralítico há  38 anos, na piscina de Betesda.

Jesus diz claramente aos seus opositores: “Vós nunca ouvistes a Sua voz nem vistes a Sua face. Desse modo a Sua Palavra não permanece em vós {...} conheço-vos muito bem: o Amor de Deus não está dentro de vós” (Jo 5, 38-42).

Jesus constata que, infelizmente, os judeus, diante da cura realizada, e apesar dos inúmeros testemunhos e sinais realizados, permaneceram incrédulos, porque eram cheios de si mesmos e, portanto, privados de Deus.

Eles não reconheceram Jesus como Salvador nem a sua missão divina por Deus confiada, ainda que quatro testemunhos concorressem para a veracidade de Sua Pessoa e Missão Redentora da Humanidade (verdadeiramente Homem, verdadeiramente Deus):

- O testemunho dado por João Batista sobre a sua pessoa e missão;
As obras (sinais) que Ele realizava;
O próprio Deus, a quem chamava de Abbá (papaizinho)
- As Escrituras Sagradas, como a fonte de Vida, falam a Seu respeito: “Ele é a Palavra de Deus que Se faz Carne no meio da humanidade.”

Pode ocorrer o mesmo conosco: incredulidade no poder de Deus, frieza e indiferença à pessoa e missão de Jesus, dureza de coração e fechamento ao amor de Deus e, consequentemente, fragilização e empobrecimento de nossos relacionamentos com o outro.

Supliquemos a Deus para que nesta Quaresma, tempo favorável de conversão, transforme nosso coração de pedra em coração de carne, como tão bem expressou o Profeta Ezequiel (Ez 36,26), confiantes na misericórdia de Deus que não despreza um coração contrito e humilhado (Sl 50).

Provocados pela Palavra de Deus, pelas duras Palavras de Jesus no Evangelho, permitamos a ação transformadora e renovadora de Deus em nossa vida, abertos à Sua misericórdia, deixando-nos modelar por Suas mãos, como barro na mão do oleiro.

Deixando de lado toda letargia, preguiça, ilusões deste mundo, com nosso coração por Deus seduzido e indiviso, revigorados pela ação do Santo Espírito, na fidelidade a Cristo Servo Sofredor, glorioso e vencedor, não vacilemos jamais na fé, tão pouco esmoreçamos e tornemos ínfima nossa esperança, crescendo na prática da caridade, comunicando ao mundo a luminosidade divina que tanto se faz necessária.

quarta-feira, 2 de abril de 2025

A Quaresma e o Sacramento da Penitência

A Quaresma e o Sacramento da Penitência

“Eu confessar?” “Pra que se vou pecar de novo”; “Confessar com padre? Eu não! Confesso diretamente com Deus”; “Eu não tenho pecado, vou confessar o quê?”...

Estas expressões e outras semelhantes ouvimos muitas vezes, portanto, urge que aprofundemos sobre este assunto tão vital para uma vida cristã mais ativa, piedosa, consciente e frutuosa, conhecendo a Doutrina e a fundamentação bíblica do Sacramento da Penitência, que o Papa Francisco tanto insistiu em  sua Carta Apostólica “Misericordia et misera”.

A Igreja recorda-nos, precisamente neste Tempo da Quaresma, a necessidade irrevogável da Confissão Sacramental, para que possamos celebrar e viver a Ressurreição de Cristo, na Liturgia e no dia a dia.

O Tempo da Quaresma é oportuno para procurarmos um Sacerdote, a fim de receber um dos sete Sacramentos da Igreja, o Sacramento da Penitência. Bem entendido e vivido, este Sacramento nos introduz no Mistério do Amor de Deus, renova-nos, para que melhor imagem d’Ele sejamos: “sede santos como Deus é santo”.

Retomo as palavras de São Josemaria Escrivá, que aconselhava com critério simples e prático que as nossas confissões fossem concisas, concretas, claras e completas. Mais uma vez volto a elas, a fim de ajudar a quantos possa, e que desejem chegar melhor preparados para o Sacramento da Misericórdia Divina.

Confissão concisa, sem muitas palavras: apenas as necessárias para dizermos com humildade o que fizemos ou omitimos, sem nos estendermos desnecessariamente, sem adornos. A abundância de palavras denota às vezes o desejo, inconsciente ou não, de fugir da sinceridade direta e plena; para evitá-lo, temos que fazer bem o exame de consciência.

Confissão concreta, sem divagações, sem generalidades. O penitente “indicará oportunamente a sua situação e o tempo que decorreu desde a sua última confissão, bem como as dificuldades que teve para levar uma vida cristã”, declarando os seus pecados e o conjunto de circunstâncias que tenham caracterizado as suas faltas a fim de que o confessor possa julgar, absolver e curar.

Confissão clara, para sermos bem entendidos, declarando a natureza precisa das faltas e manifestando a nossa própria miséria com a necessária modéstia e delicadeza.

Confissão completa, íntegra, sem deixar de dizer nada por falsa vergonha, para “não ficar mal” diante do confessor.”

É sempre tempo favorável de nossa salvação, de não desperdiçarmos a graça de Deus, como bem falou o Apóstolo Paulo na Carta aos Coríntios. Sendo assim, exercemos a função de embaixadores em nome de Cristo, e é por meio de nós que o próprio Deus vos exorta. Em nome de Cristo, suplicamos: reconciliai-vos com Deus” (2Cor 5,20).

Do pecado da concupiscência, livrai-nos, Senhor

 




Do pecado da concupiscência, livrai-nos, Senhor

“Não ameis o mundo, nem o que há no mundo. Se alguém ama o mundo, não está nele o amor do Pai. Porque tudo o que há no mundo – o desejo da carne, o desejo dos olhos e a ostentação da riqueza, não vem do Pai, mas do mundo. Ora, o mundo passa, e também o seu desejo, mas aquele que faz a vontade de Deus, permanece para sempre” (1 Jo 16-17)

 

Vivendo o Tempo da quaresma, somos convidados a refletir sobre o pecado da concupiscência, que consiste na inclinação para o pecado a que todos estamos submetidos.

O Catecismo da Igreja, em diversos parágrafos, nos enriquece neste aprofundamento (1).

Como vimos na citação acima, São João distingue três espécies de cupidez ou concupiscência: 

-A concupiscência da carne;

- A concupiscência dos olhos;

- A soberba da vida.

 

Vejamos como compreender esta inclinação para o pecado?

 

- “No batizado permanecem, no entanto, certas consequências temporais do pecado, como os sofrimentos, a doença, a morte, ou as fragilidades inerentes à vida, como as fraquezas de carácter, etc., assim como uma inclinação para o pecado a que a Tradição chama concupiscência ou, metaforicamente, a «isca» ou «aguilhão» do pecado («fomes peccati»)...”  (n. 1264);

- “...No entanto, a vida nova recebida na iniciação cristã não suprimiu a fragilidade e a fraqueza da natureza humana, nem a inclinação para o pecado, a que a tradição chama concupiscência, a qual persiste nos batizados, a fim de que prestem as suas provas no combate da vida cristã, ajudados pela graça de Cristo (Concílio de Trento). Este combate é o da conversão, em vista da santidade e da vida eterna, a que o Senhor não se cansa de nos chamar (Concílio de Trento).” (n. 1426);

-“Em sentido etimológico, «concupiscência» pode designar todas as formas veementes de desejo humano. ... Desregra as faculdades morais do homem e, sem ser nenhuma falta em si mesma, inclina o homem para cometer pecado (Concílio de Trento).” (n.2515);

Assim compreendemos a tradição catequética católica, que no nono mandamento proíbe a concupiscência carnal; e no décimo, a cobiça dos bens alheios, e como batizados recebemos a graça da purificação de todos os pecados.

No entanto, o batizado tem de continuar a lutar contra a concupiscência da carne e os desejos desordenados, contando com a graça divina no combate aos movimentos da concupiscência que não cessam de nos arrastar para o mal (n.978):

- Pela virtude e pelo dom da castidade, pois esta permite amar com um coração reto e sem partilha;

– Pela pureza de intenção, que consiste em ter em vista o verdadeiro fim do homem: com um olhar simples, o batizado procura descobrir e cumprir em tudo a vontade de Deus (Rm 12,2; Cl 1,10);

– Pela pureza do olhar, exterior e interior; pela disciplina dos sentidos e da imaginação; pela rejeição da complacência em pensamentos impuros que o levariam a desviar-se do caminho dos mandamentos divinos: «a vista excita a paixão dos insensatos» (Sb 15, 5);

– Pela oração – vejamos o que nos diz Santo Agostinho nas Confissões: «Eu pensava que a continência dependia das minhas próprias forças, forças que em mim não conhecia. E era suficientemente louco para não saber [...] que ninguém pode ser continente, se Tu lho não concederes. E de certo Tu o terias concedido, se com gemido interior eu chamasse aos teus ouvidos e se com fé sólida lançasse em Ti o meu cuidado»”

Ainda sobre o pecado, afirma o Catecismo: “... o pecado torna os homens cúmplices uns dos outros, faz reinar entre eles a concupiscência, a violência e a injustiça. Os pecados provocam situações sociais e instituições contrárias à Bondade divina; as «estruturas de pecado» são expressão e efeito dos pecados pessoais e induzem as suas vítimas a que, por sua vez, cometam o mal. Constituem, em sentido analógico, um «pecado social» (Papa São João Paulo II).” (n.1869).

Como vemos, a inclinação para o pecado pode favorecer situações de pecado, que ultrapassam as relações humanas, provocando situações sociais de pecado, ou até mesmo em sua máxima expressão – “estruturas de pecado”: desestruturação de famílias, fome, miséria, destruição planetária, dominações e morte de vidas humanas e de toda a Casa Comum, como a Campanha da Fraternidade tanto nos ajuda a compreender e nos compromete, com seu tema – “Fraternidade e Ecologia Integral”, e lema – “A esperança não decepciona” (Rm 5,5).

Do pecado da concupiscência, livrai-nos, Senhor. Amém.

 

 (1) Catecismo da Igreja Católica: parágrafos números 978, 1264, 1426, 1869, 2514, 2515, 2517, 2520, 2529, 2534, 2542

Afastemo-nos do mal, amemos a paz!

                                                             


Afastemo-nos do mal, amemos a paz!

Com São Francisco de Paula, um eremita do século XV, reflitamos sobre o que nos ajuda ao afastamento do mal,  para amarmos a paz, fortalecendo nosso desejo e compromisso sincero de conversão.

“Afastai de vós toda espécie de ódio e inimizade, evitai cuidadosamente as palavras ásperas e inconvenientes, e se alguma vez tiverem saído de vossa boca, não vos envergonhai de levar o remédio com os mesmos lábios que provocaram a ferida.

Perdoai-vos uns aos outros e esquecei totalmente qualquer ofensa recebida. Guardar o sentimento do mal é uma injúria, é complemento da ira, retenção do pecado, ódio da justiça, veneno da alma, destruição das virtudes, verme da consciência, obstáculo da oração, impedimento das graças que pedimos a Deus, afastamento da caridade, espinho cravado na alma, maldade sempre desperta, pecado que nunca se apaga, morte cotidiana.

Amai a paz, que é o mais precioso de todos os tesouros. Sabeis certamente que os nossos pecados provocam a ira de Deus, portanto, corrigi-vos e arrependei-vos para que Deus vos poupe na Sua misericórdia.

O que ocultamos aos homens é manifesto a Deus. Convertei-vos, então, de coração sincero. Vivei de tal modo que mereçais receber a bênção do Senhor e a paz de Deus nosso Pai esteja sempre convosco.” Amém!

O Tempo da Quaresma faz reacender em nós o desejo do afastamento de toda a maldade, e de tudo aquilo que destrói a nossa amizade com Deus e a concórdia com o nosso próximo, ainda que o caminho seja árduo, espinhoso e aparentemente impossível.

Ressoem as palavras do Profeta Joel, rasgando nossos corações e não apenas as nossas vestes. Transformação interior e total e não apenas exterior e parcial. Não são poucas às vezes que conversamos com pessoas que nos pedem uma orientação para se afastarem do mal, do ressentimento, da intriga, da discórdia…

Afastemo-nos do mal, eliminando quaisquer ressentimentos, evitar e dissolver as intrigas, comprometidos com a concórdia e a fraternidade.

É preciso que resplandeçamos raios de luz, como instrumentos de paz que haveremos de sempre ser, porque somos Pascais, cremos na vitória do Ressuscitado, que reacendeu em nós os raios da caridade, que nutrem a concórdia, edificam e eternizam amizades.

PS: Memória celebrada no dia 02 de abril

Quaresma: O amor de Deus presente em nosso discipulado

                                                  

Quaresma: O amor de Deus presente em nosso discipulado

Na quarta-feira da 4ª semana do Tempo da Quaresma, ouvimos a passagem do Livro do Profeta Isaías (Is 49,8-15).

O Profeta Isaías nos ensina que Deus nunca nos abandona, e nos trata com verdadeiro amor de mãe, um amor instintivo, avassalador, eterno, gratuito e incondicional e infinito.

“Pode uma mulher esquecer-se daquele que amamenta? Não ter ternura pelo fruto de suas entranhas? E mesmo que ela o esquecesse, Eu não te esqueceria nunca.”

O Profeta, homem da confiança e esperança, é aquele que ajuda o Povo de Deus a perceber a presença divina em Sua aparente ausência, despertando para resposta amorosa a Ele, bem como ajuda também a perceber a face oculta de Deus revelada na ternura, misericórdia, compaixão...

Relacionar-se e corresponder a este Deus, somente assim o futuro tornar-se-á promissor.

Com a Palavra Divina em seus lábios, faz reacender a chama que não fumega no coração daquele que crê. Sempre precisamos de Profetas assim.

Quando tudo parece mais nada, há alguém que nos aponta o Todo Poderoso, o Onipotente, Aquele que para o qual nada é impossível: “Tudo podemos n’Aquele que nos fortalece” (Fl 4,13).

Quanto maior for nossa confiança em Deus, tanto mais crescerá nossa responsabilidade. Também poderemos dizer que a responsabilidade é diretamente proporcional à confiança que temos em Deus.

Santo Inácio de Loyola diz de forma límpida e contundente: “devemos confiar como se tudo dependesse de Deus e nos empenhar como se tudo dependesse de nós.”.

Deste modo deve ser hoje o Discípulo Missionário do Senhor: alguém que encontrou Jesus, uma Pessoa que mudou a sua vida, que somente terá sentido e conteúdo, quando em relacionamento contínuo e íntimo, renovado no Banquete da Eucaristia.

É preciso trilhar o itinerário quaresmal, fazendo progressos na santidade desejada, empenhados na construção do Reino, com total confiança em Deus e em Sua força, com disponibilidade, fidelidade, alegria e com muito amor a fim de que correspondamos ao Amor Divino que jamais nos falta.

Somente assim, comunicaremos a luz da Fonte de Luz, nas mais diversas situações obscuras, nas "cavernas sombrias e escuras" de nossa existência.

terça-feira, 1 de abril de 2025

Sábado Santo: celebremos a vitória do amor divino

                                                             

Sábado Santo: celebremos a vitória do amor divino

“...Desceu à mansão dos mortos...”

Segundo uma antiquíssima tradição, celebraremos amanhã, Sábado Santo, a Vigília Pascal em honra do Senhor, “a Mãe de todas as Vigílias”, como nos fala o Bispo e Doutor da Igreja, Santo Agostinho.

Ela deve ser realizada à noite (mas não começar antes do início da noite, terminando antes da aurora do Domingo, dia da Ressurreição do Senhor).

Trata-se da maior e a mais nobre de todas as Solenidades do Ano Litúrgico, pois nela celebramos em Memória da noite Santa em que Cristo Ressuscitou.

Com a Vigília, mantemos a vigilância à espera da Ressurreição do Senhor, e são celebrados os Sacramentos da Iniciação Cristã.

A Missa da Vigília é, por sua vez, a Missa Pascal do Domingo da Ressurreição, e consta de quatro partes:

a)          A bênção do fogo com o acender do Círio Pascal, sinal do Cristo Ressuscitado, seguido pelo precônio Pascal.
b)          A Liturgia da Palavra;
c)           A Liturgia Batismal com a renovação das promessas do Batismo ou mesmo Batismo (quando houver).
d)          Liturgia Eucarística

Enquanto aguardamos a Celebração da Vigília, reflitamos:

“Hoje, no Sábado Santo – o grande sábado, como foi chamado pelos Padres da Igreja -, não há nenhuma celebração Eucarística.

Somente as horas do Ofício Divino são rezadas, e são celebradas a capela, isto é, sem qualquer acompanhamento instrumental.

A Igreja observa um silêncio reverente neste dia em que o Senhor ‘repousou de toda a obra que fizera’ (Gn 2,2), toda a obra de amor e entrega que Ele realizou no Lenho da Cruz.

O grande teólogo suíço, Hans Urs Von Balthasar vê neste dia o ponto culminante da obra redentora de Cristo.

Descido à região dos mortos, Cristo se coloca no lugar da máxima distância do Pai – a distância entre o céu e o inferno.

Mas, como o eterno Filho, inseparável do Pai, Cristo transforma este lugar desprovido de Deus, fora do alcance de Deus, em um lugar dentro do abraço que une o Pai e o Filho.

Para Von Balthazar, assim a vitória do amor divino se manifesta como completa.

Por isto, todo joelho, ‘no céu, na terra e debaixo da terra se dobra e toda língua proclama ‘ Jesus Cristo é o Senhor’, para a glória de Deus Pai’ (Fl 2,10-11)”. (1)

“Creio em Deus Pai todo-poderoso...”


(1)         Igreja em Oração – Nossa Missa do dia a dia – Conferência Nacional dos Bispos do Brasil – CNBB - Ano V – n. 64 – abril 2020 – p.68

Que nossas comunidades sejam mais fraternas!

                                                          

Que nossas comunidades sejam mais fraternas!

Sejamos enriquecidos pela reflexão “Espelho da Caridade”, do Bem-aventurado Abade Elredo (séc. XII).

“Nada nos impele tanto ao amor dos inimigos – e é nisso que consiste a perfeição do amor fraterno – do que considerar com gratidão a admirável paciência de Cristo, o mais belo dos filhos dos homens (Sl 44,3).

Ele apresentou Seu rosto cheio de beleza aos ultrajes dos ímpios; deixou-os velar Seus olhos que governam o universo com um sinal; expôs Seu corpo aos açoites; submeteu às pontadas dos espinhos Sua cabeça, que faz tremer os principados e as potestades; entregou-Se aos opróbrios e às injúrias; finalmente, suportou com paciência a Cruz, os cravos, a lança, o fel e o vinagre, conservando em tudo a doçura, a mansidão e a serenidade.

Depois, como cordeiro levado ao matadouro ou como ovelha diante dos que a tosquiam, Ele não abriu a boca (Is 53,7). 

Ao ouvir esta palavra admirável, cheia de doçura, cheia de amor e de imperturbável serenidade: Pai, perdoa-lhes! (Lc 23,34), quem não abraçaria logo com todo o afeto os seus inimigos? Pai, perdoa-lhes!, disse Jesus. Poderá haver Oração que exprima maior mansidão e caridade?

Entretanto, Jesus não se contentou em pedir; quis ainda desculpar, e acrescentou: Pai, perdoa-lhes! Eles não sabem o que fazem! (Lc 23,34). São, na verdade, grandes pecadores, mas não sabem avaliar a gravidade de seu pecado. Por isso, Pai, perdoa-lhes!

Crucificaram-Me, mas não sabem a quem crucificaram, porque, se soubessem, não teriam crucificado o Senhor da glória (1Cor 2,8). Por isso, Pai, perdoa-lhes! Julgaram-Me um transgressor da lei, um usurpador da divindade, um sedutor do povo. Ocultei-lhes a minha face, não reconheceram a minha majestade. Por isso, Pai, perdoa-lhes! Eles não sabem o que fazem!

Por conseguinte, se o homem quer amar-se a si mesmo com amor autêntico, não se deixa corromper por nenhum prazer da carne. Para não sucumbir a essa concupiscência da carne, dirija todo o seu afeto à admirável humanidade do Senhor. Para encontrar mais perfeito e suave repouso nas delícias da caridade fraterna, abrace também com verdadeiro amor os seus inimigos. 

Mas, para que esse fogo divino não arrefeça diante das injúrias, contemple sem cessar, com os olhos do coração, a serena paciência de seu amado Senhor e Salvador”. (1)

Somos exortados a viver o amor fraterno inaugurador de novos tempos, prefiguração do Tempo Pascal, em que a morte cederá lugar à vida, o pecado à graça, dentro e fora dos espaços da comunidade.

São assustadoras as estatísticas de violência, bem como também é fundamental o crescimento e amadurecimento do amor nos espaços de nossas comunidades eclesiais; assim como a necessidade de nos revestirmos do “homem novo” como nos exorta o Apóstolo Paulo:  Renovai o vosso espírito e a vossa mentalidade. Revesti o homem novo” (Ef, 4,23-24).

Urge vencer todo fermento da maldade, como nos ensinou Jesus ao caminhar quarenta dias e noites pelo deserto, enfrentando as tentações satânicas da abundância, do domínio e do sucesso! (cf. Lc 4,1-13).

Como batizados, cristãos, que nossas súplicas a Deus sejam acompanhadas de renovadas atitudes de doçura, mansidão, serenidade, em maior fidelidade ao Senhor, como membros de Seu corpo que é a Igreja!

Seja a prática da oração, jejum e esmola vividos para que nos ajudem a edificar comunidades mais fraternas, instrumentos de um mundo melhor.


(1) Liturgia das Horas - Tempo da Quaresma/Pásoa - Vol. III – pp.114/116

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