Renasça a esperança
Em todo tempo, e, sobretudo na realidade sociopolítica nacional que vivemos, somos desafiados a dar razão de nossa esperança.
Iluminados sejamos pela passagem do Profeta Ezequiel (Ez 37, 21-28), na qual o Profeta anuncia o regresso do exílio em que se encontrava Israel, anunciando um futuro novo a ser vivido com a intervenção de Deus para o Seu Povo.
Será um tempo de reconstrução, de renovação interior em que o povo será purificado, santificado, e Deus com ele selará uma aliança eterna de paz, vindo morar em seu meio para sempre, o que se dará com a vinda de Jesus Cristo:
“É o Mistério Pascal de Cristo que nos purifica e santifica e que é penhor de uma nova e eterna Aliança entre Deus e toda a humanidade.” (1)
O tema da confiança e da esperança em Deus é recorrente nos textos proféticos, como também vemos na passagem do Profeta Jeremias (Jr 31, 10-13).
E aprofundando o tema da esperança, voltemo-nos para a “Octogésima Adveniens”, escrita pelo Papa São Paulo VI (1971) em comemoração aos oitenta anos da “Rerum novarum” (1891), retomando um preciso parágrafo (n.37):
“Nos nossos dias, aliás, as fraquezas das ideologias são melhor conhecidas através dos sistemas concretos, nos quais elas procuram passar à realização prática.
Socialismo burocrático, capitalismo tecnocrático e democracia autoritária, manifestam a dificuldade para resolver o grande problema humano de viver juntamente com os outros, na justiça e na igualdade.
Como poderiam eles, na verdade, evitar o materialismo, o egoísmo ou a violência que, fatalmente, os acompanham? Donde, uma contestação que começa a aparecer, mais ou menos por toda a parte, indício de um mal-estar profundo, ao mesmo tempo em que se assiste ao renascer daquilo que se convencionou chamar as utopias.
Estas pretendem resolver melhor do que as ideologias o problema político das sociedades modernas.
Seria perigoso deixar de reconhecer que o apelo à utopia não passa muitas vezes de pretexto cômodo para quem quer esquivar as tarefas concretas e refugiar-se num mundo imaginário.
Viver num futuro hipotético é um álibi fácil para poder alijar as responsabilidades imediatas.
Entretanto, é necessário reconhecê-lo, esta forma de crítica da sociedade existente provoca muitas vezes a imaginação prospectiva para, ao mesmo tempo, perceber no presente o possível ignorado, que aí se acha inscrito, e para orientar no sentido de um futuro novo; ela apoia, deste modo, a dinâmica social pela confiança ela dá às forças inventivas do espírito e do coração humano; e, se não rejeita nenhuma abertura, ela pode encontrar também o apelo cristão.
Na verdade, o Espírito do Senhor, que anima o homem renovado em Cristo, altera sem cessar os horizontes onde a sua inteligência gostaria de encontrar segurança e onde de bom grado a sua ação se confinaria: uma força habita no mesmo homem que o convida a superar todos os sistemas e todas as ideologias.
No coração do mundo permanece o mistério do próprio homem, o qual se descobre filho de Deus, no decurso de um processo histórico e psicológico em que lutam e se alternam violências e liberdade, peso do pecado e sopro do Espírito.
O dinamismo da fé cristã triunfa então dos cálculos mesquinhos do egoísmo. Animado pela virtude do Espírito de Jesus Cristo, Salvador dos homens, apoiado pela esperança, o cristão compromete-se na construção de uma cidade humana, pacífica, justa e fraterna, que possa ser uma oferenda agradável a Deus.
Efetivamente, "a expectativa de uma terra nova não deve enfraquecer, mas antes estimular em nós a solicitude em cultivar essa terra, onde cresce o corpo da nova família humana, que já consegue apresentar uma certa prefiguração do século vindouro (cf. “Gaudium et spes” n.11)."
O Missal Cotidiano, à luz da passagem bíblica e da palavra do Papa nos interroga: “Em que transformaria o mundo, se não possuísse homens capazes de acolher esta mensagem e de crer seriamente que este no mundo é chamado a uma transfiguração? O verdadeiro nome da utopia cristã é ‘esperança’” (2)
Urge renascer em nosso coração de quem professa a fé na Trindade Santo, a utopia, e o verdadeiro nome da utopia é a esperança cristã, acompanhada da fé, que vale agindo pela caridade, como tão bem expressa o Apóstolo Paulo (Gl 5, 6).
Renasça a esperança no canteiro de nossa mente e coração, nos quais são plantadas a semente da fé, para produzir frutos Pascais de caridade.
(1) Lecionário Comentado - Volume I - Tempo Comum - Editora Paulus - Lisboa - pág. 254
(2) Missal Cotidiano - Editora Paulus - pág. 312
Nenhum comentário:
Postar um comentário