De tanto ouvir falar da “ética”, um homem saiu pela cidade a procurá-la. Andou por palácios, casas nobres e outras mais simples; vagueou por ruas e becos, praças e avenidas; visitou igrejas, escolas, universidades, inúmeras ONGs, entidades, enfim, em todos os lugares possíveis.
Inquieto, procurava a tal “ética”. Em alguns lugares a viu mais explicitamente, em outros como que jazendo no leito de morte, em cinzas. Teve ainda lugares que lhe disseram que há muito ela não estava mais ali, porque atrapalhava negociações ilícitas, impedindo os conchavos que possibilitariam lucros ainda maiores.
Em sua procura, um dia foi questionado: - “Não sabemos o que é esta tal de ‘ética’, falam tanto dela, mas nunca a vimos por aqui. Ela existe de fato ou é apenas algo entre tantas coisas que dizem existir, mas não fazem parte do enredo da história da humanidade?”
Instigado, revisitou seus escritos e encontrou uma definição preliminar: “ética é o conjunto de princípios que norteiam, orientam o agir das pessoas, tendo em conta a prática da liberdade, da vontade e responsabilidade.”
Num dicionário, encontrou a seguinte definição: “Ética – grego ethike, de ethikós – que diz respeito aos costumes... Diferentemente da moral, a ética está mais preocupada em detectar os princípios de uma vida conforme a sabedoria filosófica, em elaborar uma reflexão sobre as razões de se desejar a justiça e a harmonia e sobre o meio de alcançá-las” (Japiassú – Ed. Zahar).
Continuou a refletir sobre o conceito de ética e sua presença nas relações entre as pessoas, e concluiu que, sem ética, sem princípios convincentes e autênticos, a justiça e a harmonia jamais poderão ser alcançadas, pois ficam comprometidas a liberdade, as vontades e as responsabilidades, e que, portanto, é preciso uma ética corresponsável, depurada de interesses mesquinhos, do contrário teremos o perigo da desvalorizarão e banalização da vida, e, consequentemente, a promoção da cultura da morte.
Concluiu ainda que é preciso repensar a ética, o conjunto de seus princípios, para que se construa uma civilização do amor, promovendo a cultura da vida e da paz, num permanente aprendizado para humanar as relações entre nós.
Mas como ressuscitar a ética? Como tirar da pauta das discussões e fundar novas e frutuosas relações? Ele encontrou algumas respostas.
Primeiro, é preciso palmilhar por veredas edificantes da vida, as veredas da esperança, do bem e da solidariedade, impondo silêncio às paixões avassaladoras, normalmente norteadas pelos pecados capitais (soberba, avareza, luxúria, ira, gula, inveja e preguiça).
Segundo, é preciso ter coragem de rever quais os valores que orientam nossas decisões, escolhas, caminhos, passos; rever se estes tornam a vida mais bela, humana, se nos tornam mais fraternos, solidários, promotores da defesa da vida, desde a sua concepção até o seu declínio natural.
Terceiro, professando uma fé ou não, que a ética seja a expressão do pensar, sentir e agir de pessoas de boa vontade, que promovem a paz, sem a violação da vida e o sacrifício de inocentes, sem fundamentalismos e radicalismos.
E depois de refletir as conclusões daquele homem, também nós podemos fazer a nossa própria avaliação, percebendo que assim como o sangue nada pelas veias para que a vida aconteça; assim como a linfa vital é imprescindível para o vigor e êxito da planta com suas flores e frutos; também a ética deve se fazer presente em todas as instâncias (espaços de decisões, campos diversos dos saberes e poderes), para que a vida não seja vilipendiada, mas promovida, amada, dignificada e, deste modo, possamos redescobrir e construir o Paraíso perdido, sem fúnebre saudade, mas com renovado compromisso e esperança.
Aquele homem visitou sim lugares sem conta, mas, por fim, viu que antes de tudo era preciso ter coragem de visitar a si mesmo, e ver de que modo a ética se fazia presente em sua vida, em suas decisões (família, trabalho, comunidade...).
E como cristãos, temos que ter a coragem de nos revisitar, e reconhecer, como morada do Espírito que somos, quais são os princípios éticos que norteiam nossa vida.
Como sal da terra e luz do mundo, há um princípio que não podemos jamais olvidar ou negligenciar: o Mandamento do amor a Deus, que se expressa concretamente no amor ao próximo. E tão somente assim, irradiaremos no mundo, por vezes obscuro e sombrio, um pouco mais de vida e luz, que emanam da fé que professamos e testemunhamos.
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