quarta-feira, 3 de setembro de 2025

Impermeabilidade...

                                                      

Impermeabilidade...

Há impermeabilidades não desejáveis e outras que devem nos acompanhar em todos os instantes.

Não quero a impermeabilidade indesejável do que me faça feliz,
Sobretudo, do coração ao convite de Amor que Deus sempre me faz.

Não quero a impermeabilidade do ouvido à Sua Palavra Santa e Divina,
Que, adentrando no mais profundo de minha alma, maviosamente ilumina.

Não quero impermeabilidade a tudo que me faz mais humano e fraterno;
Ao que permita abrir-me constantemente e absorver o melhor que Deus possa me oferecer.

Não quero a impermeabilidade dos incrédulos que não renovam sua fé,
Tão pouco revigoram sua esperança em gestos humanos e divinos de caridade.

Quero a impermeabilidade da mente para o que for fútil;
de modo que não seja invadida pelo relativismo das verdades pouco duráveis.

Quero a impermeabilidade da mente para tudo que me fragilize;
Também para que a coerência das atitudes tristemente não se pulverize.

Quero a impermeabilidade do coração para a maldade que o circunda;
Também para não ser corrompido pelas paixões que me desviam da Fonte Plena de Amor, Jesus.

Quero a impermeabilidade do coração para tudo que for abominável;
Também para que aberto tão apenas seja ao que for por Deus desejável.

Quero a impermeabilidade da alma para que não seja maculada
Pelos tentáculos dos pecados capitais que a vida destroem e obscurecem.

Quero a impermeabilidade da alma para que não se torne vulnerável,
Para não sucumbirem no vale do desamor, alma, espírito e corpo.

Quero a impermeabilidade do ouvido às palavras que não edificam,
Com suas seduções e conteúdos vazios que me empobreceriam.

Quero a impermeabilidade do ouvido para os profetas derrotistas,
Que não me comunicam, nem me renovam a esperança na humanidade.

Quero a impermeabilidade do olhar para o bem material não ambicionar;
Para saber com o pouco e necessário me alegrar, que a felicidade não passe pelo ter.

Entre as impermeabilidades abomináveis e outras desejáveis,
Continuo minha existência sem a impermeabilidade ao que me faça crescer...

Travessia em tempo de pandemia

 


  Travessia em tempo de pandemia 


A travessia pelo deserto em tempo de pandemia nos desafia:

Noticiário invade nossas casas, comunidades e outros espaços,

Inquietando-nos, roubando e adiando sonhos e projetos,

Mas haveremos de vencer juntos na solidariedade,

Comunhão, proximidade real ou virtual, quando possível,

Com a firme convicção de que lições haveremos de aprender.


Travessia com suas subtrações num rol imensurável:

Daqueles que partiram para a eternidade cedo demais;

Dos encontros, festas, aulas, formações e celebrações.

Travessia vivida como um pesadelo sem fim,

Em que somos desafiados a dar razão da esperança viva,

Fé inquebrantável e caridade vivida mais necessária.


Travessia com suas adições da mesma forma sucedem:

Soma de sorrisos que não empalidecem, apesar de toda a dor.

Soma de experiências que marcarão para sempre nossa vida,

Que não mais voltará a ser como antes, pois  

Navegávamos como que numa nave à deriva;

Ao encontro da tragédia que vivenciamos.


Travessia com suas multiplicações, contemplamos:

Multiplicaram-se esforços de crescimento, superação;

Esforços de vidas sacrificadas para que outros vivessem.

Quer nos espaços da comunidade ou do cotidiano,

Multiplicações de mil nomes de pessoas ora visíveis

Ora em anonimatos em heroicas atividades lembramos.

Travessia com suas divisões em gestos tantos vistos.


Aprendizado para repartir o pouco que se tem,

Para que, juntos, nos fortaleçamos e consigamos atravessar,

E a margem do horizonte do inédito que nos move, alcançar.

Divisão de responsabilidades sem lamentos, com dedicação,

A fim de que nada e a ninguém falte o essencial para sobreviver.

Travessia se faz sofrendo e aprendendo, incansavelmente.


Como assim o fez o Povo de Deus, narra a Sagrada Escritura;

Travessia que nos aproxima uns dos outros ao encontro do Outro,

Do Deus do Êxodo, da libertação, da solidariedade sempre presente,

Que jamais à nossa dor se faz cego, surdo, mudo e indiferente.

Amor que ama para que não desistamos da travessia.


“Iahweh disse: ‘Eu vi a miséria do meu povo que está no Egito.

Ouvi seu grito por causa dos opressores; pois eu conheço as suas 

angústias. Por isso desci a fim de libertá-lo da mão dos egípcios,

E para fazê-lo subir desta terra para uma terra boa e vasta,

Terra que emana leite e mel, o lugar dos cananeus, dos heteus, dos 

amorreus, dos ferezeus, dos heveus e jebuzeus’” (Ex 3,7-8).


PS: Escrito em 2020

 

Rezando com os Salmos - Sl 61 (62)

 


Somente em Deus confiamos e esperamos

“–1 Ao maestro do coro. Sobre Iditun. Salmo de Davi.
–2 Só em Deus a minha alma tem repouso,
porque d’Ele é que me vem a salvação!
–3 Só Ele é meu rochedo e salvação,
a fortaleza, onde encontro segurança!

–4 Até quando atacareis um pobre homem,
todos juntos, procurando derrubá-lo,
– como a parede que começa a inclinar-se,
ou um muro que está prestes a cair?

–5 Combinaram empurrar-me lá do alto,
e se comprazem em mentir e enganar;
– enquanto eles bendizem com os lábios;
no coração, bem lá do fundo, amaldiçoam.

–6 Só em Deus a minha alma tem repouso,
porque d’Ele é que me vem a salvação!
–7 Só Ele é meu rochedo e salvação,
a fortaleza, onde encontro segurança!

–8 A minha glória e salvação estão em Deus;
o meu refúgio e rocha firme é o Senhor!
=9 Povo todo, esperai sempre no Senhor,
e abri diante d’Ele o coração:
nosso Deus é um refúgio para nós!

–10 Todo homem a um sopro se assemelha,
o filho do homem é mentira e ilusão;
– se subissem todos eles na balança,
pesariam até menos do que o vento:

–11 Não confieis na opressão, na violência
nem vos gabeis de vossos roubos e enganos!
– E se crescerem vossas posses e riquezas,
a elas não prendais o coração!

=12 Uma palavra Deus falou, duas ouvi:
"O poder e a bondade a Deus pertencem,
pois pagais a cada um conforme as obras".

O Salmo 61(62) nos convida a colocar em Deus nossa esperança.

O salmista vive uma realidade de perseguição, mas coloca toda a confiança em Deus, que é o Seu apoio e força. Deste modo, exorta o povo a confiar em Deus e não nas ilusórias demonstrações de forças humanas (1).

De fato, a esperança deve estar em Deus, pois ela não nos decepciona (Rm 5,5), e tão somente n’Ele encontramos a verdadeira paz.

Em outra passagem, assim falou o Apóstolo Paulo aos Romanos:

“Que o Deus da esperança vos encha de toda alegria e paz em vossa fé. Assim, vossa esperança abundará, pelo poder do Espírito Santo (Rm 15,13).

Coloquemos também em Deus toda a nossa confiança e esperança. Amém.

(1) Comentário da Bíblia Edições CNBB – p.776


Senhor, quero falar contigo...

Senhor, quero falar contigo...

Senhor Jesus, 
Vós que Ressuscitastes e estais sentado à direita de Deus,
Sois a luz penetrante que invade minha alma,
Iluminai os lugares mais sombrios e obscuros de minha mente e pensamento,
Para que eu possa no mundo resplandecer a Vossa divina luz:
Com palavras, gestos, renovados compromissos batismais.
 
Senhor Jesus, para quem é impossível ocultar o que sou e quem sou,
Que conheceis o mais profundo de mim, pois bem aqui habitais.
Ajudai-me a perceber Vossa maviosa presença, 

sem jamais o esmorecimento e o pretenso retorno a “Emaús”, 
sem qualquer chama de alegria e esperança.
Reavivai em mim o sonho puro, a doce confiança, 

um coração terno de criança.
Senhor Jesus,  que quereis comigo estabelecer 
uma relação de profundidade/intimidade,
Que eu saiba corresponder à altura, ao Vosso incrível Amor, 
extremado na Morte de Cruz.
Que a lógica por mim vivida preencha todo meu ser.                      
Renove minha postura diante do outro e do mundo, 
porque se meu coração Pelo “fogo devorador” do Vosso Espírito, inflamado, passos firmados na santificação.
Senhor Jesus, que eu tenha coragem de confrontar 
a minha existência com a luz da Vossa Verdade;
Que não haja em mim espaço para a lógica 
da malícia, maldade, crueldade, infidelidade.
Somente pelo Vosso Amor incomparável, indizível, 

quero sedimentar cada momento:
Na família, na Igreja, na sociedade, no mundo, 

impregnado pela Vossa Divina Palavra, 
Nutrir-me do Pão de Imortalidade, 

inebriar-me do Vinho do Sagrado Cálice: 
ser Vosso fermento.
Senhor Jesus, que cada passo dado, 
cada página escrita, com a tinta do Amor
Do Vosso Santo Espírito o tenha sido, 
pois assim esperais de mim, é o que anseias.
Que eu lance âncoras na eternidade, 

num presente vivido em contínuos mergulhos
                          No mar infinito de Vossa misericórdia,                               
caridade, amor, ternura e bondade.
Somente assim serei de fato Pascal, 
buscando a glória da imortalidade.
Senhor Jesus que descestes à mansão triste e escura dos mortos;
Vós que por Amor não evitastes as entranhas obscuras do túmulo;
Que suportastes ser o Grão de Trigo no chão caído, morto,
 
Para que na glória fosseis pelo Pai Ressuscitado, Glorificado.
Que vivendo e crendo em Vós, 

um dia eu seja elevado para o alto, onde estais.
Senhor Jesus, como Vos amo!
Senhor Jesus, como Vos adoro!
Senhor Jesus, como nada ainda Vos amo!
Como nada ainda Vos adoro!
Senhor Jesus, por mais que Vos ame,
Jamais Vos amarei como me amais.
Senhor Jesus, uma súplica última:
Dilatai as medidas de meu coração.
Amém. 

“Por que as pessoas procuram uma religião?”

                                                           

Por que as pessoas procuram uma religião?”

Uma breve reflexão a partir da passagem do Evangelho proclamado na quarta feira da 22ª Semana do Tempo Comum (Lc 4, 38-44).

Uma pergunta aparentemente simples, mas nem tanto: “Por que as pessoas procuram a religião?”

Há os que acreditam que a maioria das pessoas que procuram a religião o faz por motivos egoístas, relacionando Deus como um grande servidor para obter a proteção, saúde, sucesso econômico, profissional, social ou afetivo.

Também pode ser para fugir do medo do desconhecido, do sobrenatural ou da própria morte, que se vislumbra irreversivelmente no horizonte de cada um de nós.

Outros afirmam que ela é um ópio que nos aliena da realidade em que nos encontramos inseridos, ocultando as complexidades e conflitos da sociedade.

Porém, há um autêntico motivo: a nossa configuração plena com Jesus. À luz dos Evangelhos, aprendemos a procurar na religião um relacionamento pessoal e amoroso com o próprio Deus, para que possamos servi-Lo amando os nossos irmãos e irmãs.

Nisto consiste o melhor conceito de religião, ainda que dito de forma sucinta: religar – religar-nos com Deus e com nosso próximo.

Torna-se um imperativo na vida do discípulo missionário do Senhor o conhecimento do Evangelho, no qual Ele nos anuncia a Boa-Nova do Reino de Deus.

O conhecimento do Evangelho interpela, inexoravelmente, à vivência concreta do amor, da solidariedade, do perdão, da partilha em relação com o nosso próximo.

Assim como Jesus no raiar do dia se recolheu em intimidade e Oração diante do Pai, também precisamos deste momento, em que nos colocamos num diálogo amoroso e frutuoso com o Deus Pai de Amor, para maior fidelidade ao Filho e continuidade de Sua missão com a força, sabedoria e luz do Santo Espírito.

Sem momentos de recolhimento, revigoramento de nossas forças, sem que nos deixemos interpelar por Deus e por Sua Palavra e vontade, podemos viver uma religião com matizes que subtraem o verdadeiro motivo da religião.

Portanto, é preciso que nossa vida seja mais intensamente configurada a Jesus, num relacionamento mais amoroso com Deus, para que mais fraternos o sejamos. 

Sejamos febris de amor pelo Senhor!

                                                          

Sejamos febris de amor pelo Senhor!

“Simão, filho de João, tu me amas mais que estes?” (Jo 21, 15)

Ressoa em meu coração aquela conversa séria, profunda, impactante,
que marcou a vida, o rumo do Apóstolo Pedro, e de toda a Igreja.

A tríplice interrogação do Senhor, a tríplice resposta de Pedro,
A tristeza que por um instante pareceu corroer seu coração.

Aborrecível sim, inegável, mas foi necessário,
Para que não O negasse nas horas que viriam.

A gloriosa manifestação do Ressuscitado (terceira aparição),
Marcada pela pesca, refeição e o primado da missão.

Quero mais que uma conversa sincera contigo, Pedro,
Quero também maviosas lições de ti aprender

Para apascentar o rebanho, pelo Senhor, a mim confiado,
Não pelos meus méritos, mas por Seu infinito amor e bondade.

Vejo-te, admiro-te, amo-te, Pedro, ontem.
Vejo-te, admiro-te, amo-te, Papa Leão XIV hoje.

Tiveste o coração trespassado pelas interrogações; a Palavra do Verbo
Para suportar outras chagas preanunciadas, reais, consumadas.

O Senhor, três vezes te indagando, comunica-te o perdão,
Porque também três vezes tu fizeste d’Ele a negação.

O Senhor tocou em tuas feridas ainda abertas,
Daquela noite inesquecível da tríplice indagação.

O Senhor quis curá-las, para que elas não te devorassem,
Quando tivesse que levar adiante a divina missão.

Pedro, navegarás por outros mares, outras redes lançarás,
Mas, na fidelidade à Palavra, pesca abundante sempre terás.

Enfrentarás os mares revoltosos da vida,
Não naufragarás no mar tempestuoso das paixões.

Não naufragarás neste e em outros mares,
Porque foste salvo no mar da misericórdia do Senhor.

O Senhor te chamou e perdoou, porque muito te amou,
O primado da missão, as chaves do Reino a ti confiou.

Não sucumbirás no mar das angústias que te cercarão,
Pela incompreensão, calúnias, cadeias e perseguição.

Pedro, terás que amar mais do que todos ao Senhor,
Mais do que o próprio discípulo amado que lá se encontrava.

Sem amor incondicional, fracasso na missão recebida;
Fracasso na condução do rebanho por Ele confiado.

Serás enamorado do Verbo, ao lado do discípulo amado,
Enamoramento iniciado, crescente, eternizado...

Terás que ter sabedoria divina para vencer todo medo,
Confiante na ação do Espírito, Divina Fonte de Sabedoria.

Sentirás tristezas momentâneas, inevitáveis,
Mas transformar-se-ão em alegrias eternas.

Suportarás fráguas, infortúnios incontáveis, tribulações,
Dificuldades, asperezas, incômodos, vicissitudes e tormentas.

Terás dias sombrios e difíceis, horas amargas de incompreensão,
Calúnia, perseguição, mas, do Senhor, terás consolo, confirmação.

Enfrentarás ventos contrários, muitas vezes
Nadarás em seco, remarás contra a maré.

Jamais nenhuma nuvem tenebrosa ofuscará o brilho
Que o Senhor te conferiu, porque sinal da Sua Luz te fez.

Ocupar-te-ás com o maravilhoso, com o ainda não visto,
Com a Novidade do Reino: novo céu e nova terra.

Terás a alma em suave e incomparável deleite,
Porque testemunha crível e amada do Senhor.

Terás fascínio indescritível pelo Senhor, porque tens
Um coração ardente em lavras vulcânicas de amor.

E serás intrépido e febril de amor pelo Senhor,
Amor incandescente que rios jamais poderão apagar.

Febricitante pela causa do Evangelho a anunciar,
Impulsionado pelo mesmo Evangelho a viver.

O zelo pelas coisas do Senhor te consumirá invejavelmente,
Nada mais te importará a não ser o Amado jamais desapontar.

Serás consumido em indescritível martírio de morte e dor,
Envolvido pelo suave odor do Amor do Senhor.

A paixão te levará no Senhor totalmente confiar,
Sem nenhuma resistência e oposição, bela expressão de amor.

Sim, terás o céu na terra, absorto em contemplação,
Sem desviar do caminho da entrega, da cruz, com convicção.

Terás que te entregar de corpo e alma à missão,
Apaixonado, eternamente feliz e apaixonado.

Verás que a felicidade é diretamente proporcional
Ao amor pelo Senhor testemunhado, também na cruz morrendo.

Terás prelibação em cada instante da vida pela causa assumida,
Mas não estarás livre da libação de teu sangue, anunciado martírio.

Tua impetuosidade, agora mais do que nunca necessária, será
Para não ruir na fidelidade à missão pelo Divino Mestre confiada.

Serás veemente convicto, irremovível pela causa do Evangelho,
Sem sucumbir à arrogância, à petulância pela graça da missão.

Se a chama inflamável da Palavra estava em teus lábios,
Porque antes a chama de Amor d’Ele em teu coração estava.

Pedro, assim é teu coração, que também o meu seja:
Tomado pela chama, fogo, labaredas de amor pelo Senhor.

Pedro, és para nós modelo de Fé e a Igreja nos convida
A aprender com aqueles que a fé testemunharam.

Pedro, quanto temos que aprender contigo,
Quanto temos que o mesmo amor viver!

Ontem o Senhor te interrogou sobre teu amor,
Agora é a mim que ele interroga, Pedro.

Que eu aprenda contigo a resposta com sabedoria dar,
Que também meu coração seja como o teu, Pedro:

Um coração inflamado de amor,
Febril de amor pelo Senhor.

Somente corações enternecidos pelo Senhor
É que se comprometem em criar um mundo novo.

Somente corações envolvidos pela ternura do Senhor
É que se comprometem em criar laços indestrutíveis de amor.

Obrigado, Pedro, por tão belas e eternas lições;
Aprendizes delas sejamos, mais que felizes seremos.

Amém. Aleluia! 

Cura: interação da ação divina e humana

                                                        


Cura: interação da ação divina e humana 

"Pois a glória de Deus é o homem vivo, 

e a vida do homem é a visão de Deus. "

Reflitamos sobre a enfermidade e a cura, quando Jesus curou a sogra de Pedro, bem como a muitos enfermos de diversas doenças, ao final da tarde (Mc 1,29-39; Lc 4,38-44).

Assim lemos no Comentário do Missal Dominical:

“A experiência de uma enfermidade ou de uma situação de perigo pertence à da bagagem de todo homem.

Numa sociedade secularizada não existe o dilema entre dirigir-se ao médico ou recorrer à oração e acender uma vela.

Isto não quer dizer que tenha desaparecido a religiosidade ou que seja sintoma de ateísmo. Talvez se tenha simplesmente mudado o modo de encontrar-se com Deus.

O mundo foi confiado ao homem para que o transforme, construindo uma realidade sempre mais humana através da ciência e da organização social, que constituem o instrumento e as modalidades de transformação.

Esta tarefa se insere no quadro da relação Deus-homem e a ciência se torna seu lugar de encontro. E o é porque o homem, enquanto artífice no meio das realidades terrestres, se torna colaborador de Deus, e a ciência é a nova síntese baseando-se nos elementos do ‘criado-por-Deus’.

A ciência, pois, longe de afastar de Deus, aproxima mais profundamente dele, pelo respeito ao homem.

No quadro da fé, Cristo é libertador-vencedor da morte por Sua Ressurreição. Sua vitória é radical, mas em estado potencial. Cabe ao homem ‘novo’ tornar consistente esta vitória de Cristo.

Vencer a doença pela pesquisa científica significa ‘viver a Ressurreição de Cristo’. A libertação da moléstia, que a ciência realiza, assume uma significação particular no contexto do símbolo da libertação radical.

Debelar uma enfermidade, eliminar uma praga social, é símbolo-sacramento da libertação para a qual o Pai conduz a humanidade.”

Retomo duas afirmações para reflexão:

- “Numa sociedade secularizada não existe o dilema entre dirigir-se ao médico ou recorrer à oração e acender uma vela”;

- “Vencer a doença pela pesquisa científica significa ‘viver a Ressurreição de Cristo’”.

A oração, como expressão da fé em Deus, não dispensa a interação e colaboração do saber humano, das tecnologias, do desenvolvimento dos recursos disponíveis para debelar, curar as enfermidades das quais somos todos vulneráveis.

A fé em Deus, ao contrário, é um impulso para que mais pessoas tenham acesso ao que a medicina pode oferecer para curar e tornar a vida mais digna, mais humana.

A fé não dispensa compromissos com políticas públicas para que todos tenham acesso a um melhor atendimento médico, em Unidades Básicas, Postos de Saúde, Hospitais etc.

A fé em Deus nos leva à indignação e denúncia de desvios dos recursos que deveriam ser revertidos na promoção do bem comum, favorecendo melhores condições de atendimento a um enfermo, sobretudo os mais pobres.

Acender velas a Deus, confiando em Seu poder de curar, é possível e necessário, mas não se pode exigir que Ele faça o que esteja ao alcance de todos nós.

Urge vencer a doença pela pesquisa científica, a cada dia mais avançada, e isto nos faz verdadeiramente pascais, partícipes do Mistério da Paixão e Morte do Senhor, que veio no curar e nos salvar.

A cura de Deus, portanto, é graça, e podemos acender nossas velas em oração, mas sejam favorecidos todos os meios possíveis que o saber científico desenvolveu, como graça de Deus, para que as dores sejam amenizadas, enfermidades curadas.

Cura do corpo e da alma foram ações de Jesus, e serão sempre, pois Deus nos quer vivos e saudáveis, porque fomos criados à Sua imagem e semelhança, e, o Seu sopro de criador, recebemos, e nos tornamos Sua morada.

Finalizo com as palavras do Bispo Santo Irineu (séc. II):

“Pois a glória de Deus é o homem vivo, e a vida do homem é a visão de Deus. Com efeito, se a manifestação de Deus, através da criação dá a vida a todos os seres da terra, muito mais a manifestação do Pai, por meio do Verbo, dá a vida a todos os que veem a Deus”.  

 

 

(1) Comentário do Missal Dominical - pág.893

 

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