A morte inevitável e a imortalidade desejada
Sejamos iluminados pelo Tratado sobre a morte, escrito pelo Bispo São Cipriano (séc. III).
“Lembremo-nos de que devemos fazer a vontade de Deus e não a nossa, de acordo com a Oração que o Senhor ordenou a ser realizada diariamente.
Que coisa mais fora de propósito, mais absurda: Pedimos que a vontade de Deus seja feita e quando Ele nos chama e nos convida a deixar este mundo, não obedecemos logo a Sua ordem!
Resistimos, relutamos e, quais escravos rebeldes, somos levados cheios de tristeza à presença de Deus, saindo daqui constrangidos pela necessidade, não por vontade dócil.
E ainda queremos ser honrados com os prêmios celestes a que chegamos de má vontade.
Por que então oramos e pedimos que venha o reino dos céus, se o cativeiro terreno nos encanta?
Por que, com preces frequentemente repetidas, suplicamos que se apresse o dia do Reino, se maior desejo e mais forte vontade são servir aqui ao demônio do que reinar com Cristo?
Se o mundo odeia o cristão, por que tu o amas, a ele que se aborrece, e não preferes seguir a Cristo que te remiu e te ama?
João em sua Carta clama, fala e exorta a que não amemos o mundo, deixando-nos levar pelos desejos da carne: Não ameis o mundo nem o que é do mundo.
Quem ama o mundo não tem em si a caridade do Pai: porque tudo quanto é do mundo é concupiscência dos olhos e ambição temporal.
O mundo passará e suas concupiscência; quem, porém, fizer a vontade de Deus, permanecerá eternamente (cf. 1 João 2,15-17).
Ao contrário, tenhamos, antes, irmãos diletos, íntegro entendimento, fé firme, virtude sólida, preparados para qualquer desígnio de Deus.
Repelido o pavor da morte, pensemos na imortalidade que se lhe seguirá. Com isso, manifestemos ser aquilo que acreditamos.
Irmãos caríssimos, importa meditar e pensar amiúde em que já renunciamos ao mundo e vivemos aqui provisoriamente como peregrinos e hóspedes.
Abracemos o dia que designará a cada um sua morada, restituindo-nos ao paraíso e ao Reino, uma vez arrebatados daqui e quebrados os laços terrenos.
Qual o peregrino que não se apressa em voltar à pátria? Nossa pátria é o paraíso.
O grande número de nossos queridos ali nos espera: Pais, irmãos, filhos.
Deseja estar conosco para sempre a grande multidão já segura de sua salvação, ainda solicita pela nossa.
Quanta alegria para eles e para nós chegarmos nós até eles e a seu abraço!
Que prazer estar ali, no Reino celeste, sem medo da morte, tendo a vida para sempre!
Que imensa e inesgotável felicidade! Lá o glorioso coro dos Apóstolos, lá o exultante grupo dos Profetas; lá, o incontável povo dos mártires coroados de glória e de triunfo pelos combates e sofrimentos; lá as virgens vitoriosas, que pelo vigor da continência corporal subjugaram a concupiscência da carne; lá remunerados os misericordiosos, que pelos alimentos e liberalidades aos pobres fizeram obras de justiça, e, observando o preceito do Senhor, transferiram seu patrimônio terreno para os tesouros celestes.
Para lá, irmãos caríssimos, corramos com ávida sofreguidão. Que Deus considere este nosso mundo de pensar! Que Cristo olhe este propósito do espírito e da fé!
Os maiores prêmios de Sua caridade Ele os dará àquele, cujos desejos forem intensos” (1).
Este Tratado nos concede um olhar novo e diferenciado sobre a morte à luz da fé.
A morte nos inquieta... Lutamos contra ela a cada segundo que passa... Quantas vezes diante de um corpo, num velório, ficamos sem palavras, pensando o que há de melhor para dizer...
Muitas vezes escutamos palavras que nada edificam como: “Foi vontade de Deus”, “Deus quis assim”...
Evidentemente que jamais desejamos a morte, mesmo porque, a fé cristã consiste em empenho constante em favor da vida.
Reflitamos:
- Como o suportá-la- e interpretá-la?
- Como preencher as lacunas que ela provoca na história de quem fica?
- Como voltar do abismo em que nos sentimos quando alguém parte?
Oremos:
De Deus viemos, nos movemos e somos! Para Deus haveremos de voltar.Uma morada na eternidade nos foi preparada.Que sejamos dignos dela e tudo façamos para merecê-la!Amém!
(1) Liturgia das Horas - Vol. IV – pp.-528-530.
De Deus viemos, nos movemos e somos!
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