quinta-feira, 4 de setembro de 2025

O mais alto objetivo da Arte

O mais alto objetivo da Arte

Atribui-se ao filósofo George Friedrich Hegel esta frase:

O mais alto objetivo da arte é o que é comum à Religião e à Filosofia. Tal como estas, é um modo de expressão do divino, das necessidades e exigências mais elevadas do Espírito”.

Neste sentido, a arte apresenta-se como um processo de infinitização do finito, um convite à reflexão, nos interrogando incessantemente, porque em perfeita sintonia e intimidade com o pensamento e o sentimento.

Segundo Delmo Mattos, “Enquanto ideia, a Arte concilia o infinito no finito, representa o Absoluto numa matéria sensível ou plástica, presentifica o divino em elementos sensíveis, revelando-se a verdade da Arte. Nessa manifestação sensível, material, do espírito, a Arte contradiz sua própria forma, o que ela deve exprimir: seu conteúdo infinito, divino” (1)

Esta reflexão nos remete à recente Mensagem Oficial da CNBB:

 “Em toda sua história, a Igreja sempre valorizou a cultura e a arte, por revelarem a grandeza da pessoa humana, criada à imagem e semelhança de Deus, fazendo emergir a beleza que conduz ao divino. ‘A arte é como uma porta aberta para o infinito, para uma beleza e para uma verdade que vão mais além da vida quotidiana’ (Bento XVI – 2011). O mundo no qual vivemos, ensina Paulo VI, precisa de beleza para não cair no desespero (Cf. Mensagem aos Artistas – 1965).

Reconhecemos que “para transmitir a mensagem que Cristo lhe confiou, a Igreja tem necessidade da arte” (São João Paulo II – Carta aos artistas 1999). Somos, por isso, agradecidos aos artistas pela infinidade de obras que enriquecem a cultura, animam o espírito e inspiram a fé.

 Merecem destaque a pintura, a música, a arquitetura, a escultura e tantas outras expressões artísticas que ressaltam a beleza da criação, do ser humano, da sexualidade, e o espírito religioso do povo brasileiro. Arte e fé, portanto, devem caminhar unidas, numa harmonia que respeita os valores e a sensibilidade de cada uma e de toda pessoa humana na sua cultura e nos seus valores”.(2)

Urge que se devolva à arte o seu mais alto objetivo, considerando tudo que vimos e ouvimos nestes dias.

Reconquiste a verdadeira arte espaços para que o espírito humano seja elevado, e que ela seja de fato “como uma porta aberta par ao infinito...”, como tão bem expressou o Papa Bento XVI.

A verdadeira arte é pão para nossa fome, e água cristalina para nossa sede do belo e elevação transcendente.



(1) Delmo Mattos em “o sublime e o belo artístico em Hegel”.
(2) Mensagem Oficial da CNBB - “Vencer a intolerância e o fundamentalismo”

A graça de pertencemos ao rebanho do Senhor

 


A graça de pertencemos ao rebanho do Senhor 
 
Reflexão à luz do Sermão do Bispo Santo Agostinho (séc. V) sobre os pastores e a vida de todos os cristãos.
 
“Não é de agora que vossa caridade sabe que nossa esperança está toda em Cristo e que nossa verdadeira glória de salvação é Ele. Sois do rebanho d’Aquele que guarda e apascenta Israel.
 
Mas por haver pastores que apreciam este nome, porém não querem exercer seu ofício, vejamos o que a seu respeito diz o Profeta. Escutai vós com atenção; escutemos nós com temor.
 
‘Foi-me dirigida a Palavra do Senhor que dizia: Filho do homem, profetiza contra os pastores e dize aos pastores de Israel’ (Ez 34,1-2).
 
Acabamos de ouvir a leitura deste trecho; resolvemos então falar-vos algo. O Senhor nos ajudará a dizer o que é verdadeiro, se não dissermos o que é nosso. Pois se dissermos o que é nosso seremos pastores a nos apascentar a nós, não as ovelhas. Se, ao contrário, dissermos o que é d’Ele, será Ele que vos apascenta por intermédio de quem quer que seja.
 
Assim diz o Senhor Deus: Ó pastores de Israel, que se apascentam a si mesmos! Acaso não são as ovelhas que os pastores têm de apascentar? (Ez 34,2) quer dizer, os pastores apascentam ovelhas, não a si mesmos. É este o primeiro motivo de repreensão a tais pastores, que apascentam a si e não as ovelhas. Quem são estes que se apascentam? O Apóstolo diz: ‘Todos procuram seu interesse, não o de Jesus Cristo’ (Fl 2,21).
 
Quanto a nós, a quem o Senhor, por Sua benevolência e não por mérito nosso, estabeleceu neste cargo de que teremos difíceis contas a dar, devemos distinguir bem duas coisas: a primeira, somos cristãos, a segunda, somos bispos. Somos cristãos para nosso proveito; e somos bispos para vós. Como cristãos, atendemos ao proveito nosso; como bispos, somente ao vosso.
 
E são muitos os cristãos não bispos que vão a Deus por caminho mais fácil talvez, e andam com tanto mais desembaraço quanto menos peso carregam. Nós, porém, além de cristãos, tendo de prestar contas a Deus de nossa vida, somos também bispos e teremos de responder a Deus por nossa administração”.
 
Sempre tempo favorável para que avaliemos nossa vida cristã, se está de acordo com a vontade de Deus, na fidelidade a Jesus, assistidos pelo Espírito Santo.
 
Do mesmo modo, é sempre tempo favorável para rever como vivemos a vida nova que recebemos no dia de nosso Batismo.
 
Neste mês, especialmente dedicado à Bíblia, roguemos a Deus a sabedoria, coragem e mansidão para que vivamos a graça da missão evangelizadora, e que a Palavra de Deus seja sempre a luz de nosso caminho. Amém.
 

quarta-feira, 3 de setembro de 2025

A oração e prática da Palavra divina

 


A oração e prática da Palavra divina

Reflexão à luz da Carta de São Tiago (Tg 1,17-18.21-22.27), sobre a inseparável relação  entre fé e obras.

O autor da Carta nos exorta a não sermos meros ouvintes da Palavra, mas praticantes, não nos enganando a nós mesmos.

A fidelidade aos ensinamentos de Cristo nos compromete com o próximo (representado na figura do órfão e da viúva), e nisto consiste a verdadeira religião, pura e sem mancha: solidariedade vivida e vigilância, para não se contaminar com os contravalores que o mundo apresenta.

É preciso, portanto, superar a frieza, o legalismo e o ritualismo religioso, procurando viver uma Religião comprometida com o Reino por Jesus inaugurado.

A Palavra de Deus quer encontrar no coração humano a frutuosa acolhida, portanto, há um itinerário da Palavra: acolher, acreditar, anunciar e testemunhar a Palavra de Deus, que nos garante vida e felicidade plena.

É preciso que demos mais tempo à Palavra de Deus, em frutuosa oração e reflexão, que farão brotar novas atitudes e compromissos com Deus e o Seu Projeto para a humanidade.

É sempre tempo de cultivar maior intimidade e compromisso com a Palavra de Deus, e fundamental que valorizemos a prática da leitura orante com seus passos, a lectio divina, composta por quatro etapas: 1) lectio (leitura), 2) meditatio (meditação), 3) oratio (oração) e 4) contemplatio (contemplação).

 

Em poucas palavras...

                                                   


“Mas é Deus que primeiro chama o homem...”

“Mas é Deus que primeiro chama o homem. Muito embora o homem se esqueça do seu Criador ou se esconda da sua face, corra atrás dos ídolos ou acuse a divindade de o ter abandonado, o Deus vivo e verdadeiro chama incansavelmente cada pessoa ao misterioso encontro da oração.

Na oração, é sempre o amor do Deus fiel a dar o primeiro passo; o passo do homem é sempre uma resposta. A medida que Deus Se revela e revela o homem a si mesmo, a oração surge como um apelo recíproco, um drama de aliança. 

Através das palavras e dos atos, este drama compromete o coração e manifesta-se ao longo de toda a história da Salvação.”

 

(1)   Catecismo da Igreja Católica – parágrafo 2.567

 

Em poucas palavras...

                                          


Pecados que bradam ao céu

“A tradição catequética lembra também a existência de «pecados que bradam ao céu».

Bradam ao céu: o sangue de Abel (Gn 4,10); o pecado dos sodomitas (Gn 18,20; 19,13); o clamor do povo oprimido no Egito (Ex 3,7-10); o lamento do estrangeiro, da viúva e do órfão (Ex 20,20-22); a injustiça para com o assalariado (Dt 24,14-15; Tg 5,4).”  (1)

 

(1)               Catecismo da Igreja Católica – parágrafo n. 1867

Ninguém nos amou tanto assim!

                                                     

Ninguém nos amou tanto assim!

À luz de um dos Sermões do Bispo Santo Agostinho (Séc. V), reflitamos sobre a preciosa morte dos mártires, cujo preço foi a morte de Cristo.

“Pelos feitos tão gloriosos dos mártires, que fazem a Igreja florescer por toda parte, provamos com nossos próprios olhos como é verdadeiro o que cantamos: É preciosa aos olhos do Senhor a morte de seus santos (Sl 115,15). Portanto, é preciosa não só aos nossos olhos, mas aos olhos daquele por cujo nome se sofreu. Contudo o preço destas mortes é a morte de um só.

Quantas mortes comprou um só com a sua morte? Se ele não morresse, o grão de trigo não se multiplicaria. Ouvistes suas palavras, estando próxima a paixão, quer dizer, quando se aproximava nossa redenção: Se o grão de trigo, caindo em terra, não morrer, ficará sozinho; morrendo, porém, produzirá muito fruto (Jo 12,24).

Houve na cruz um grande comércio: abriu-se ali a bolsa para pagar nosso custo; quando seu lado foi aberto pela lança do que feria, dali correu o preço do mundo inteiro. Foram comprados fiéis e mártires; mas a fé dos mártires suportou a prova: o sangue é testemunha. Retribuíram o que tinha sido pago por eles e realizaram as palavras de São João: Assim como Cristo entregou sua vida por nós, também nós devemos entregar nossas vidas pelos irmãos (cf. 1Jo 3,16).

E em outro lugar se disse: Sentaste à grande mesa, observa com cuidado o que te oferecem porque deves preparar o mesmo (Pr 23,1-2). A grande mesa é aquela em que as iguarias são o próprio Senhor da mesa. Ninguém alimenta os convivas com sua pessoa, mas assim procede o Cristo Senhor: ele é que convida, ele é o pão e a bebida. Portanto, os mártires reconheceram o que comeram e o que beberam, para retribuírem o mesmo.

Mas como retribuir, a não ser que lhes desse com que retribuir aquele que primeiro pagou? Que retribuirei ao Senhor por tudo quanto me deu? Tomarei o cálice da salvação (Sl 115,12-13). Que cálice é este? O cálice da paixão, amargo e salutar; cálice que, se dele não bebesse antes o médico, o doente temeria tocá-lo.

É ele este cálice. Nós o reconhecemos nos lábios de Cristo que dizia: Pai, se possível for afaste-se de mim este cálice (Mt 26,39). Deste mesmo cálice disseram os mártires: Tomarei o cálice da salvação e invocarei o nome do Senhor (Sl 115,13).

Não temos então medo de fraquejar? Por quê? Porque invocaremos o nome do Senhor. Como venceriam os mártires, se neles não vencesse aquele que disse: Alegrai-vos porque eu venci o mundo? (Jo 16,33).

O soberano dos céus governava-lhes a mente e a língua e, através deles, derrotava o diabo na terra e coroava os mártires no céu. Felizes os que assim beberam deste cálice: terminaram as dores, receberam as honras!”.

Fomos resgatados pelo Senhor em Sua morte na cruz, como nos falou o Bispo: “Houve na cruz um grande comércio: abriu-se ali a bolsa para pagar nosso custo; quando seu lado foi aberto pela lança do que feria, dali correu o preço do mundo inteiro”.

Resgatados, reconciliados e alimentados pelo Seu Corpo e Sangue, como partícipes do Banquete Eucarístico, para levar adiante a sua missão com coragem, como peregrinos da esperança, enfrentando as adversidades e até mesmo o martírio, como inúmeros assim testemunharam ao longo da história.

Correspondamos cada vez mais ao imenso amor de Deus que tendo nos amado, nos amou até o fim por meio do Seu Filho, como nos falou o Evangelista São João - Pois Deus amou tanto o mundo, que entregou o Seu Filho único, para que todo o que n’Ele crê não pereça, mas tenha a vida eterna” (Jo 3,16), e assim estaremos trilhando o caminho da verdadeira felicidade e vida plena e eterna.

Impermeabilidade...

                                                      

Impermeabilidade...

Há impermeabilidades não desejáveis e outras que devem nos acompanhar em todos os instantes.

Não quero a impermeabilidade indesejável do que me faça feliz,
Sobretudo, do coração ao convite de Amor que Deus sempre me faz.

Não quero a impermeabilidade do ouvido à Sua Palavra Santa e Divina,
Que, adentrando no mais profundo de minha alma, maviosamente ilumina.

Não quero impermeabilidade a tudo que me faz mais humano e fraterno;
Ao que permita abrir-me constantemente e absorver o melhor que Deus possa me oferecer.

Não quero a impermeabilidade dos incrédulos que não renovam sua fé,
Tão pouco revigoram sua esperança em gestos humanos e divinos de caridade.

Quero a impermeabilidade da mente para o que for fútil;
de modo que não seja invadida pelo relativismo das verdades pouco duráveis.

Quero a impermeabilidade da mente para tudo que me fragilize;
Também para que a coerência das atitudes tristemente não se pulverize.

Quero a impermeabilidade do coração para a maldade que o circunda;
Também para não ser corrompido pelas paixões que me desviam da Fonte Plena de Amor, Jesus.

Quero a impermeabilidade do coração para tudo que for abominável;
Também para que aberto tão apenas seja ao que for por Deus desejável.

Quero a impermeabilidade da alma para que não seja maculada
Pelos tentáculos dos pecados capitais que a vida destroem e obscurecem.

Quero a impermeabilidade da alma para que não se torne vulnerável,
Para não sucumbirem no vale do desamor, alma, espírito e corpo.

Quero a impermeabilidade do ouvido às palavras que não edificam,
Com suas seduções e conteúdos vazios que me empobreceriam.

Quero a impermeabilidade do ouvido para os profetas derrotistas,
Que não me comunicam, nem me renovam a esperança na humanidade.

Quero a impermeabilidade do olhar para o bem material não ambicionar;
Para saber com o pouco e necessário me alegrar, que a felicidade não passe pelo ter.

Entre as impermeabilidades abomináveis e outras desejáveis,
Continuo minha existência sem a impermeabilidade ao que me faça crescer...

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4º Bispo da Diocese de Guanhães - MG