domingo, 6 de julho de 2025

Humildade e mansidão do Senhor (XIVDTCA)

Humildade e mansidão do Senhor

"Vinde, pois, e aprendei de mim,
que sou manso e humilde de coração!"

Na Liturgia do 14º Domingo do Tempo Comum (ano A) ouvimos a passagem do Evangelho (Mt 11,25-30), e somos enriquecidos com o Sermão do Bispo São João Crisóstomo (séc. IV), refletindo sobre a humildade e mansidão de coração de Nosso Senhor.

“Vês, amante de Cristo, quanta seja a misericórdia do Criador para conosco?

Vês como nas mesmas ameaças brilha a benignidade? Vês como Sua misericórdia se antecede a Sua indignação? Vês como o castigo é superado pela bondade?

Isto não é maravilhoso! Porque Ele mesmo é manso e benigno Senhor nosso, e solícito, como é de Seu costume, de nossa salvação, que claramente nos fala no Evangelho, como a pouco nos fazia quando nos lia:

Vinde a mim e aprendei de mim, porque sou manso e humilde de coração! Quanto Se abaixa o Criador, e, apesar disso, a criatura não O reverencia!

Vinde e aprendei de mim!, disse o Senhor quando veio aos Seus servos para consolá-los em suas quedas. Assim Cristo Se porta conosco, e assim nos demonstra a Sua misericórdia.

Quando convinha castigar os pecadores e acabar com sua espécie que O irritou, justamente então Se dirige aos réus com Palavras brandas e lhes diz:

Vinde e aprendei de mim, que sou manso e humilde de coração! Deus Se humilha e o homem se ensoberbece!

Manso é o juiz e soberbo o réu! Humilde voz lança o artífice, e o barro fala como se fosse algum rei! Ó, vinde e aprendei de mim, que Sou manso e humilde de coração!

Não vos curvaram os acontecimentos anteriores; não vos amansaram os que logo se seguiram; nem finalmente os que ao pouco sobrevieram!

Porém Ele, como então, também agora, uma vez que fez tremer as criaturas, logo as pacificou com a Sua misericórdia. Vinde, pois, e aprendei de mim, que sou manso e humilde de coração!

Ele não vem com chicote para açoitar, mas com nossa natureza para curar! Vinde e vede Sua inefável bondade!

Quem não ama ao amo que não açoita? Quem não se admira do juiz que suplica ao réu? Te enches completamente de admiração a humildade de Suas Palavras?

Sou Artífice e amo a minha obra! Eu sou Obreiro e perdoo aquele que Eu mesmo inventei! Se eu uso do supremo direito que me dá minha dignidade, não levantarei a humanidade caída; e como ela padece de uma enfermidade incurável, se não uso de remédios suaves, ela não poderá se curar!

Se não trato a humanidade e a pessoa humana com benignidade, perece! Se somente uso de ameaças, perde-se! Por isto, aplico, como a quem está caído, medicamentos de suavidade. Abaixo-me ao máximo na comiseração para levantá-la de sua queda!

Aquele que está em pé não consegue levantar ao caído se não abaixar sua mão. Pois vinde e aprendei de mim, que sou manso e humilde de coração! Não falo para ostentação: pelos fatos vos dei experiência. Que Eu seja manso e humilde de coração, podes deduzir do estado em que me vês e ao qual Eu vim.

Analisa minha forma e qual seja minha dignidade: medita-o e adora-me! Por ti me humilhei! Pensa de que lugar desci e em que lugar falo contigo.

Sendo o céu meu trono, agora falo contigo na terra. Nas alturas sou glorificado, porém, como magnânimo, não me encolerizo, porque sou manso e humilde de coração!

Se Eu não fosse um manso Filho do Rei, não teria escolhido por mãe uma serva. 

Se Eu não fosse manso, o Artífice das substâncias visíveis e invisíveis, não teria me desterrado aqui convosco.

Se não fosse manso, não teria estado Eu, o Pai do século futuro, envolto em pano.

Se não fosse manso, não teria suportado a pobreza do presépio, Eu que possuo todas as riquezas de todas as criaturas.

Se não fosse manso, não me teria encontrado entre animais, Eu a quem os querubins não ousam olhar.

Se Eu não fosse manso, que com minha saliva dou vista aos cegos, jamais teria sido cuspido pela boca de homens maus.

Se não fosse manso, nunca teria tolerado a bofetada de um servo, Eu que sou quem dá liberdade aos servos.

Se não fosse manso, jamais teria apresentado minhas costas aos açoites em benefício dos escravos.

Mas por que não digo o que é ainda maior?

Se eu não fosse manso, nunca teria carregado a dívida de morte, Eu que nada devia, em lugar daqueles que deviam padecê-la.” (1)

Concluindo, a mansidão do Senhor e o Seu Amor dão “vertigem”, porque ultrapassam todas as medidas, parâmetros, lógicas humanas.

Neste Coração manso e humilde, o discípulo amado recostou sua cabeça.

Neste mesmo coração também podemos, quantas vezes quisermos, o mesmo fazer, para que nos sintamos amados, perdoados, e renovados para carregar, com fidelidade e coragem, nossa cruz.

Neste Coração manso e humilde encontramos espaço, porque dilatado na Cruz, para que nele coubéssemos. 

Nele encontramos forças para alcançarmos a vida plena e digna já, nesta travessia por que passamos, até que um dia possamos na glória dos céus, entrar, e a face do Pai contemplar, na plena comunhão do Espírito, vivendo e crendo em Jesus, que Se fez o Caminho, a Verdade e a Vida.

Também n'Ele, os enfermos renovam forças; desesperados reencontram a esperança; os fracassos superados seguidos de vitórias; entristecidos reencontram a alegria; aflitos reencontram a paz; pecadores, a pureza de alma; ansiosos, a serenidade; dependentes, a sobriedade; os apáticos e indiferentes se libertam destas amarras em sadios compromissos com a Boa Nova do Reino.

Neste Coração manso e humilde...



(1) Lecionário Patrístico Dominical – Editora Vozes – 2013 – pp. 267-268.

“Vinde a mim...”: um amoroso convite (XIVDTCA)

“Vinde a mim...”:  um amoroso convite

A Liturgia do 14º Domingo do Tempo Comum nos apresenta a passagem do Evangelho de Mateus (Mt 11,25-30), e somos enriquecidos com a Catequese Batismal de São João Crisóstomo, Bispo e Doutor da Igreja (séc. V).

Vinde a mim todos vós que estais cansados e fatigados sob o peso de vossos fardos e Eu vos darei descanso. Tomai sobre vós o meu jugo e aprendei de mim, porque sou manso e humilde de coração, e vós encontrareis descanso para as vossas almas. Vistes maior superabundância de bondade? Percebes a generosidade do convite? Vinde a mim – diz – todos vós que estais cansados e fatigados. Amoroso o convite! Inefável a bondade!

Vinde a mim todos: não somente os que ordenam, mas também os que obedecem; não somente os livres, mas também os escravos; não somente os homens, mas também as mulheres; não somente os jovens, mas também os anciãos; não somente os de corpo são, mas também os aleijados e entrevados, todos – diz – vinde. Tais são, realmente, os dons do Senhor: não conhece diferença entre escravo e livre, nem entre rico e pobre, mas toda esta desigualdade está rejeitada: Vinde – diz – todos vós que estais cansados e fatigados.

Observa a quem Ele chama: aos que se esgotaram completamente nas iniquidades, aos que estão oprimidos pelos pecados, aos que nem sequer podem mais levantar a cabeça, aos que estão mortos de vergonha, aos que mais estão privados de confiança para falar. E por que os chama? Não para pedir-lhes conta, nem para estabelecer um tribunal. Então, para quê? Para fazer-lhes descansar de seu cansaço, para tirar-lhes a sua carga pesada.

E será que poderia acontecer algo mais pesado do que o pecado? Este, na realidade, por mais que tantas vezes não o sintamos ou queiramos ocultá-lo das pessoas comuns, é aquele que desperta contra nós o juiz incorruptível que é a nossa consciência, e ela, sempre alerta, vai tornando nossa dor contínua, como um carrasco que dilacera e sufoca a mente, mostrando desta forma a enormidade do pecado. Aos que estão, pois, oprimidos pelo pecado – diz –, e como sobrecarregados por uma carga, a estes aliviarei agraciando-lhes com o perdão de seus pecados. Unicamente, vinde a mim! Quem será tão de pedra, quem tão teimoso que não obedeça a um convite tão bondoso?

Em seguida, para ensinar-nos também de que modo alivia, acrescenta: Tomai sobre vós o meu jugo. ‘Entrai, diz, sob o meu jugo. Porém não vos assusteis ao ouvir jugo, porque este jugo nem roça o pescoço nem faz abaixar a cabeça; ao contrário, ensina a pensar nas coisas do alto e forma na verdadeira filosofia.

Tomai sobre vós o meu jugo, e aprendei: ‘Unicamente, entrai sob o jugo e aprendei. Aprendei, ou seja: aplicai o ouvido, para poder aprender de mim’. De fato, não vou exigir de vós nada pesado: vós, meus escravos, imitai a mim, vosso amo; vós que sois terra e pó, imitai a mim, feitor do céu e da terra, vosso Criador: Aprendei de mim, porque sou manso e humilde de coração.

Vês a condescendência do Senhor? Vês sua inconcebível bondade? Não nos exigiu algo pesado ou odioso. Realmente, ele não disse: ‘Aprendei de mim que realizei prodígios, que ressuscitei mortos, que fiz milagres’. Tudo isso era unicamente próprio de seu poder. Então, o quê? Aprendei de mim, porque sou manso e humilde de coração, e vós encontrareis descanso para as vossas almas. Percebes como são grandes os benefícios e a utilidade deste jugo?

Portanto, o que foi considerado digno de entrar sob este jugo e é capaz de aprender do Senhor a ser manso e humilde de coração, obterá para a sua alma todo o alívio. Este é, realmente, o ponto capital de nossa salvação: quem é possuidor desta virtude, mesmo que esteja unido ao corpo, poderá rivalizar com os poderes incorpóreos e já não ter nada em comum com o presente”. (1)

Jesus nos faz um amoroso convite e espera a nossa resposta. Acorramos ao Senhor, sem demora, e n’Ele encontraremos acolhida amorosa.
Refaçamo-nos de nossos cansaços, para continuarmos nosso discipulado: Seu jugo é suave e Seu fardo é leve.

Sobretudo neste tempo tão difícil que estamos vivendo, marcado pelo isolamento social, vigilância, solidariedade para fazermos nossa travessia pelo mar revoltoso do medo e das dificuldades, no mesmo barco e debaixo da mesma tempestade. Mas certíssimos da Sua presença que nos ajuda a vencer todo o medo.

Carreguemos, portanto, com coragem e confiança nossa cruz quotidiana, certos de que não a carregamos sozinhos. E supliquemos humildemente:

“Jesus, manso e humilde de coração, fazei o nosso coração semelhante ao Vosso!”



(1)         Lecionário Patrístico Dominical – Editora Vozes – 2013 – pp. 170-172
PS: Escrito em 04 de julho de 2020

A Lei do Reino de Deus (XIVDTCA)

A Lei do Reino de Deus

“Vinde a mim, todos vós que estais cansados e fatigados
sob o peso dos vossos fardos, e Eu vos darei descanso.”

A Lei do Reino de Deus consiste no amor aos pobres, humildes e pequenos, assim como Jesus o fez. É o que contemplamos na passagem do Evangelho do 14º Domingo do Tempo Comum (ano A) - (Mt 11,25-30).

Oremos:

Ó Senhor, nós cremos que Vos revelastes a todos, mas os sábios, ontem e hoje, tornam, muitas vezes, ineficaz e vã a revelação de Deus, porque não abrem o coração a Vós.

Quando pregastes em nosso meio, os inteligentes e os sábios, os mestres religiosos do templo, os escribas, os fariseus, conhecedores da lei e hábeis manipuladores das tradições, embora possuindo o conhecimento da Lei, tornaram-se opressores e sobrecarregam os ombros dos pobres e dos ignorantes de pesos insuportáveis, que se quer tocaram nem com um dedo! (Lc 11, 46).

Vós, ao contrário, Senhor, chamastes a Si os que estão fatigados e oprimidos, e o jugo que lhes impusestes foi suave e o fardo leve.

Oferecestes, ontem e hoje, Vosso suave jugo, não por ser ele menos exigente, com moralidade permissiva e licenciosa, mas porque Vós, Senhor, com Vossa solidariedade e participação concreta, o tornastes leve.

Vós sois, Senhor, o primeiro dos pobres, dos simples, dos mansos, carregando, na frente, a Cruz sobre Vossos ombros.

Vossa proximidade torna suportável e leve a cruz de todos nós, Vossos discípulos missionários que Vos seguimos, no anúncio e no testemunho.

Cremos e procuramos viver a Lei do Reino de Deus, por vós anunciada e vivida, que consiste na Lei do Amor em favor dos mais pequeninos, dos mais pobres.

Cremos e Vos louvamos, Senhor, que, por Vossa ação entre nós, nos revelastes um Deus que escolhe os humildes, os simples, os ignorantes.

Aprendemos convosco a Lei do grão de mostarda, dos inícios humildes e ocultos, assim como Paulo, Vosso amigo e corajosa testemunha, o fez e proclamou aos irmãos da Comunidade de Corinto:

“Considerai, de fato, o vosso chamado, irmãos: não há entre vós muitos sábios segundo a carne, nem muitos poderosos, nem muitos nobres.

Deus escolheu o que é tolo, no mundo, para confundir os sábios; Deus escolheu o que é fraco, no mundo, para confundir os fortes, Deus escolheu o que é ignóbil e desprezado e o que nada é, para reduzir a nada as coisas que são, a fim de que ninguém possa gloriar-se diante de Deus” (1Cor 1, 26-29).

Dai-nos força, Senhor, para que, a Vosso exemplo, carreguemos o jugo da cruz, com amor e fidelidade, sem jamais esmorecer e, se quedas houver, saibamos que estais conosco neste erguer e continuar do caminho que nos leva à glória, mas que passa, necessariamente, pelo carregar da cruz de cada dia, acompanhado de renúncias de nós mesmos, para maior disponibilidade a Vós; e nos pobres e pequenos, Vos amar e servir. Amém!

Humildade e pequenez diante de Deus (XIVDTCA)

Humildade e pequenez diante de Deus

“Eu Te louvo, ó Pai...”

No 14º Domingo do Tempo Comum (ano A), a Liturgia nos apresenta, como mensagem central, um Deus que Se revela na simplicidade, humildade, pobreza e pequenez, que veio ao encontro da humanidade na pessoa de Jesus Cristo, anunciado pelos Profetas e esperado pelo Povo de Deus.

Paradoxalmente, Deus não Se revela no orgulho e na prepotência, como nos fala a primeira Leitura (Zc 9,9-10), vem como um Rei pobre, com humildade e simplicidade.

A passagem encontra-se no “Deutero-Zacarias”, a segunda parte do Livro, também conhecida como “Segundo Zacarias”, e retrata o período pós-exílio, e anuncia a intervenção e salvação de Deus, a glória futura da Salvação, com forte aceno messiânico: um Messias virá, será Rei, Pastor e o Servo do Senhor.

Um Rei humilde e pacífico virá com força para destruir a guerra e seus instrumentos de morte, e este será o próprio Jesus. 

De fato, Deus sempre Se revela na humildade, pobreza e simplicidade: a fé cristã reconhece em Jesus a personagem profetizada por Zacarias (Mt 21,1-9).

Refletir esta passagem leva o Povo de Deus a perceber que em situações de desencanto, frustração e privação da liberdade, precisa redescobrir o Deus que vem ao seu encontro e restaura a esperança com uma nova lógica (desarmado, pacífico e humilde), em vez da lógica humana (força, guerra, morte, destruição).

Na passagem da segunda Leitura (Rm 8,9.11-13), o Apóstolo Paulo nos fala da vida segundo o Espírito, que consiste na acolhida e vivência das Propostas que Deus nos faz, que nos garante a vida nova e eterna;  de modo que viver na carne significa viver instalado no orgulho, egoísmo e autossuficiência que gera morte. É a antítese explícita que nos acompanha: viver segundo a carne ou segundo o Espírito.

O Apóstolo nos apresenta o Projeto de Salvação de Deus, que nos vem por meio de Jesus e atua pelo Espírito Santo, de modo que os discípulos têm que viver como Jesus e assim alcançarão a Ressurreição. Somente o seguimento de Jesus nos garante a vida plena e definitiva. 

É preciso que o discípulo se abra à ação renovadora e libertadora do Espírito recebida no dia do Batismo, consumindo a sua vida por causas maiores e, sobretudo, pela causa do Reino, vivendo do jeito de Jesus, seguindo com fidelidade Sua Palavra e trilhando Seus passos.

Na passagem do Evangelho (Mt  11,25-30), Jesus louva ao Pai pela Proposta de Salvação que Ele fez à humanidade, mas acolhida apenas pelo pobres e pequenos, que em sua pobreza e simplicidade, sempre disponíveis à novidade libertadora por Deus oferecida.

A Proposta de Jesus encontra acolhida entre os pobres e os marginalizados, os desiludidos com a religião oficial, que os discriminava e os oprimia, como jugo insuportável, porque pesado e desumanizante, pelas leis, entre outras coisas.

“É o que experimentamos em virtude do Batismo que faz de nós homens novos, porque infunde em nós o Espírito que é verdade, vida e força de Deus. É este o ‘jugo suave’ de que fala Jesus (Mt 11,29-30).

O jugo da lei colocado aos ombros dos homens, para submetê-los em vez de libertá-los, não é só aquele de que Jesus acusa os fariseus (os fardos – Mt 23,4), mas é também a proposta cristã quando, em vez de ser mensagem de libertação para quem anda oprimido e humilhado pelo peso do pecado e da morte, se transforma numa quantidade de preceitos e de normas que se devem respeitar perante um Deus juiz severo”. ( 1)

A passagem pode ser divida em três partes:

- O louvor a Deus por ter escondido o conhecimento aos pretensamente sábios e entendidos (vv. 25-26);
- A explicação do que foi escondido e a quem foi revelado (v. 27);
- O convite final: “Vinde a mim...”

Jesus oferece a libertação da escravidão da Lei, propondo a vida nova marcada pelo Mandamento do Amor a Deus e ao próximo. Somente um coração aberto a Deus e às Suas propostas pode garantir a vida em plenitude, assim como nos falou o Apóstolo Paulo – “É para a liberdade que Cristo nos libertou” (Gl 5,1).

Com Jesus temos, portanto, uma reviravolta de valores, em que a força, poder e riqueza cedem lugar para a vida marcada pela simplicidade, doação, humildade, partilha.

É preciso rever nossos julgamentos e comportamentos, ou seja, é preciso que sejamos pobres, simples, humildes, colocando nossa fragilidade nas mãos de Deus, contando com Sua Palavra e força que nos vem do Espírito.

Assim, viveremos na planície do cotidiano o Sermão da Montanha que Jesus proclamou: “Bem-aventurados os pobres em espírito porque deles é o Reino dos céus...” (Mt 5,1-12).

Vivendo assim, estaremos dentro da lógica de Deus que oferece Salvação a todos. Que sejamos pobres em espírito para acolher esta Proposta, renovando concretos compromissos de solidariedade e amor para com os pequeninos, os preferidos de Deus:

“... o verdadeiro conhecimento do Pai, do Deus que é Amor, não pode acontecer senão mediante Jesus, ‘o Caminho’ que nos leva ao Pai”. (2)

Revendo nossas opções, viveremos a opção de Deus pelos pobres, humildes e oprimidos, tornando evidente que a Palavra da salvação é um insistente convite para que percorramos o caminho da humildade verdadeira, do Messias crucificado, ainda hoje “escândalo e loucura” para muitos, como falou o Apóstolo Paulo (1 Cor 1,23).

Oremos:

“Ó Deus, que Vos revelais aos pequeninos e concedeis aos mansos a herança do vosso Reino, tornai-nos pobres, livres e felizes, à imitação de Cristo, Vosso Filho, para levarmos com Ele o suave jugo da Cruz e anunciarmos aos homens a alegria que vem de Vós”. Amém. (3).

(1) (2) Lecionário Comentado – Editora Paulus - p. 660.

(3) Idem p. 661.

“Meu jugo é suave e meu fardo é leve” (XIVDTCA)

                                                      


“Meu jugo é suave e meu fardo é leve”

Reflitamos sobre O Sagrado Coração de Jesus, à luz da passagem do Evangelho de Mateus (Mt 11,25-30).

A fé vivida não permite a acomodação mas deve ser vivida na confiança e na busca de forças tão somente em Deus, nos cansaços possíveis ao enfrentar os desafios da missão evangelizadora.

A Palavra de Jesus alcança as entranhas mais profundas de nossa alma e coração: “Vinde a mim todos vós que estais cansados e fatigados sob o peso dos vossos fardos, e Eu vos darei descanso”.

Somente Jesus pode nos oferecer o verdadeiro “descanso”, porque é “manso e humilde de coração”, e nos oferece os distintivos, que haveremos de carregar e viver, para que o mundo O reconheça e O veja em nós: a Cruz e o Mandamento do amor a Deus e ao próximo.

Não há discipulado e nem seguimento de Jesus sem a Cruz, que é garantia de Vitória, passagem para a glória – “Quem quiser me acompanhar, renegue-se a si mesmo, tome sua cruz e venha” (Mt 16, 24). Oferece o jugo que Ele mesmo carregou e conosco carrega.

Nosso cristianismo somente pode ser vivido, com alegria e plenamente, na certeza de que Ele caminha ao nosso lado – “Quem se arrasta atrás de seu jugo com subterfúgios e compromissos, é derrubado pelo tédio e abatido pela solidão”  (1).

Não podemos nos abater pela solidão, tristeza, desânimo, para que possamos carregar nossa cruz com alegria, confiança, disponibilidade, coragem e firmeza até o fim.

Carreguemos o jugo da cruz, vivendo a Lei do Senhor, a Lei do Amor “... Este é o meu Mandamento: amai-vos uns aos outros como Eu vos amei” (Jo 15,12). 

Somente o amor faz viver. O Mandamento do Amor se constitui na expressão máxima da vida cristã, porque Cristo mesmo nos disse – “... Ninguém teve maior Amor do que Aquele que dá a vida por Seus amigos (Jo 15,13)". 

E disse o Evangelista João: “Deus amou tanto o mundo que nos deu o Seu Filho único para que não morra quem n’Ele crer mas tenha a vida eterna” (Jo 3,16).

O Senhor entregou Sua vida por nós, aceitou a morte, e morte de Cruz, amando-nos, amou-nos até o fim.

A cruz cotidiana assumida, vivendo a Lei do Amor, e a glória da eternidade um dia.

Façamos por Ele e pelo nosso próximo o mesmo: descanso, forças e alegria no tempo presente encontraremos e na eternidade, plenamente viveremos.

(1) Missal Cotidiano - pág. 1035

Profetas do Reino (XIVDTCB)

Profetas do Reino

           “Jesus lhes dizia:
'Um profeta só não é estimado em sua pátria,
entre seus parentes e familiares'” (Mc 6,1)

Com a Liturgia do 14º Domingo do Tempo Comum (ano B), refletimos sobre o chamado que Deus faz para a realização de Seu Projeto de Salvação: Deus chama os pequenos e fracos e, através destes, manifesta a Sua força. Escolhe, acompanha e envia em missão e os assiste em todo o tempo e em todas as situações.

Na passagem da primeira Leitura, refletimos sobre a vocação do Profeta Ezequiel (Ez 2,2-5) que, como toda vocação profética, é uma iniciativa de Deus e uma resposta humana, para ser no meio do Povo a voz de Deus: a missão do Profeta consiste em falar e atuar em nome de Deus.

O Profeta Ezequiel exerce o ministério profético no difícil tempo do exílio na Babilônia, e pode ser chamado “o Profeta da esperança”, denunciando as infidelidades a Javé que levaram o povo ao exílio, e também destruindo as falsas esperanças dos exilados, levando-os a confiar tão apenas em Deus, que não os abandonou e os reconduzirá de volta à sua terra.

O ministério do Profeta Ezequiel nos revela que Deus chama homens e mulheres frágeis e limitados e sua missão consiste em apresentar Sua proposta, ou seja, ser uma voz humana que indique os caminhos de Deus.

Pelo Batismo, também recebemos a missão de sermos profetas, fomos ungidos como profetas à imagem de Cristo. Como profetas, temos que viver com os olhos postos em Deus e os olhos postos no mundo (uma mão na Bíblia e a outra no jornal diário).

Deste modo conseguimos perceber a distância existente entre o sonho de Deus para a humanidade e a realidade vivida.

A vocação profética por vezes comporta perseguição, sofrimento e marginalização, e por isto, é preciso vencer todo medo, comodismo, preguiça que nos impeçam de viver esta missão.

Reflitamos:

- Quem são e onde estão os profetas hoje?
- O que mais nos impede a vivência da vocação profética?
- Temos consciência de que as fragilidades não são obstáculos para a vivência da vocação profética?

Na passagem da segunda Leitura (2 Cor 12,7-10), o Apóstolo Paulo nos comunica a mensagem de que somos instrumentos frágeis, finitos e limitados nas mãos de Deus.

Ele próprio não se vale de seus méritos e se apresenta como homem frágil e vulnerável, a quem Deus chamou e enviou para dar testemunho de Jesus Cristo a todo o mundo.

A finitude e a fragilidade não são determinantes para a missão, porque o que prevalece é a graça divina. Em nossa fraqueza, Deus manifesta a Sua força para vencermos todo desânimo e tentação de desistir.

O cristão autêntico vive em função de Cristo e conta com Ele na Palavra e na Eucaristia.

Reflitamos:

- Qual é o lugar que Jesus ocupa em minhas decisões, projetos, opções e atitudes?
- Quando experimentei a força de Deus em minha fraqueza?

Na passagem do Evangelho (Mc 6,1-6), contemplamos a ação de Deus, que Se revela na fraqueza e na fragilidade, e por isto a dificuldade dos conterrâneos de Jesus reconhecê-Lo como Salvador da humanidade; não conseguem reconhecer a presença de Deus naquilo que Ele diz e faz.

Esta rejeição, no entanto, não invalida Sua procedência divina nem O leva a desistir da missão pelo Pai confiada.

No rosto humano de Jesus, a divindade de Deus se revela, e no rosto divino de Jesus se revela a Sua humanidade: em Jesus o humano e o divino se encontram.

A atitude de Jesus nos convida a nunca desanimar e desistir: Deus tem Seus Projetos e sabe como transformar o fracasso em êxito.

Pelo Batismo, continuamos a missão de Jesus vivendo a vocação como graça e enfrentando as possíveis dificuldades.

A missão do profeta, no seguimento do Senhor, não é a busca do prazer, sucesso, vedetismo, holofotes, mas é algo sério, profundo e que dá sentido à vida.

É Deus que nos chama para a vocação profética apesar de nossas limitações, mas somente uma paixão profunda por Jesus nos fará profetas, aguentando o espinho na carne, enfrentando e superando incompreensões, oposições e acusações.

Reflitamos:

- Qual é a minha vocação na Igreja e no mundo?
- De que modo me abro à graça divina para viver a vocação e enfrentar possíveis dificuldades?
- Para onde Deus me envia?
- Como se manifesta em mim a graça divina?

Voltemo-nos à oração depois da comunhão da Solenidade de Pedro e Paulo, que muito nos fortalece no discipulado e missão para sermos hoje os profetas no mundo como Deus tanto espera.

“Concedei-nos, ó Deus, por esta Eucaristia, viver de tal modo na Vossa Igreja que, perseverando na Fração do Pão e na Doutrina dos Apóstolos, e enraizados no Vosso Amor, sejamos um só coração e uma só alma. Por Cristo, Nosso Senhor. Amém!”

Tão somente enraizados no amor de Deus e nutridos pelo Pão da Imortalidade, iluminados pela Palavra do Senhor, e com a força e luz do Santo Espírito é que poderemos realizar com solicitude e ardor a missão profética recebida no dia de nosso Batismo.

Sem paixão e a Graça Divina não há profecia (XIVDTCB)

Sem paixão e a Graça Divina não há profecia

A Liturgia do 14º domingo (ano B) revela um Deus que nos chama para sermos Suas testemunhas, apesar de nossas limitações, fragilidades, pois é paradoxalmente em nossa fraqueza que Ele manifesta a Sua força.

Com a primeira Leitura (Ez 2, 2-5) refletimos sobre a vocação profética, que consiste numa iniciativa de Deus. Não existe autovocação, ninguém é Profeta por iniciativa própria, pois sua vocação é antes um desígnio divino.

O Profeta é uma pessoa frágil e limitada, mas contando sempre com a força e presença de Deus, torna-se uma voz humana que indica os caminhos de Deus.

Sua vocação é fruto da eleição divina, apesar dos limites humanos naturais.

Ezequiel, o Profeta da esperança, exerceu seu ministério no dificílimo momento da história do Povo de Deus, no meio dos exilados judeus. Sua missão consistiu em destruir as falsas esperanças dos exilados e denunciar a multiplicação de infidelidades do Povo a Javé. 

Portanto, a missão do Profeta é revelar o sonho de Deus, que é infinitamente superior à realidade que se nos apresenta.  Tem os olhos postos em Deus no mundo. Lê a realidade, o “jornal diário” à luz da Palavra Divina. 

É um precioso instrumento nas mãos de Deus para Sua proposta libertadora, e por isto o Profeta Ezequiel tem a árdua missão de alimentar a esperança e a confiança em Deus, irrevogavelmente fiel à Sua Aliança com o Povo.

Poderá sofrer perseguições, sofrimentos, marginalização ou sucumbir no medo, comodismo ou preguiça.

Reflitamos:

-  Quem são e onde estão os Profetas de hoje?
-   Como vivemos a vocação profética recebida no dia de nosso Batismo?

-  O que mais impede a vivência de minha vocação profética?
-  Tenho consciência de que minhas fragilidades não são obstáculos para viver a vocação profética?

O Apóstolo Paulo na passagem da segunda Leitura (2Cor 12,7-10) reforça o fato de sermos instrumentos finitos e limitados nas mãos de Deus.

O texto pertence à terceira parte da Carta em que Paulo, num estilo apaixonado, defende a autenticidade de seu ministério diante de “superapóstolos” que o acusavam de não ser fiel à doutrina dos Apóstolos, entre outras coisas.

Paulo não se vale dos seus méritos, mas se apresenta como homem frágil e vulnerável, para que a força e a graça de Deus nele se manifestassem e mostrassem os Seus caminhos.

Há uma fraqueza que permite a plena manifestação do poder de Deus: é a que é vista e aceita com fé humilde, com disponibilidade confiante, com obediência filial. Então Deus pode fazer coisas grandes”. (1)

É na fraqueza humana que Deus revela a Sua força, e faz-se necessário vencer toda e qualquer forma de desânimo e a tentação de desistir:

“Do mesmo modo, porém, como Cristo Crucificado é ‘poder de Deus e sabedoria de Deus para todos os que creem’, assim a fraqueza do evangelizador não lhe é tirada, mas é vista num mundo diametralmente oposto – 'quando sou fraco, então é que sou forte' (v.10)". (2)

Com Paulo, aprendemos que o cristão autêntico vive em função de Cristo.

Reflitamos:

  -   Qual o lugar que Jesus ocupa em minhas decisões, projetos, opções e atitudes?
  -   Como acolho a graça de Deus em minha vida e missão?

  -   Sou consciente de minhas fraquezas e limitações para que apesar delas, Deus possa manifestar a Sua força, Seu Projeto, Seus desígnios?
  -   Confio na força e atuação de Deus por meio de minha condição finita e frágil?

Com a passagem do Evangelho (Mc 6,1-6), contemplamos através da ação e presença de Jesus, um Deus que Se manifesta na fraqueza e na fragilidade. 

Os conterrâneos de Jesus em Nazaré, não souberam ir ao encontro e acolher Deus na pessoa de Jesus, o Emanuel, Deus conosco, ao contrário, tiveram uma reação totalmente oposta, de rejeição, indiferença.

Podemos nós também acolher ou nos tornarmos indiferentes à proposta de Jesus, como Seus conterrâneos, fechados em nossos esquemas mentais, preconceitos diversos, que impedem o reconhecimento e acolhida d’Ele em nossa vida.

Embora rejeitado pelos Seus a missão de Jesus não é invalidada e tão pouco interrompida. Bem dizia São Francisco pelos caminhos da Itália: “O Amor não é amado”.

“Cristo Crucificado é o emblema do Amor infinito de Deus por nós. Embora vergados sob a Cruz, com coração obstinado, os homens desafiam a Sua onipotência; Ele permanece inerme na Cruz, mostrando um Amor indefectível, mais forte que a morte.

[...] A Cruz de Cristo revela a maldade humana, mas, mais ainda, revela o Amor de Deus. Aos pés da Cruz de Cristo confrontam-se num dramático e perene duelo, ‘a fortaleza débil’ do homem e a ‘fraqueza forte’ de Deus. A fé é que nos revela quem é o vencedor”. (3)

Pode ocorrer na missão dos discípulos o mesmo, importa não deixar se levar pelo desânimo, frustração, dificuldades.

Se grande é a incredulidade humana, bem maior é o Amor de Deus por nós. 

Reflitamos:

  -  A missão do Profeta não é uma missão de descanso e fuga. Assim compreendo a minha missão?
  -  A missão do Profeta não é pelo prazer, mas fidelidade ao Sopro do Espírito, suportando as diversas dificuldades acima mencionadas. Sei suportar estas dificuldades, provações, na vivência de minha vocação profética?

  -   Qual é a minha vocação?
  -   Para que Deus me chama?

  -   Para onde Deus me envia?
  -   Como se manifesta em mim a graça divina?
  -   Quais são as dificuldades a serem superadas?

Colocar-se frente a estas questões permite um olhar mais atento aos grandes personagens da Bíblia, que viveram sua história de amor e sedução por Deus, cada um em seu tempo: Ezequiel, o Apóstolo Paulo, e tantos outros.

Hoje, na fidelidade ao Senhor, é preciso enraizar profundamente em Seu Amor, sem o que a chama profética se apagaria totalmente, e com isto não saberíamos qual o sentido do próprio existir.

Que na Eucaristia celebrada, pela Palavra de Deus iluminados, e pelo Pão da Imortalidade fortalecidos, renovemos e revigoremos a nossa vocação profética. 

Precisa-se de Profetas autênticos, para que o mundo seja mais próximo do que Deus quer para nós. Qual é a nossa resposta?

Oremos:
Que Deus nos conceda a graça de uma fé humilde,
disponibilidade confiante e obediência filial,
para vivermos autenticamente a missão que nos confia, 
não por causa de nossa força e mérito,
até mesmo por falta deles. 
Amém!


(1) (2) (3) - Lecionário Comentado - Editora Paulus - Lisboa -  pág. 663-666.

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