quinta-feira, 14 de novembro de 2024

O Reino de Deus e a conversão necessária

                                                              

O Reino de Deus e a conversão necessária
“O Reino de Deus está entre vós”

No final da passagem proclamada na quinta-feira da 32ª Semana do Tempo comum (Lc 17,20-25), Jesus preanuncia, dirigindo-se aos fariseus,  a Sua Paixão e Morte, tendo como mensagem central - “O Reino de Deus está entre vós”:

Pois, como o relâmpago brilha de um lado até ao outro do céu, assim também será o Filho do Homem, no seu dia. Antes, porém, Ele deve sofrer muito e ser rejeitado por esta geração” (v. 22-25).

Assim lemos no Comentário do Missal Cotidiano:

− “A sociedade de lucro e de consumo quer controlar tudo com o metro da produtividade, do interesse, da utilidade; sonha com uma era de bem-estar completo e tende para ela. Quimera inatingível; basta uma crise energética para por em perigo todos os níveis adquiridos.”(1)

Sobretudo no contexto em que vivemos, caracterizado por uma mudança de época, (também denominada “modernidade líquida”), pede a necessária reflexão e conversão sobre um tema que a todos nos toca diretamente, por ser questão da nossa sobrevivência e do planeta: a sustentatibilidade.

− “O Reino que Jesus veio inaugurar no mundo não pertence a esse gênero; consiste em abater as barreiras do egoísmo, do arrivismo, da exploração, para fazer de todos os homens uma  só família de filhos de Deus.

A Boa Nova do Reino que Jesus anunciou, inaugurou e por Ele morreu: um Reino onde o egoísmo cede lugar à partilha; a competição e busca pelo sucesso em prejuízo do outro cedem lugar à igualdade, simplicidade e ao poder caracterizado por serviço; a exploração cede lugar à edificação e promoção da existência da humanidade, sem os frutos de execráveis explorações econômicas, políticas, sociais e de qualquer outra ordem:

−“É esta a principal missão da Igreja (LG 5). Mas a Igreja opera através de seus filhos; por isso, a conversão deve começar por cada um de nós. Se o nosso coração permanece de pedra, frio, insensível, o Reino de Deus não pode dilatar-se”.(2)

Iluminada e conduzida pelo Espírito, anunciar o Reino e participar de sua construção, eis a missão da Igreja, santa e pecadora.

Colocando-se totalmente a serviço do Reino de Deus, anunciando e testemunhando a Palavra do Verbo que Se encarnou em nosso meio, reestabelecendo com Deus uma Aliança Eterna, uma Aliança indestrutível de amor e felicidade para a humanidade, em extremo amor na vida doada, crucificada, pregada, sacrificada na Cruz, com Sangue Redentor vertido.

Mas para que êxito na missão, como Igreja, tenhamos, há sempre o imperativo da conversão, que não começa no outro, começa dentro de cada um de nós, mas também exige e leva à conversão em níveis maiores, mais amplos: comunitário, social.

A primeira de todas as conversões: a do coração. É sempre necessária a vigilância para que, diante de tantos sinais de morte, descasos, violência, roubos e outros inúmeros fatos, nosso coração não seja petrificado, com triste frieza e indiferença diante do que precisa ser transformado, para que em cada pessoa, resplandeça a luz divina, visibilizando os traços da imagem de Deus na criatura humana desde o Édem por Ele impressos.

O Reino de Deus é a paixão que nos move e conduz; paixão que nos consome e impele em todo instante. O cristão, desde modo, não será alguém que chora a perda do Paraíso, ao contrário, compromete-se em sua redescoberta e realização. Sem saudades que nada edificam, mas com renovada esperança que a todos de amor inflama e contagia.



(1) Missal Cotidiano - Editora Paulus - pág 1489
(2) idem
PS: Inspirado no Evangelho da quinta-feira da 32ª semana do Tempo Comum.
LG -“Lumen Gentium” - Constituição Dogmática sobre a Igreja.

O autêntico encontro com o Senhor


O autêntico encontro com o Senhor

Sejamos enriquecidos por uma Homilia de um autor desconhecido (séc II), na compreensão e edificação da Igreja como o Corpo de Cristo.

Apresento-a precedendo de um pequeno comentário motivador antes de cada parágrafo:

- Que nossas obras correspondam às palavras – fé e obras – coerência de vida num autêntico testemunho da fé é preciso:

“O Senhor declara: Meu nome é incessantemente objeto de blasfêmia entre as nações (cf. Is 52,5), e outra vez: Ai daquele por cuja causa meu nome é blasfemado (cf. Rm 2,24). Qual o motivo de ser blasfemado? Porque não fazemos o que dizemos. Os homens ouvem de nossa boca as palavras de Deus e ficam admirados por seu valor e grandeza; depois, vendo que nossas obras em nada correspondem às palavras que dizemos, começam a blasfemar, e a tachá-las de fábulas e de enganos”.

O amor cristão é autêntico quando também se volta para os inimigos:

“Ouvem-nos afirmar que Deus disse: Não é nada de extraordinário, se amais aqueles que vos amam; mas grande graça, se amais vossos inimigos e aqueles que vos odeiam (cf. Mt 5,46); ouvindo isto, espantam-se com bondade tão sublime: observando, porém, que não amamos os que nos odeiam e nem mesmo aqueles que nos amam, zombam de nós e o nome é blasfemado.”

- Somente cumprindo a vontade de Deus é que fazemos parte de Sua Igreja, do contrário, fragilizamos a Sua missão, promovemos o seu descrédito:

“Por conseguinte, irmãos, cumprindo a vontade de Deus, nosso Pai, faremos parte daquela primeira Igreja espiritual, criada antes do sol e da lua. Se, ao contrário, não fizermos a vontade de Deus, seremos como diz a Escritura: Minha casa tornou-se covil de ladrões (cf.7,11; Mt 21,13). Que nossa referência vá para a Igreja da vida, para sermos salvos.”

- A Igreja é o Corpo de Cristo. Quão enorme é a nossa alegria e responsabilidade:

“Julgo que estais bem cientes de que a Igreja viva é o corpo de Cristo (1Cor 12,27). Pois diz a Escritura: Deus fez o ser humano varão e mulher (Gn 1,27; 5,2); o varão é o Cristo, a mulher a Igreja. Também a Bíblia e os apóstolos afirmam que a Igreja, propriamente, não é deste tempo, mas existe desde o princípio. Era espiritual, assim como nosso Jesus, e apareceu nos últimos dias, a fim de que fôssemos salvos.”

- A imprescindível presença e a ação do Espírito na vida e missão da Igreja, e a responsabilidade que nos é confiada na missão evangelizadora, para que ela seja o espaço privilegiado do encontro pessoal com o Senhor, numa vivência comunitária, bem como num processo permanente de formação para viver com alegria e entusiasmo a dimensão missionária na própria Igreja e no mundo:

“A Igreja, a espiritual, manifestou-se na carne de Cristo, mostrando-nos que se alguém, estando na carne, a preserva e não a arruína, recebê-la-á no Espírito Santo. Pois esta carne é tipo do espírito; quem destrói o tipo não recebe o arquétipo.

Por isto disse, irmãos: Guardai a carne para serdes participantes do espírito. Se dizemos que a carne é a Igreja, e Cristo, espírito, segue-se que quem deturpa a carne, deturpa a Igreja. Este não será participante do espírito, que é Cristo.

Esta carne é capaz de conter imensa vida e incorruptibilidade, com o auxílio do Espírito Santo, e ninguém pode descrever nem contar aquilo que o Senhor preparou para Seus eleitos".

Desde o princípio vemos o esforço da Igreja em criar dentro de seu espaço relações de amor e correção fraterna, para que seja credível. Coerência entre o que se prega e o que se vive, acompanhada pelo testemunho amadurecido, num contínuo processo de conversão.

Bem afirmamos que a Igreja é santa e pecadora, cabendo a cada um de seus membros evitar maculá-la para santificá-la, tornando-se uma agradável oferenda a Deus, por amor à Sua Igreja.

Esta Homilia nos ilumina, sobretudo em tempo de avaliação e planejamento, para que sejamos sal, luz e fermento, participando viva e alegremente na construção do Reino que o Senhor inaugurou.

Renovemos esta alegria, graça e compromisso, com gratidão e gratuidade, pois tudo isto é próprio de quem ama e se encontrou com o Senhor pessoalmente e teve a sua vida para sempre transformada. Somente o autêntico encontro com o Senhor nos transforma.

quarta-feira, 13 de novembro de 2024

Em poucas palavras...

 




Necessárias doçura e mansidão

“A doçura educa para a compreensão, a clemência, a humildade, a plena e contínua comunhão com Deus.

A mansidão é sua mais alta e delicada expressão, porque, esquecendo-se de si mesmo, alguém vive e trabalha para os outros” (1)

 

(1)        Missal Cotidiano – Editora Paulus – Comentário sobre a passagem da Carta de São Paulo a Tito (Tt 3,7) pág. 1483

Mais que pedir, agradecer…

                                                   


Mais que pedir, agradecer…

Naquele dia Jesus curou dez leprosos, e apenas um samaritano voltou para agradecer a Deus. Prostrou-se aos pés de Jesus e agradeceu. A atitude de fé daquele leproso o levou à acolhida da cura, à salvação e à gratidão.

Qual era o nome do leproso?
Um anônimo, um excluído, alguém que era tido como impuro, inimigo dos judeus, fora de toda possibilidade de relacionamento amoroso. Entretanto, Deus ultrapassa as mesquinhas barreiras humanas para manifestar Sua misericórdia.

O amor desconhece fronteiras, classificações. O amor rompe preconceitos, indiferenças, derruba os muros que separam as criaturas entre si e, sobretudo, com seu Criador. O Amor de Jesus recria, refaz, recoloca no espaço da convivência, do relacionamento fraterno, amoroso. Valoriza a pessoa não pelo que ela tem, mas pelo que é em si mesma.

Mais que pedir, agradecer…

O que temos para agradecer?
Somos tão ávidos em pedir, mas às vezes tão lentos em agradecer.

Pedir é orientação de Jesus: “Pedi e recebereis…”, mas também Deus espera de nós uma atitude de abertura, humildade e gratidão. Não que Ele precise de nossos agradecimentos, mas quando nos voltamos para agradecer, passamos a ver quantas maravilhas Ele realiza por nós e em nós.

A atitude de gratidão nos alegra o Espírito e faz bem em todos os sentidos. Os mal-agradecidos são tristes, insatisfeitos, mal situados, mergulham numa existência sem sentido…

Mais que pedir, agradecer...
Agradecer o dom maior que Deus nos deu: O Espírito Santo. Ele que em nós habita e nos faz Seus sacrários vivos, templos, moradas deste mais belo Hóspede que quis habitar no mais profundo de nós.

Agradecer a misericórdia infinita de Deus por nós; o perdão que recebemos embora não o mereçamos. 

Agradecer a graça do Batismo e o pão nosso de cada dia, o dom da vida, as amizades, a família (para além de seus limites).

Agradecer a comunidade (para além de seus desafios, cruzes). 

Agradecer as dificuldades que nos fazem crescer, quando enfrentadas com mansidão, amor e fé  a ausência de alguém que partiu para a eternidade, mas que pela Morte e Ressurreição do Senhor para sempre conosco está (quantas pessoas nos ajudaram a ser o que somos hoje e já estão na glória de Deus...).

Agradecer cada segundo, cada momento de nossa vida; as quedas sofridas e a solidariedade experimentada. 

Agradecer as lágrimas derramadas e os lenços oferecidos.

Agradecer a sede e a fome experimentadas e também a partilha vivida. Agradecer a porta que se fechou, pois, uma nova janela Deus abriu.

Agradecer a montanha que se teve de subir, transpor, para além dela, um novo horizonte vislumbrar – montanhas de dificuldades não podem ter a última palavra diante de Deus, pois com fé podemos removê-las.

Agradecer a Palavra que foi Proclamada, a Eucaristia celebrada, a vida que por Ele foi resgatada, plenificada, iluminada, reconciliada, numa palavra, eternizada!

Mais que pedir, agradecer…

E ao pedir incluamos já o antecipado agradecimento, pois Deus já nos deu o melhor: Ele amou tanto o mundo, que nos deu Seu Filho único, para que todo aquele que n’Ele crer não morra, mas tenha a Vida eterna (Jo 3,16).

PS: Evangelho de São Lucas (Lc 17,11-19)

Vigilância e santidade

                                                         

Vigilância e santidade

Quando chegará o Reino de Deus? Esta pergunta foi dirigida a Jesus pelos fariseus.

E esta foi Sua resposta:

“O Reino de Deus não vem ostensivamente. Nem se poderá dizer: ‘Está aqui’ ou ‘Está ali’, porque o Reino de Deus está entre vós” (Lc 17,20-21).

Aos discípulos, Ele disse:

'Dias virão em que desejareis ver um só dia do Filho do Homem e não podereis ver. As pessoas vos dirão: 'Ele está ali' ou 'Ele está aqui'. Não deveis ir, nem correr atrás. Pois, como o relâmpago brilha de um lado até ao outro do céu, assim também será o Filho do Homem, no Seu dia. Antes, porém, Ele deverá sofrer muito e ser rejeitado por esta geração”. (Lc 17,22-25).

O Comentário do Lecionário muito nos enriquece na reflexão destas Palavras de Jesus, dirigidas também a nós:

“Não podemos pretender conhecer o pensamento de Deus, os Seus desígnios: a vinda do Senhor será como um relâmpago, imprevisível e inesperada. A nós é pedida, desde já, a santidade da vida, a oferenda de uma vida livre em Cristo, a vigilância no louvor a Deus” (1).

Como discípulos missionários do Senhor, que não apenas sofreu e foi rejeitado, mas por nós na Cruz morreu, e Deus O Ressuscitou, temos que trilhar o mesmo caminho, vivendo, cotidianamente, o Mistério de Morte e Ressurreição, com renúncias necessárias e carregando nossa cruz.

Acompanha-nos a alegria e a certeza de que o Ressuscitado caminha conosco e nos enviou o Seu Espírito, quando voltou para o Pai.

Enquanto esperamos Sua vinda gloriosa, comprometidos com a Boa-Nova do Reino por Ele inaugurado, é preciso que façamos progressos contínuos na santidade querida por Deus para todos nós, em permanente vigilância e fazendo de nossa vida uma suave e agradável oferenda, em gestos multiplicados de amor, partilha, perdão, solidariedade...


(1) Lecionário Comentado – Editora Paulus – Lisboa – 2011 – Vol. IV – p. 777

Equilíbrio, justiça e piedade no discipulado

                                                  

Equilíbrio, justiça e piedade no discipulado 

Reflexão à luz da passagem da Carta de São Paulo a Tito (Tt 2,1-8.11-14). 

Nesta, o Apóstolo Paulo nos apresenta a face de um Deus que comunica a Sua graça a todos, oferecendo a Salvação, conduzindo a todos para uma vida feliz e verdadeira, com necessário e coerente testemunho de toda a comunidade. 

O Nascimento de Jesus reorienta o curso da História e o sentido de nossas vidas, de modo que, acolhê-lo como nosso Salvador, d’Ele, tornar-se um discípulo, exigirá que vivamos neste mundo com equilíbrio, justiça e piedade,  renunciando ao mal, abandonando a impiedade e as paixões mundanas, como tão bem nos exorta o Apóstolo Paulo escrevendo a Tito. 

A fim de que testemunho de todos da comunidade seja eficaz para uma verdadeira evangelização, não basta um ensinamento apenas, conforme a sã doutrina, mas a sua concretização prática. 

Todo cristão/ã, como membro de uma comunidade tem uma responsabilidade evangelizadora e que não pode ser transferida a outro. 

Urge que façamos nosso exame de consciência para salutar testemunho da fé, como discípulos missionários do Senhor: 

“... o crente que vive agora na expectativa da ‘ditosa esperança’ (v.13), ou seja, da gloriosa manifestação de Cristo, deve comportar-se em conformidade com a ação sacrificial de Jesus: ser um ‘povo purificado’ e ‘cheio de zelo pelas boas obras’” (1). 

Seja, portanto, a nossa vida orientada por estas palavras, com sua densidade salutar e inesgotável: equilíbrio, justiça e piedade. 

Em todos os momentos, nossos pensamentos e ações sejam iluminados por esta exortação, e tão somente assim, teremos vida plena e feliz. 


(1) Lecionário Comentado - Editora Paulus - Lisboa - Volume II Tempo Comum - 2011 - pág.765-766

Rever caminhos, firmar os passos

                                                       


Rever caminhos, firmar os passos

Finalizando mais um ano Litúrgico, reflitamos sobre a vinda futura do Senhor, Sua segunda vinda gloriosa.

Deste modo, sejamos iluminados pela passagem da Segunda Carta do Apóstolo Paulo aos Tessalonicenses (2 Ts 3,7-12), que nos fala da vida futura e definitiva, a ser esperada sem preguiça e comodismo.

A comunidade não pode cruzar os braços, tão pouco “viver nas nuvens”, assim como não pode perder tempo com futilidades, e nada de útil fazer.

É forte a mensagem dirigida à comunidade: não há lugar para parasitas que vivam à custa dos demais, o que se caracterizaria em consumidores.

Há uma exortação à responsabilização de todos, porque o Reino de Deus começa aqui e agora e a todos compromete; portanto, jamais compreendido como uma evasão do mundo: 

“...Jesus de Nazaré não traz uma plenitude totalmente pronta. Não em uma intervenção mágica que desresponsabiliza o homem. É verdade que chegou a plenitude prometida, mas espera ser completada. É um dom, mas simultaneamente uma conquista”. (1)

À espera do Senhor que vem, façamos, portanto, uma revisão e avaliação do ano vivido, sobretudo de nossos sagrados compromissos com o Reino, e renovemos nossa predisposição e forças para iniciarmos mais um ano, em maior e melhor correspondência aos desígnios divinos, a fim de que não apenas digamos, mas vivamos o que rezamos todos os dias: – Seja feita a vossa vontade assim na terra como no céu.


(1) – Missal Dominical – pp.1295-1296.

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4º Bispo da Diocese de Guanhães - MG