Correção fraterna é obra de amor
Com a Liturgia do 23º Domingo do Tempo Comum (ano A), refletimos sobre a prática do perdão na vida da comunidade, como expressão da misericórdia divina, que nos envolve, renova e nos recria.
Somos eternos aprendizes da misericórdia divina e da prática da correção fraterna. Por isso, é oportuna a reflexão que nos é oferecida pelo Missal Dominical.
A passagem do Evangelho: Mt 18,15-20
“...segue imediatamente a narrativa da Parábola da ovelha desgarrada, da qual se toma uma aplicação concreta. Se um irmão cometeu uma falta, deve fazer-se em primeiro lugar a correção pessoal; se não escuta, é necessário chamar em auxílio algumas testemunhas; em terceira instância, convém referir à comunidade; e se não ouve nem esta, deve-se, só então, considerá-lo como um pagão ou publicano, isto é, como um excomungado”.
Evidencia-se, no contexto do Evangelho, o convite à misericórdia e ao perdão:
“Não se trata tanto de uma ‘excomunhão’, mas da constatação de que, apesar do recurso a todos os meios possíveis para a reconciliação e o diálogo fraterno, não há no irmão a vontade eficaz de comunhão e conversão.
E, no entanto, convém lembrar que a Igreja conserva o direito de pronunciar-se contra os pecadores contumazes, para não prejudicar a comunidade, e com o fim de fazer o pecador entrar em si e converter-se. Assim se pronunciou Paulo a respeito do incestuoso de Corinto (1 Cor 5,5-6).
A práxis penitencial da Igreja primitiva testemunha a grande seriedade e coerência do esforço da conversão. O pecador só encontra o perdão de Deus na redescoberta da Sua misericórdia atuando na Igreja, especialmente na assembleia eucarística que torna atual a redenção de Cristo.
É, sobretudo no Sacramento da Penitência que a Igreja exerce e exprime a misericórdia e o perdão de Cristo; mas para muitos cristãos, infelizmente, o próprio sinal sacramental da reconciliação se tornou vazio e insignificante. O Sacramento é reduzido a gesto mágico, repetido por hábito.
Um dos aspectos que mais preocupam na atual práxis penitencial está na ruptura entre sinal sacramental e experiência da comunidade cristã”.
É preciso retomar e aprofundar o significado comunitário da penitência:
“O que dificulta a aplicação concreta dos temas contidos nas Leituras bíblicas às assembleias eucarísticas dominicais é o fato, já aceito por todos, de que em geral essas assembleias não são verdadeiras comunidades.
Isto é, falta uma verdadeira relação pessoal entre os membros, pela qual cada um se sinta responsável diante dos irmãos. Por isso, ao ensinamento da correção fraterna, do perdão pedido à comunidade e não só a Deus, falta um suporte sociológico importante.
Será preciso que se aproveitem pelo menos os elementos do rito (pedido de perdão recíproco no rito penitencial da Missa e abraço da paz), para fazer captar as riquezas da práxis penitencial da Igreja.
A confissão, além de ser conversão a Deus, é sempre também reconciliação com os irmãos; reintroduz-nos na Igreja; de membros mortos tornamo-nos membros vivos, ativos e responsáveis.
Devemos redescobrir o sentido comunitário do pecado e, portanto, da penitência; ela é o Sacramento em que toda a comunidade cristã reconstitui, sob a ação de Cristo, a unidade rompida.
Uma comunidade de amor, entre os homens, é sempre uma comunidade de reconciliação e de correção fraterna. A comunhão perfeita jamais é uma posse já adquirida; é uma conquista contínua, um dom a implorar do alto”
Na prática da misericórdia, em expressão concreta da correção fraterna, não pode ser olvidado o encorajamento para que se trilhe um novo caminho, possibilitando àquele que foi perdoado a se tornar melhor.
O perdão de Deus vivido autenticamente nos faz melhores, mais conformes aos Seus desígnios de santidade para todos nós:
“Mas o verdadeiro amor, o perdão autêntico, não deixa as pessoas como são, com seus defeitos e suas limitações. Amar um irmão significa ajudá-lo a ‘crescer’ em todos os níveis, querer concretamente sua ‘libertação’ daquilo que é defeituoso e mau, lutar por sua plena humanização.
Por isto, corrigir é obra de amor; nunca é extinguir energias e entusiasmos; é coisa muito diferente da crítica. Juntamente com a correção fraterna, o cristão faz largo uso do encorajamento. As pessoas esperam dos outros algo diferente de um dom material; esperam que os outros se lhes tornem próximos, que entrem em contato com elas, percebam que elas existem, e lhes digam tudo isso.
Nada é tão encorajador como a atenção vigilante, o respeito não puramente formal, a palavra inesperada de congratulação, se não forem fórmulas vazias de rito ou expressões convencionais. O encorajamento, como a correção, é uma das muitas facetas da caridade”
Desde o princípio, as comunidades tiveram que aprender a lidar com o pecado, ou melhor, a vivenciar a prática da misericórdia e do perdão para com o pecador, uma vez que a comunidade é formada por pecadores que somos.
A comunidade daqueles que professam a fé no Senhor, não é a comunidade dos que se pretendem perfeitos, impecáveis, mas daqueles que reconhecem sua condição pecadora, e também do próximo, e, aprendizes do Divino Mestre da Misericórdia, permanecem em contínuo aprendizado da correção fraterna, vivendo o perdão como uma obra de amor.
Amados e perdoados por Deus para amar e perdoar, como nos disse o Senhor na bela Oração do Pai Nosso.
PS: Missal Dominical – Editora Paulus - pág. 793-794
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