Jesus, um sinal de contradição
Ao celebrarmos a
Festa da Sagrada Família, sejamos enriquecidos pelo comentário ao Evangelho de
Lucas, escrito por São Cirilo de Alexandria (séc. V):
“E o que disse de
Cristo o profeta Simeão? Este
menino vai ser causa tanto de queda como de reerguimento para muitos em Israel.
Ele será um sinal de contradição, visto que o Emanuel é posto para os alicerces
de Sião por Deus Pai, sendo
uma pedra escolhida, angular e preciosa.
Aqueles, então,
que confiaram n’Ele não se envergonharam; mas aqueles que eram descrentes e
ignorantes, e incapazes de compreender o mistério a respeito d’Ele, caíram, e
foram feitos em pedaços.
Por Deus Pai
novamente foi dito em outro lugar: Eis
que ponho em Sião uma pedra de tropeço e uma rocha de escândalo, e aquele que
crê nela não será confundido; mas aquele sobre quem ela cair, ele será
esmagado.
Mas o profeta
tranquilizou aos israelitas dizendo:
Só ao Senhor chameis de Santo, é a Ele que é preciso respeitar, a Ele que se
deve temer. Ele será a pedra de escândalo e a pedra de tropeço.
No entanto,
porque Israel não santificou o Emanuel, que é Senhor e Deus, nem estava
disposto a confiar n’Ele, tropeçaram em uma pedra por causa da descrença, e ele
foi feito em pedaços e caiu. Porém, muitos se reergueram, isto é, aqueles que
abraçaram a fé n’Ele.
Por isso mudaram
do legalismo para um ofício espiritual; tendo neles um espírito de serviço,
foram enriquecidos com aquele Espírito que os torna livres, e que é o Espírito
Santo; eles foram feitos participantes
da natureza divina, considerados dignos da adoção filial,
e de viver na esperança de alcançar a cidade que é do Alto, até mesmo a
cidadania, ou seja, o Reino dos Céus.
E pelo sinal de
contradição, Ele significa a preciosa Cruz, em nome da qual o sapientíssimo
Paulo escreve: para
os judeus é escândalo, e loucura para os pagãos. E novamente: Para os que estão
perecendo é loucura; porém, para nós que somos salvos, é o poder de Deus para a
salvação.
O sinal,
portanto, de contradição, se para aqueles que perecem lhes parece ser loucura,
todavia, para aqueles que reconhecem o seu poder, ele é salvação e vida.
E Simeão ainda
disse à Santa Virgem: Sim,
uma espada transpassará a tua alma, significando
pela espada a dor que ela sofreria por Cristo, visto que ela trouxe à luz o
crucificado; e sem saber que Ele seria mais forte do que a morte, e ressurgiria
da sepultura. Ou tu podias imaginar que a Virgem não sabia disso, quando vamos
encontrar até mesmo os Santos Apóstolos, então, com pouca fé; pois em verdade o
bem-aventurado Tomé, se não introduzisse suas mãos no seu lado após a
ressurreição, e sentisse também as marcas dos pregos, iria desacreditar os
outros discípulos que lhe diziam que Cristo ressuscitou e tinha-se manifestado
a eles.
O evangelista com
sabedoria, portanto, para o nosso benefício nos ensina tudo quanto o Filho,
feito carne, consentiu padecer por nossa pobreza, suportar em nosso benefício e
em nosso favor, para que possamos glorificá-Lo como nosso Redentor e Senhor,
nosso Salvador e nosso Deus: por quem e com quem a Deus Pai e pelo Espírito
Santo sejam a glória e o poder pelos séculos dos séculos. Amém.” (1)
Este comentário
nos ajuda no aprofundamento do quarto Mistério gozoso: a apresentação do Menino
Jesus no Templo (cf. Lc 2,22-40).
Jesus é
apresentado no Templo, e a Maria, Simeão anunciou que uma espada lhe
transpassaria a alma (cf. Lc 2,33-35), porque Aquele Menino seria sinal de
contradição para o mundo.
O ancião Simeão
reconheceu aquela Criança como o Salvador do mundo, e nisto consistiu seu
anúncio sobre a espada de dor de Nossa Senhora, numa plena e incondicional
obediência à vontade de Deus.
Ela viveu cada
momento da vida de Jesus, até o fim, no momento ápice aos pés da Cruz, quando Ele
deu a vida por amor de todos nós, e recebeu o Corpo sem vida de Seu Filho.
Mas a fé em Deus,
a fez presente junto aos apóstolos mais tarde, ao celebrar com os apóstolos o
Mistério da Eucaristia (At 1,12-14).
Oportuna as palavras do Papa São João Paulo II na Encíclica “Ecclesia de Eucharistia”: Impossível imaginar os sentimentos de Maria, ao ouvir dos lábios de Pedro, João, Tiago e restantes apóstolos as palavras da Última Ceia: « Isto é o meu corpo que vai ser entregue por vós » (Lc 22, 19). Aquele corpo, entregue em sacrifício e presente agora nas espécies sacramentais, era o mesmo corpo concebido no seu ventre!”
Supliquemos a Deus que tenhamos coragem como Maria, na obediência e fidelidade à vontade divina, como discípulos missionários do Senhor, sinal de contradição para o mundo, no carregar de nossa cruz quotidiana. Amém.
(1)Lecionário Patrístico Dominical -
Editora Vozes - 2013 - p.294
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