quarta-feira, 1 de janeiro de 2025

A verdadeira paz

                                                           

A verdadeira paz

Não quero a paz como a mera ausência de guerra;
Nem tão apenas equilíbrio das forças adversárias;
Tampouco que tenha origem em um domínio tirânico.

Quero a paz que nasça da justiça (Is 32,17),
Como saboroso fruto da ordem.

Quero a paz inserida na sociedade humana por Seu divino fundador e a ser realizada de modo sempre mais perfeito pelos homens e mulheres que têm fome e sede de justiça.

Quero a paz que tenha como fundamento o bem comum do gênero humano,
Embora as contingências concretas possam estar em constantes mudanças ao longo dos tempos.

Quero a paz em permanente conquista, que deve ser continuamente construída, porque sendo a vontade humana volúvel e marcada pelo pecado, 
a busca da paz exige de cada um o constante domínio das paixões e a atenta vigilância da autoridade legítima.

Quero a paz em que seja salvaguardado o bem das pessoas, e que todos comuniquemos, com confiança e espontaneidade, as riquezas do coração e da inteligência.

Quero a paz em que se respeite a dignidade dos outros, dos povos, dos diferentes, numa ativa fraternidade.

Quero a paz como mavioso fruto do amor, que vai além do que a justiça é capaz de proporcionar, pois a paz terrena, oriunda do amor ao próximo, é figura e resultado da paz de Cristo, provinda de Deus Pai.

Quero a paz promovida por todos que, num mesmo espírito, renunciam à ação violenta para reivindicar os direitos inalienáveis, recorrendo aos meios de sua defesa, de modo especial dos que sejam mais fracos e vulneráveis, sem lesar os direitos e deveres de outros ou da própria comunidade.

Quero a Paz do Senhor, o Príncipe da Paz, Jesus Cristo, 
Que Ele nos trouxe ao Se encarnar, e na Cruz morrendo, a reconciliação da humanidade com Deus alcançando, recompondo a unidade de todos em um só povo e um só corpo.

Quero a Paz que nasceu naquela Madrugada da Ressurreição, a Paz que Ele comunicou desde então aos Seus, acompanhada do Sopro do Espírito, para a missão no mundo continuar; a caridade, mais que anunciar, viver, testemunhar.

Quero a Paz que brota quando, em Sua Carne, o ódio foi definitivamente destruído, e rompidos os muros da inimizade (cf. Ef 2,16; Cl 1,20.22);

A verdadeira Paz que, como cristãos, somos insistentemente chamados a promover, vivendo a verdade na caridade (cf. Ef 4,15), unindo-nos às pessoas verdadeiramente pacíficas. Amém.


PS: Livre adaptação da Constituição Pastoral Gaudium et spes sobre a Igreja no mundo de hoje, do Concílio Vaticano II-(N. 78) (Séc. XX)

A paz é fruto da justiça!


 A paz é fruto da justiça!

Em 2009, a Campanha da Fraternidade nos desafiou com um tema de extrema urgência: construir a paz, em irrenunciável compromisso com ela.

Passos foram dados, mas ainda temos um longo caminho a percorrer. Enquanto peregrinarmos neste mundo a paz será sempre a nossa grande busca, proponho ao leitor retomarmos as reflexões que escrevi na ocasião, reeditadas para facilitar a leitura.

Inicialmente, é importante termos claro qual é paz que a Igreja acredita e anuncia.

A Paz positiva, orientada por valores humanos como a solidariedade, a fraternidade, o respeito ao outro, a mediação pacífica dos conflitos, a promoção da dignidade humana e construção de uma sociedade justa e fraterna. Enfim, a paz fruto da justiça.

Precisamos dizer não à paz negativa, que se dá pelo uso da força das armas, da intolerância com os diferentes, e que tem como foco e meta os bens materiais, a busca inescrupulosa do poder.

Todos somos responsáveis pela paz. O exercício da cidadania é inadiável, e devemos colaborar no cultivo da cultura da paz e da vida, não apenas nas paredes de nossa Igreja, mas envolvendo todas as pessoas, todos os segmentos da sociedade, em todas as esferas de poder.

Lembro as oportunas e atualíssimas palavras do Secretário Geral da CNBB, D. Dimas L. Barbosa, naquele ano: “O caminho para a superação da insegurança passa, assim, pelo cultivo da cultura da paz, que supera a visão de guerra, seguindo a qual a violência se vence com violência.

A cultura da paz exige novos critérios para o relacionamento humano: a vivência da não violência ativa, a superação da vingança, a gratuidade, o perdão e a misericórdia. A prioridade tem que ser o valor da pessoa humana e sua dignidade”

A Oração do Salmista há de se tornar uma realidade: “O Amor e a Verdade se encontram, Justiça e Paz se abraçam, da terra germinará a Verdade, e a Justiça se inclinará do céu. O próprio Iahweh dará a felicidade e nossa terra dará seu fruto. A Justiça caminhará a sua frente, e com seus passos traçará um caminho” (Sl 85,11-14).

“A paz segundo São Leão Magno”

“A paz segundo São Leão Magno”

Iniciamos mais um ano, e é sempre oportuno retomar parte do Sermão deste grande Papa da Igreja , São Leão Magno (séc. V):

“Ora, no tesouro das liberalidades de Deus, que podemos encontrar de mais próprio para celebrar esta festa do que a paz, que o canto dos anjos anunciou em primeiro lugar no nascimento do Senhor?

É a paz que gera os filhos de Deus e alimenta o amor; ela é a mãe da unidade, o repouso dos bem aventurados e a morada da eternidade; sua função própria e seu benefício especial é unir a Deus os que ela separa do mundo...

O Natal do Senhor é o Natal da Paz. Como diz o Apóstolo, Cristo é a nossa paz, Ele que de dois povos fez um só (cf. Ef 2,14); judeus ou gentios, em um só Espírito, temos acesso junto ao Pai (Ef 2,18)”.

Com Jesus, nossa Paz, cerramos as cortinas de mais um ano e, 
ao mesmo tempo, abrimos as mesmas para Novo Ano.

Com Ele, nossa Paz, nossas forças sejam revigoradas;
Nossos sonhos se tornem mais próximos da realidade.
Com Ele, nossa vida de luz seja em maior intensidade.
Com Ele, nosso vigor, alegria, esperança renovadas!

Com Ela, Maria, terminamos longos dias de um ano,
Com a certeza de que por Ela desamparados jamais!
Com Ela, redescobrir o dulcíssimo gosto da paz!
Com Ela, aprender a fortalecer laços fraternos e humanos!

Feliz Ano Novo que no Natal do Senhor se anunciou!
Feliz Ano Novo, que não sejam palavras repetidas e frias,
Que expressem compromissos, sem coração e mãos vazias.
Somente transbordará no coração daquele que crê e testemunhou!

Graça e Paz da parte de Cristo Nosso Senhor!
Feliz Ano Novo acompanhado de bênçãos e alegria no Senhor.

“Bendita sois vós entre as mulheres...”


“Bendita sois vós entre as mulheres...”

No Dia Internacional da mulher, e sempre, volto meu olhar e pensamento àquela que tenho como a mulher de todas as mulheres que o mundo conheceu: Maria, a Mãe de Jesus, pois, como afirmou Santo Amadeu:

“Maria está assentada no mais alto cume das virtudes,
repleta do oceano dos carismas divinos,
do abismo das graças, ultrapassando a todos,
derramava largas torrentes ao povo fiel e sedento...

Maria, como toda mulher, e mais que todas, nutriu sua fé em Deus, desde criança, tornou-se fecunda de esperança, porque o coração invadido pelo amor divino.

Maria cresceu com os pés no chão e com o olhar sempre voltado para Deus, sua alma ininterruptamente glorificava a Deus, não somente com palavras, mas com toda a sua vida.

Nela, o Espírito pode fazer maravilhas, fecundando-a para gerar o Autor da Vida.

Contemplo tantas “Marias” que voltam sempre seu olhar para Maria, a mulher virtuosa, carismática e cheia de graça, porque sabem que se não aprenderem com ela suas belas lições de amor e fidelidade, tornam-se pobre de tudo, em todos os sentidos.

De fato, todos nós, mulheres e homens, precisamos com Maria belas lições e gestos aprender, do contrário, teremos tudo a perder.

A Ela, que soube viver alegrias e dores, na fidelidade a Deus, irradiando por sua singela existência a luminosidade divina, e hoje está junto do Filho, coroada nos céus, como Mãe e Rainha nossa, elevamos orações por todas as mulheres do mundo, que fazem parte de nossa história, e que fazem renascer o sonho e a esperança de um mundo novo, como ela tão bem expressou no seu Canto do Magnificat:

“Minha alma glorifica o Senhor, exulta meu espírito em meu Deus meu Salvador, porque Ele olhou para a humildade de sua Serva...” (Lc 1, 46-56).


PS: Postado com vistas ao Dia 8 de março - Dia Internacional da Mulher

Política: a prática sublime da caridade (1)


Política: a prática sublime da caridade

Apesar das dificuldades e decepções, não podemos recuar, nem nos omitir dos sagrados compromissos com a atividade política, que deve ser a prática sublime da caridade, como nos ensina a Doutrina da Igreja, e como tão bem expressou o Papa São Paulo VI, na “Octogesima Adveniens”, em 1971: “A política é uma maneira exigente - se bem que não seja a única - de viver o compromisso cristão, ao serviço dos outros.” (n.46).

E ainda, retomando a preciosa citação da poetisa Gabriela Mistral: “Dai-me, Senhor, a perseverança das ondas do mar que fazem de cada recuo um ponto de  partida para um novo avanço”, façamos desta situação adversa que vivemos um momento favorável.

Se os fatos revelam um notável recuo, é a partir do recolhimento, reflexão, formação e diálogo, que juntos reencontraremos o caminho da construção e solidificação da democracia, com a preservação da liberdade de participação política de todos; transparência necessária na administração do bem público; fortalecimento dos espaços de participação e decisão dos rumos de nossa nação em todos os níveis (municipal, estadual, nacional). 

Portanto, que o “recuo das ondas” não seja sinônimo de apatia, indiferença, omissão diante da vocação política que todos possuímos.

Não nos foi dado um espírito de timidez e desânimo, e sim o Espírito do Senhor que nos orienta e conduz, para que avancemos no inadiável compromisso com o anúncio e testemunho da Boa-Nova de Jesus Cristo, participando alegres e corajosamente da construção de um mundo novo, justo e fraterno, com vida plena e feliz para todos.

Política: a prática sublime da caridade (2)



Política: a prática sublime da caridade

 “A Sagrada Escritura é para nos ajudar a decifrar o mundo; para
nos devolver o olhar da fé e da contemplação, e transformar
a realidade numa grande revelação de Deus”.

Apesar das dificuldades e decepções, não podemos recuar, nem nos omitir dos sagrados compromissos com a atividade política, que deve ser a prática sublime da caridade, como nos ensina a Doutrina da Igreja, e como tão bem expressou o Papa São Paulo VI, na “Octogesima Adveniens” (parágrafo n.46), em 1971 ao celebrar o octagésimo aniversário da Rerum Novarum, que nos fala sobre um tema que está na pauta do dia: a política como promoção do bem comum:

- O poder político a serviço do bem de todos e além das fronteiras nacionais:
“Atendo-se, pois, à sua vocação própria, o poder político deve saber desvincular-se de interesses particulares, para poder encarar a sua responsabilidade pelo que se refere ao bem de todos os homens, passando mesmo para além das fronteiras nacionais”.

- A política tomada a sério, em seus diversos níveis, na promoção do bem comum:
“Tomar a sério a política, nos seus diversos níveis, local, regional, nacional e mundial, é afirmar o dever do homem, de todos os homens de reconhecerem a realidade concreta e o valor da liberdade de escolha que lhes é proporcionada, para procurarem realizar juntos o bem da cidade, da nação e da humanidade”.

- Uma definição do que vem a ser a política:
“A política é uma maneira exigente - se bem que não seja a única - de viver o compromisso cristão, ao serviço dos outros. Sem resolver todos os problemas, naturalmente, a mesma política esforça-se por fornecer soluções, para as relações dos homens entre si”.

- O campo de atuação e domínio da política:
“O seu domínio é vasto e abrange muitas coisas, não é porém, exclusivo; e uma atitude exorbitante que pretendesse fazer da política algo de absoluto, tornar-se-ia um perigo grave”.

- A autonomia da realidade política e o compromisso dos cristãos em coerência ao Evangelho:
“Reconhecendo muito embora a autonomia da realidade política, esforçar-se-ão os cristãos, solicitados a entrarem na ação política, por encontrar uma coerência entre as suas opções e o Evangelho e, dentro de um legítimo pluralismo, por dar um testemunho, pessoal e coletivo, da seriedade da sua fé, mediante um serviço eficaz e desinteressado para com os homens”.

Ontem, hoje e sempre, ecoam as palavras do Papa Paulo VI, em 1975, que nos levam a refletir sobre a missão do cristão leigo e leiga e de todo batizado no mundo:

“Os leigos, a quem a sua vocação específica coloca no meio do mundo e à frente de tarefas as mais variadas na ordem temporal, devem também eles, através disso mesmo, atuar uma singular forma de evangelização...

O campo próprio da sua atividade evangelizadora é o mesmo mundo vasto e complicado da política, da realidade social e da economia, como também o da cultura, das ciências e das artes, da vida internacional, dos "mass media" e, ainda, outras realidades abertas para a evangelização, como sejam o amor, a família, a educação das crianças e dos adolescentes, o trabalho profissional e o sofrimento.”. (Evangelli Nuntiandi, n.º 70)

Também são oportunas as palavras dos Bispos na Conferência Nacional (CNBB), quando disseram nas Diretrizes Gerais da Ação Evangelizadora no Brasil (2015-2019): 

Promova-se cada vez mais a participação social e política dos cristãos leigos e leigas nos diversos níveis e instituições, por meio de formação permanente e ações concretas.

Com a crise da democracia representativa, cresce a importância da colaboração da Igreja no fortalecimento da sociedade civil, na luta contra a corrupção, bem como no serviço em prol da unidade e fraternidade dos povos, em especial na América Latina.” (n.123).

Urge que, no testemunho da fé, como discípulos missionários do Senhor, vivamos a atuação e compromisso político, como concretização e promoção do bem comum, para que sejamos sal, fermento e luz.

Embora a nossa participação política não se esgote no período eleitoral, este é um momento privilegiado, frente à possíveis descasos do poder público, precariedade de serviços necessários à população, desvios ou não aplicação verbas para o que é de fato essencial, e outros tantos fatos que clamam por mudanças efetivas.

Como Igreja, iluminados pela Doutrina Social da Igreja, não nos é permitido omissão nestes sagrados compromissos de participação da construção do Reino de Deus inaugurado por Jesus, com a força do Espírito Santo.

Porém, se dificuldades existem, a Palavra de Jesus, ontem, hoje e sempre, nos renova para os sagrados compromissos: “Não temais, pequeno rebanho, porque foi do agrado de vosso Pai dar-vos o Reino” (Lc 12,32).

E para que superemos os nossos medos, na desafiadora e necessária participação política, Ele afirma ainda: “Coragem, Eu venci o mundo” (Jo 16,33).

Seja a Palavra de Deus luz em nossas reflexões, compreensão da realidade e, sobretudo, uma Palavra decisiva em nossa vivência da fé, na prática da verdadeira política que, como vimos, é a sublime prática da caridade.

Esteja a Palavra de Deus em nossas mãos e mente, pois como afirmou Santo Agostinho - A Sagrada Escritura é para nos ajudar a decifrar o mundo; para nos devolver o olhar da fé e da contemplação, e transformar  a realidade numa grande revelação de Deus”.

E ainda, retomando a preciosa citação da poetisa Gabriela Mistral: “Dai-me, Senhor, a perseverança das ondas do mar que fazem de cada recuo um ponto de partida para um novo avanço”, façamos desta situação adversa que vivemos um momento favorável.

Se os fatos revelam um notável recuo, é a partir do recolhimento, reflexão, formação e diálogo, que juntos reencontraremos o caminho da construção e solidificação da democracia, com a preservação da liberdade de participação política de todos; transparência necessária na administração do bem público; fortalecimento dos espaços de participação e decisão dos rumos de nossa nação em todos os níveis (municipal, estadual, nacional). Portanto, que o “recuo das ondas” não seja sinônimo de apatia, indiferença, omissão diante da vocação política que todos possuímos.

Não nos foi dado um espírito de timidez e desânimo, como falou o Apóstolo Paulo – “Pois Deus não nos deu espírito de timidez, mas de poder, de amor e de equilíbrio” (2 Tm 1,7), pois é o Espírito Santo que nos orienta e conduz, para que avancemos no inadiável compromisso com o anúncio e testemunho da Boa-Nova de Jesus Cristo, participando alegres e corajosamente da construção de um mundo novo, justo e fraterno, com vida plena e feliz para todos.

Enfim, encorajados pela Palavra do Senhor, luz para nosso caminho, assim como o Povo de Deus viveu e celebrou a noite da libertação da escravidão do Egito e a celebrou com cantos e júbilo, também nós, partícipes da Nova e Eterna Aliança, revigorados pelo Banquete de Eternidade, nos empenhemos concretamente nesta noite de libertação, que se repete ao longo da história, quando não nos omitimos e nos comprometemos no escrever de novas linhas da história com vida plena, digna, abundante e feliz para todos, como Igreja, participando com todo o empenho na construção do Reino de Deus.

Em poucas palavras...

 


Maria, imagem puríssima da esperança

“Pelos profetas, Deus forma o seu povo na esperança da salvação, na expectativa duma aliança nova e eterna, destinada a todos os homens (Is 2,2-4), e que será gravada nos corações (Jr31,31-34; Hb 10,16). Os profetas anunciam uma redenção radical do povo de Deus, a purificação de todas as suas infidelidades (Ez 36), uma salvação que abrangerá todas as nações (Is 49,5-6; 53,11).

Serão sobretudo os pobres e os humildes do Senhor (Sf 2,3) os portadores desta esperança. As mulheres santas como Sara, Rebeca, Raquel, Míriam, Débora, Ana, Judite e Ester conservaram viva a esperança da salvação de Israel. Maria é a imagem puríssima desta esperança (Lc 1,38).” (1)

 

(1) Catecismo da Igreja Católica – parágrafo n. 64

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