“Aquele denário é a vida eterna”
Sejamos
enriquecidos pelo Sermão de Santo Agostinho, bispo e doutor da Igreja (séc. V),
sobre a passagem do Evangelho de Mateus (Mt 20,1-16a).
“Acabais
de escutar a parábola evangélica dos trabalhadores da vinha, que encaixa
perfeitamente com a presente estação. Pois agora nos encontramos na época da
vindima material. E digo ‘material’, porque existe uma vindima “espiritual”, na
qual Deus Se alegra com os frutos de Sua vinha. O Reino dos Céus se assemelha a um proprietário que saiu para contratar
trabalhadores para a sua vinha.
E
o que significa esse gesto de pagar a diária começando pelos últimos? Não lemos
em outra passagem do Evangelho que todos receberão simultaneamente a
recompensa? De fato, lemos em outro texto do Evangelho que o rei dirá àqueles
que estiverem à Sua direita: Vinde,
benditos de meu Pai; herdai o Reino que está preparado para vós desde a criação
do mundo. Portanto, se todos receberão o denário ao mesmo tempo, como
entender o que aqui se diz sobre que primeiro receberão a diária os contratados
ao entardecer, e, por último, os do amanhecer? Se consigo explicar-me de modo
que consigais entendê-lo, louvado seja Deus. Pois a Ele deveis agradecer pelo
que vos concede pela minha mão: porque o que vos dou não o dou de minha
colheita.
Se
perguntas, por exemplo, quem dos dois trabalhadores recebeu o pagamento
primeiro: o que recebeu depois de uma hora de trabalho ou aquele que o recebeu
depois de uma jornada laboral de doze horas, todos responderão que quem o
recebeu ao final de somente uma hora o recebeu antes daquele que o recebeu
depois de doze horas. Assim, ainda que todos cobrassem ao mesmo tempo, contudo,
como alguns receberam a diária ao final de uma hora e os outros depois de doze
horas, diz-se que aqueles a receberam primeiro, posto que a receberam em breve
espaço de tempo.
Os
primeiros justos como Abel, Noé, que são os chamados na primeira hora,
receberão ao mesmo tempo que nós a felicidade da ressurreição. Posteriormente,
outros justos depois deles, tais como Abraão, Isaac, Jacó e seus
contemporâneos, chamados ao meio da manhã, receberão ao mesmo tempo que nós a
felicidade da ressurreição. Outros justos: Moisés, Aarão e aqueles que com eles
foram chamados ao meio-dia, receberão ao mesmo tempo que nós a felicidade da
ressurreição. Depois deles, os santos profetas, chamados como ao cair da tarde,
receberão ao mesmo tempo que nós a felicidade da ressurreição. Ao final do
mundo, todos os cristãos, como os chamados à hora undécima, receberão
juntamente com eles a felicidade da ressurreição. Todos a receberão ao mesmo
tempo, porém observai após quanto tempo os primeiros a receberão. Portanto, se
os primeiros chamados recebem a felicidade depois de tanto tempo, ao passo que
nós a recebemos depois de um breve intervalo, mesmo que todos a recebamos
simultaneamente, parece como se nós a recebêssemos primeiro, porque nossa
recompensa não se fará esperar.
No
que se refere à retribuição, todos seremos iguais: os últimos como os
primeiros, e os primeiros como os últimos, pois aquele denário é a vida eterna,
e na vida eterna todos serão iguais. E apesar de que, conforme a diversidade de
méritos, brilharão de forma diversa, no que se refere à vida eterna, ela será
igual para todos. Não será mais longo para um e mais curto para outros o que em
ambos os casos será sempiterno: o que não tem fim, não terá nem para ti nem
para mim. Ali brilharão de forma diferente a castidade conjugal e a integridade
virginal; um será o fruto das boas obras e a outra a coroa do martírio; porém,
no que se refere a viver eternamente, nem este viverá mais que aquele, nem
aquele mais do que este. Todos viverão uma vida sem fim, embora cada um com seu
brilho e auréola peculiar. E aquele denário é a vida eterna.” (1)
É
desejo de Deus que todos alcancemos a vida eterna, e é neste sentido que
devemos compreender a parábola da passagem mencionada.
Não
importa a hora que fomos chamados (prima, tercia, sexta, nona ou undécima), a
bondade e compaixão divinas são para todos, por isto o pagamento de um denário:
a vida eterna, e esta é para todos.
Expressemos nossa gratidão a Deus pela graça de termos sido
chamados, não importa a hora. É sempre tempo de responder ao chamado de Deus e de
nos colocarmos a caminho no seguimento de Jesus, como Discípulos missionários,
com a presença e ação do Espírito Santo.
(1)
Lecionário Patrístico Dominical – Editora Vozes – 2013 – pp.219-220
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