sábado, 10 de fevereiro de 2024

Quanto mais próximos de Deus, mais fraternos

Quanto mais próximos de Deus, mais fraternos

Vejamos o que nos diz Doroteu de Gaza (séc. VI), sobre a verdadeira e fecunda caridade.

“Adquiramos nós também a caridade. Adquiramos a misericórdia para com o próximo a fim de evitar a terrível maledicência, o julgar e desprezar.

Ajudemo-nos uns aos outros como aos nossos próprios membros. Se alguém tem uma ferida na mão, no pé ou em outra parte do corpo, sente acaso nojo de si mesmo? Corta-se o membro enfermo, ainda que esteja apodrecendo? Pelo contrário, não o lavaria, limparia, lhe colocaria emplastos e faixas, o untaria com óleo santo, rogaria e fará os santos rogar por ele, como diz o Abade Zózimo?

Em resumo, não abandona o seu membro, seu mau odor não lhe causa nojo, faz tudo para curá-lo. Assim devemos compadecer-nos uns dos outros, ajudar-nos mutuamente, ou servindo-se de outros mais capazes, fazer tudo com o pensamento e com as obras para socorrer-nos a nós mesmos e uns aos outros. Porque afirma o Apóstolo, somos membros uns dos outros. Portanto, se formamos um só corpo e somos cada um por nossa parte membros uns dos outros, quando ‘um membro sofre, todos os membros sofrem com ele’.

A seu entender, o que são os monastérios? Não são como um só corpo com seus membros? Os que governam são a cabeça, os que cuidam e corrigem são os olhos, os que servem pela palavra são a boca, as orelhas são aqueles que obedecem, as mãos os que trabalham, os pés os que cumprem a incumbência e garantem os serviços.

És cabeça? Governa. És os olhos? Sê atento e observa. És a boca? Fala para proveito. És a orelha? Obedece. A mão? Trabalha. O pé? Cumpre teu serviço.

Que cada um, como possa, trabalhe pelo corpo. Sejam sempre solícitos em ajudarem-se uns aos outros, seja instruindo e semeando a Palavra de Deus no coração do irmão, seja consolando-o em momento de prova ou prestando-lhe assistência e ajudando-o em seu trabalho. Em uma palavra: cuide cada um, como possa, segundo o que lhes foi dito, de que permaneçam unidos uns aos outros, visto que quanto mais unido se está ao próximo, mais unido se está a Deus.

Para que compreendam o sentido desta orientação, vou dar-lhes uma imagem tirada dos Padres: Imaginem um círculo traçado sobre a terra, ou seja, uma circunferência feita com um compasso e um centro.

Chama-se precisamente centro ao centro do círculo. Prestem atenção ao que lhes digo: Imaginem que este círculo é o mundo, o centro é Deus, e seus raios, as diferentes formas ou maneiras dos homens viverem.

Quando os santos desejosos de aproximarem-se de Deus caminham para o centro do círculo, à medida que penetram em seu interior vão se aproximando um do outro ao mesmo tempo em que se aproximam de Deus. Quanto mais se aproximam de Deus, mais se aproximam uns dos outros; e quanto mais se aproximam uns dos outros, mais se aproximam de Deus.

E compreender que o mesmo acontece em sentido inverso, quando dando as costas para Deus nos retiramos para o exterior, é então evidente que, quanto mais nos distanciamos de Deus, mais nos distanciamos uns dos outros, e quanto mais nos distanciamos uns dos outros, mais nos distanciamos também de Deus.

Tal é a natureza da caridade. Quando estamos no exterior e não amamos a Deus, na mesma medida estamos distanciados com relação ao próximo. Mas se amamos a Deus, quanto mais nos aproximamos de Deus pela caridade tanto mais estaremos unidos em caridade ao próximo, e quanto estivermos unidos ao próximo tanto o estaremos de Deus.

Que Deus nos torne dignos de compreender aquilo que nos é de proveito e realizá-lo! Porque quanto mais nos preocupemos por cumprir diligentemente o que entendemos, mais Deus nos concederá a Sua luz e nos ensinará a Sua vontade”. (1)

Ressalto a importância da caridade, que deve crescer a cada dia em nosso coração, para que sejamos mais humanos e fraternos, e isto somente se dará quando Deus tiver a devida centralidade em nossa vida.

A centralidade divina em nossa vida é garantia de laços mais fraternos. Quanto mais próximos de Deus, quanto maior o espaço que Ele ocupar em nossa vida, mais empenhados em viver a caridade o seremos, e isto será expresso no cuidado mútuo, para que todos tenhamos vida plena e feliz.

A caridade vivida cura as feridas do corpo, e aquelas ainda mais desafiadoras: as feridas da alma. Deste modo, a centralidade de Deus em nossa vida nos revigora, para que nos tornemos também mais solidários e sensíveis à dor e à enfermidade do nosso próximo.

(1) Lecionário Patrístico Dominical – Editora Vozes – 2013 – pp.389-390 

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