As faces da lágrima nas faces...
Lágrimas são mais que lágrimas... Mas o que elas nos revelam?
Com um olhar transcendente contemplemo-las e ouçamos o que nos dizem...
Sou a lágrima que derramou no silêncio escuro de um quarto, por ter vergonha de ser, diante do outro, vertida...
Sou a lágrima que não derramou no silêncio escuro do mesmo quarto, porque disseram que não posso chorar; que o choro é expressão de minha fraqueza...
Sou a lágrima que saiu dos olhos do amigo de Lázaro quando foi ao seu encontro, morto há quatro dias... Expressão de amizade do divino com o humano, da compaixão que consumiu todo o Seu existir...
A mesma lágrima que o Bom Pastor, ao ver Jerusalém, um dia chorou: O Amor que não foi compreendido, acolhido... Que ainda hoje, nos faz pensar nas repetidas incompreensões, da não abertura ao Seu Projeto de amor, vida, salvação...
Sou a lágrima que verteu, copiosamente, nos olhos de Maria aos pés da Cruz, recebendo o corpo do Filho amado.
Sou a lágrima dos bem-aventurados do Reino que, por Deus, serão consolados, pois por Ele foi prometido, porque incompreendidos, caluniados, perseguidos...
Sou a lágrima que caiu porque, ao longo do ano findado, milhões de inocentes, a luz do dia, não viram nascer, porque abortados, mortos o foram...
Sou a lágrima da vitória aparentemente impossível que nada difere da derrota inesperada: o que difere são as suas motivações, tão opostas...
Sou a lágrima do resultado mais que esperado de um concurso, ou um exame, entrevista, podendo ser expressão de êxito ou frustração.
Sou a lágrima dos olhos dos pais ao verem aquele que, ao mundo, veio; seus primeiros choros, primeiros traços, primeiros colos, primeiros toques...
Sou a lágrima das primeiras quedas, sustos; das primeiras ausências sentidas por vezes para sempre; das primeiras aulas em busca de intermináveis saberes...
Sou a lágrima que acompanha a inevitável despedida, ora provisória de uma viagem, ora de uma viagem que será para sempre, portanto voltará a verter...
Sou, portanto, a mesma lágrima da despedida que não conseguimos admitir, a lágrima da saudade de alguém que se foi para aqui dentro ficar...
Sou a lágrima da dor, do esforço, da superação, mas também a lágrima de que valeu a pena não sucumbir diante da exclusão, humilhação...
Sou a lágrima do reencontro, por vezes planejado, outras vezes nem tanto, talvez em mesma intensidade. Mas o que têm em comum? A emoção do reencontro de quem se ama.
Sou a lágrima do sonho destruído, do tudo ou quase tudo perdido, naufragado em intempéries desoladoras, inesquecíveis, inesperadas... Mas a mesma lágrima que rega a semente do recomeço...
Sou a lágrima que goteja diante de altares, em Sacramentos, com indescritível espiritualidade, por todos celebrados, vivenciados com intensa profundidade...
Sou a lágrima pela lágrima não derramada.
Sou a lágrima pela lágrima dos incompreendidos.
Sou a lágrima pela lágrima dos que não choram.
Sou a lágrima por aqueles que desconhecem sua força.
Sou a lágrima que soma com a lágrima daqueles que procuram compreender-me, ouvir-me sem rotulações, definições, proibições...
Lágrima, quem sois?
Sou isto e muito mais
Lágrima, quem sois?
Decifra-me, permita-me, compreenda-me...
Deixe-me ser a lágrima de múltiplas leituras.
Apenas não me ignore, procure ser o que escrevo, ouvir o que grito, mais ainda o que calo...
Lágrima, quem sois?
Sou...
Quem disse que é possível falar com elas?
Não sei se é, ou até sei... Mas que elas falam conosco, não tenho dúvida. Precisamos de coragem para ouvi-las, derramá-las, secá-las, evitá-las, quando possível, no olhar do outro...
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