
Eliminemos
a ferrugem da alma!
A Liturgia das Horas nos apresenta, na
Quinta-feira depois das cinzas, um sermão do Papa São Leão Magno (séc. V):
“Em todo tempo, amados
filhos, a terra está repleta da misericórdia do Senhor (Sl 32,5). A
própria natureza é para todo fiel uma lição que o ensina a louvar a Deus, pois
o céu, a terra, o mar e tudo o que neles existe proclamam a bondade e a
onipotência de seu Criador; e a admirável beleza dos elementos postos a nosso
serviço requer da criatura racional uma justa ação de graças.
O retorno, porém, desses dias que os mistérios da salvação humana
marcaram de modo mais especial e que precedem imediatamente a festa da Páscoa,
exige que nos preparemos com maior cuidado por meio de uma purificação
espiritual.
Na verdade, é próprio da solenidade pascal que a Igreja inteira se
alegre com o perdão dos pecados. Não é apenas nos que renascem pelo santo
Batismo que ele se realiza, mas também naqueles que desde há muito são contados
entre os filhos adotivos.
É, sem dúvida, o banho da regeneração que nos torna criaturas novas;
mas todos têm necessidade de se renovar a cada dia para evitarmos a ferrugem
inerente à nossa condição mortal, e não há ninguém que não deva se esforçar
para progredir no caminho da perfeição; por isso, todos sem exceção, devemos
empenhar-nos para que, no dia da redenção, pessoa alguma seja ainda encontrada
nos vícios do passado.
Por conseguinte, amados filhos, aquilo que cada cristão deve praticar
em todo tempo, deve praticá-lo agora com maior zelo e piedade, para cumprir a
prescrição, que remonta aos apóstolos, de jejuar quarenta dias, não somente
reduzindo os alimentos, mas sobretudo, abstendo-se do pecado.
A estes santos e razoáveis jejuns, nada virá juntar-se com maior
proveito do que as esmolas. Sob o nome de obras de misericórdia, incluem-se
muitas e louváveis ações de bondade; graças a elas, todos os fiéis podem
manifestar igualmente os seus sentimentos, por mais diversos que sejam os
recursos de cada um.
Se verdadeiramente amamos a Deus e ao próximo, nenhum obstáculo
impedirá nossa boa vontade. Quando os anjos cantaram: Glória a Deus nas
alturas e paz na terra aos homens de boa vontade (Lc 2,14), proclamavam
bem-aventurado, não só pela virtude da benevolência mas também pelo dom da paz,
todo aquele que, por amor, se compadece do sofrimento alheio.
São inúmeras as obras de misericórdia, o que permite aos verdadeiros
cristãos tomar parte na distribuição de esmolas, sejam eles ricos, possuidores
de grandes bens, ou pobres, sem muitos recursos. Apesar de nem todos poderem
ser iguais na possibilidade de dar, todos podem sê-lo na boa vontade que
manifestam.”
Iluminadoras suas palavras: “... todos têm necessidade de se renovar a
cada dia para evitarmos a ferrugem inerente à nossa condição mortal, e não há
ninguém que não deva se esforçar para progredir no caminho da perfeição...”.
A reflexão deste sermão nos ajuda no aprofundamento do sentido espiritual do
jejum e da caridade, que brotam de um coração orante, na fidelidade ao Senhor,
a Luz das Nações, Salvador de todos os povos.
Quaresma é um convite para que nossa vida cristã
consista em dar passos contínuos, sem cansaço ou desistência, no itinerário que
tem como meta a eternidade, a glória. No entanto, é inevitável, para alcançar
esta meta, passar pelo caminho da cruz.
Não tenhamos medo de embarcar nesta maravilhosa
aventura de amor com o Cristo Senhor, tomando cada dia a nossa cruz, na mais
estreita configuração a Ele, procurando eliminar do coração toda ferrugem da
alma.
Por isto, retomemos esta expressão “ferrugem
inerente à nossa condição mortal...” , e como discípulos missionários
do Senhor, façamos silêncio e um mergulho no mais profundo de nós mesmos,
com a necessária purificação interior, acolhidos e envolvidos pela Misericórdia
Divina para que, em atitudes contínuas de conversão, possamos atender ao apelo
do Papa Clemente I (séc. I):
“Convertamo-nos sinceramente ao Amor de Deus. Abandonemos as
obras más, a discórdia e a inveja que conduz à morte”.
Eliminemos a ferrugem da alma, para que o
esplendor da Páscoa seja mais do que desejável, uma realidade, e Luz do Senhor
brilhe mais forte por meio de nosso testemunho.
Sejamos pessoas verdadeiramente pascais, que sabem e acreditam que a palavra
última não ficou escrita no Calvário, pois, definitivamente, a Palavra que
existiu desde sempre, Ressuscitou, e junto do Pai e conosco está.
Urge, portanto, buscar a purificação espiritual,
por meio do jejum e da misericórdia divina, que nos recria e nos faz novas
criaturas, a fim de que a Quaresma seja um tempo favorável de salvação, não
desperdiçando a graça de Deus que nos é derramada, abundantemente, todos os
dias de nossa vida.
Façamos da Quaresma um tempo de purificação e solidificação de nossa fé, para
que nossa esperança seja sólida, porque enraizada na Fonte inesgotável do Amor
de Deus, que nos é comunicada de maneira especialíssima na Celebração da
Eucaristia, na qual Deus nos sacia a fome com Sua Palavra, que é Pão, e com Seu
Corpo e Sangue, que também é Verdadeira Comida e Verdadeira Bebida.
Deste modo, iniciaremos as primeiras reflexões
sobre a Campanha da Fraternidade 2025, com o tema: “Fraternidade e
Ecologia Integral", e o lema: “Deus
viu que tudo era muito bom" (Gn 1,31).
Seguindo o caminho de purificação espiritual, eliminando
a ferrugem da alma, vivamos o tempo favorável de nossa Salvação, que nos foi
alcançada por meio de Jesus Cristo, que por nós morreu para nos redimir e
abrir-nos o caminho de vida plena, eterna e feliz.
Sem a ferrugem da alma, com esforços
multiplicados se alcança o desejável: que iluminados e iluminadores
sejamos, e o odor do Amor Divino seja exalado
em todos os momentos e lugares em Primaveras do Espírito permanentes
através de nossas palavras e ações.
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